O presidente da Câmara de Ourém já tinha sido reeleito com uma confortável maioria absoluta de 67%, quando se deu início à celebração de mais uma peregrinação internacional. Poucos deram por isso. Na verdade, nem ninguém pareceu preocupado. O santuário de Fátima, que durante a tarde deste domingo parecia bem longe das enchentes de anos anteriores, cobriu-se da luz das velas e de cânticos de louvor à Virgem. E durante algumas horas foi só mesmo para ela que as atenções estiveram viradas.

O País podia estar em suspense, os média a adivinhar lutas renhidas e empates técnicos nas maiores cidades portuguesas, mas, no lugar de Fátima, a tradição é sempre cumprida. Aqui não há lugar para surpresas ou alarde, porque o santuário não muda. Tem a sua própria pulsação e o seu calendário – o mundo fica sempre do lado de fora. E os únicos ecrãs em que se fixam os olhares são mesmo os gigantescos painéis de transmissão das imagens da capelinha das Aparições.

Reza-se o terço, desfiam-se contas e súplicas. Erguem-se os olhos para os céus e as velas para o alto, como sempre se fez ao longo de décadas. Sempre da mesma maneira, com a mesma emoção e com a imensa vontade de chegar mais alto, mais longe e mais adiante.

Há peregrinos vindos das mais diversas partes do mundo, mesmo daquelas onde ser cristão é uma sentença de morte. De Espanha ao Iraque, do Uganda à Indonésia, cabem todos na Cova da Iria. A fé derruba barreiras entre os mistérios do terço, as salve-rainhas e as Ave-Marias. Fátima sabe mesmo ser um mistério, que resiste a todos os tempos e a todas as mudanças. Aqui “aspira-se às coisas do alto e não às da terra”, diz o celebrante. Talvez seja por isso. E o certo é que a pequena imagem da Virgem de Fátima percorreu, mais uma vez. o recinto do santuário entre o mar de luz das velas. Foi sempre assim. E não seria uma noite eleitoral que a faria mudar.