O resultado do Chega nas eleições autárquicas ficou aquém do esperado e o próprio André Ventura o reconheceu. A estratégia do líder do Chega, ao decidir levar a votos todos os deputados, alguns em sítios onde o partido tinha vencido nas legislativas, não surtiu efeito — exceção feita para Rui Cristina, que venceu em Albufeira —, mas há resultados bem diferentes um pouco por todo o país.
Há deputados que herdaram concelhos vencedores das legislativas e viram os votos caírem a pique e quem tenha ficado a poucas décimas dos resultados de maio. Dos 32 deputados que foram a votos para câmaras municipais, já sem contar com Mithá Ribeiro (que abandonou a candidatura antes da ida às urnas), 10 deles falharam a eleição para vereador.
Nos resultados considerados positivos, há cinco que se destacam, todos eles acima não só da média conseguida pelo Chega nas autárquicas, como também dos 22,56% que André Ventura obteve nas eleições autárquicas de maio.
Em todo o país, só um deputado conseguiu superar a percentagem de votos conquistada pelo Chega nas últimas eleições legislativas. Chama-se Rui Cristina e é o único que deixa a bancada parlamentar para ser presidente da Câmara Municipal de Albufeira.
Em maio, o Chega venceu Albufeira com 39,39% dos votos (8.016 votos) e o concelho tornou-se um dos vários no Algarve pintados a azul escuro. Desta vez, o partido voltou a carimbar o primeiro lugar, com 40,51% — um valor que, apesar de ser mais alto, representa menos votos do que nas legislativas (7.396 votos), sendo que o universo de eleitores também foi menor. Foi o único a conseguir o feito.
Rui Cristina, que já foi deputado do PSD, já se despediu da Assembleia da República, e recorda o 12 de outubro como um “dia histórico” para o partido. Mais do que isso, no rescaldo da vitória, admitiu ao Observador que estará “sob os holofotes” e que o que for bem feito em Albufeira será “levado de exemplo para o resto do país”.
O primeiro dia de Rui Cristina após a eleição para Albufeira. “Estaremos sob os holofotes”
Num olhar pela bancada do Chega, há alguns deputados que se destacam pelos resultados positivos, desde logo por terem ficado acima da média nacional do Chega nas legislativas — ainda que não tenham conquistado o mesmo resultado que o partido tinha conseguido a 18 de maio nos respetivos concelhos. Seja como for, todos estes têm resultados muito superiores à média das autárquicas de 11,89%.
Um dos exemplos é Rita Matias, que chegou a ter sondagens que a colocavam em empate técnico com os adversários, e acabou por ficar no terceiro lugar, atrás de Marco Almeida, cabeça de lista pela coligação PSD/IL/PAN, e Ana Mendes Godinho, que representava PS e Livre. A deputada do Chega conquistou 38.020 votos nas eleições autárquicas, o que se traduz em 23,38% dos votos — acima dos 22,56% de média conseguidos pelo Chega em termos nacionais nas legislativas. Porém, em Sintra, o partido tinha vencido com 26,07% e 52.868 votos. Após a abertura das urnas, é possível constatar que quase 15 mil eleitores deixaram de votar no Chega, devendo ser tido em conta um pormenor: o universo de pessoas que foram às urnas em Sintra desceu em mais de 40 mil naquele local.
Dos 32 deputados que foram a votos como cabeças de lista a câmaras municipais, há mais quatro que também ultrapassaram a média nacional das legislativas: Marta Silva (Seixal), Nuno Gabriel (Sesimbra), João Graça (Portimão) e Ricardo Moreira (Olhão). Todos tinham em comum o facto de serem candidatos a concelhos em que o Chega tinha vencido nas últimas legislativas.
Ricardo Moreira conseguiu 29,24%, com 5.842 votos, atrás do PS, que alcançou uma maioria absoluta em Olhão. Há uns meses, o Chega tinha conquistado mais de oito mil eleitores no concelho, com 37,45% dos votos. Apesar das esperanças pelo resultado bastante destacado nas legislativas — em que o segundo mais votado, o PSD, obteve 22,17% —, o deputado do Chega também mantém o lugar no Parlamento.
Ainda no Algarve, em Portimão, João Graça conseguiu 27,38%, com 7.216 votos, e também perdeu para o PS, deixando o Chega em segundo lugar. Da última vez que o partido tinha ido a votos havia arrecadado os votos de mais de 11 mil eleitores, o que traduzia em 36,84%. Tanto num município como noutro houve uma queda de eleitores de uma eleição para a outra.
No Seixal, Marta Silva, deputada e dirigente do Chega, conseguiu 22,91% — também acima da média nacional — com 17.674 votos. Num olhar comparativo com as legislativas também perdeu votos, já que o Chega tinha conseguido 25.136 votos (26,02%) e o primeiro lugar. Desta vez, a liderança do pódio caiu para a CDU, com o Chega a surgir em segundo, com uma diferença superior a nove mil votos.
Quem ficou mais próximo de conquistar uma destas câmaras foi Nuno Gabriel, em Sesimbra. Após a contagem, que esteve taco a taco durante muito tempo, o Chega viu fugir o segundo lugar para a CDU, com uma diferença de 147 votos. Conquistou 6.274 votos (25,71%). A luta foi renhida entre três partidos e todos (CDU, Chega e PS) ficaram exatamente com o mesmo número de vereadores. Cinco meses antes, nas legislativas, o partido liderado por André Ventura tinha conquistado o primeiro lugar com 9.525 votos (31,01%). Nessa altura, o PS tinha ficado em segundo, a mais de três mil votos, e a CDU ficou-se pelos 5,03%, sendo que tinha à sua frente Aliança Democrática, IL e Livre — um resultado muito longe da realidade autárquica.
Acima dos 20%, mas abaixo da média nacional que o Chega teve nas legislativas ficaram os deputados José Barreira Soares (Vila Franca de Xira), Catarina Salgueiro (Almeirim) e Bruno Nunes (Loures). Em todos, foram derrotas para o PS, sendo que no caso de Loures o Chega não tinha partido do primeiro lugar.
No caso de Vila Franca de Xira, Barreira Soares conseguiu 13.707 votos, que se traduziu em 22,36%, quando o Chega tinha vencido com 20.251 votos e 25,70%. Em Almeirim, onde o partido liderado por Ventura tinha vencido em maio com 31,82 % e 3.755 votos, Catarina Salgueiro conquistou 2.191 votos (21,29%).
Em Loures, onde Ricardo Leão conquistou uma maioria absoluta, Bruno Nunes obteve 18.868 votos, com 20,67%, quando há cinco meses tinham sido mais de 27 mil votos e 24,31% nas legislativas. Manteve-se como o segundo partido mais votado no concelho, como já tinha acontecido nas eleições nacionais, sendo que votaram menos 21.315 do que nessas eleições. De resto, viu a CDU cair para quarta força política, lugar onde tinha ficado há quatro anos.
Nas contas aos boletins de votos, há alguns resultados que, não sendo muitíssimo negativos, também não entram na bolsa das boas surpresas para Ventura. Porém, também existem resultados aquém dos mínimos. Antes desses, num olhar para as candidaturas de Rui Paulo Sousa (Amadora), Pedro Pinto (Faro), Rui Afonso (Gondomar), Rui Cardoso (Viana do Castelo) ou Filipe Melo (Vila Verde) ou Eduardo Teixeira (Viana do Castelo) todos conseguiram mais de 15%.
No Algarve, onde o Chega depositava bastante esperança, Pedro Pinto não foi além dos 17,26%, 5.489 votos em Faro, deixando o partido cair de segundo para terceiro lugar, em comparação com as legislativas. Nessa altura, o concelho tinha dado ao Chega 27% dos votos e perto dos 10 mil votos. Já Rui Paulo Sousa, na Amadora, carimbou os 17,60%, com 12.406 votos, sendo que neste concelho os objetivos sempre foram mais contidos, já que nas legislativas o Chega não tinha ido além do terceiro lugar com 21,20%.
Filipe Melo, que se candidatou a Vila Verde, conseguiu 15,91%, com 4.799 votos. Comparativamente com as legislativas, caiu do segundo para o terceiro lugar no concelho, onde o Chega tinha conseguido obter 27,60% (8.333 votos).
Já Rui Cardoso, que foi cabeça de lista em Viana do Alentejo, onde o Chega venceu com mais de 30% dos votos, não foi além de um terceiro lugar que lhe valeu 592 votos (18,84%). Em Gondomar, Rui Afonso alcançou 15,58%, 12.337 votos, quando há cinco meses o Chega tinha conseguido praticamente o dobro: 23.274 votos, com 23,08%. Longe também ficou Eduardo Teixeira, em Viana do Castelo, que conseguiu 7.666 votos. Com 23,09% dos votos, o Chega não tinha ido além do terceiro lugar nas legislativas.
Também em lugares em que o Chega ficou acima da média nacional nas legislativas houve descalabros. Em Santarém, Pedro Correia ficou-se pelos 11,13%, com 3.454 votos, depois de o partido ter conseguido mais de 24% dos votos nas legislativas. Cenário idêntico ocorreu em Castelo Branco, onde há cinco meses o Chega conquistou 28,48% dos votos e um segundo lugar, e agora João Ribeiro não foi além dos 3.155 votos, com 10,72%, e caiu para quarto lugar, atrás da Iniciativa Liberal.
Eliseu Neves, em Cantanhede, conseguiu 12,17% com 2.332 votos, após um resultado próximo dos 20% nas legislativas, em que o Chega obteve a confiança de mais de 3.800 eleitores. Luís Paulo Fernandes, em Leiria, teve um resultado próximo, ao conseguir 11,53%, 7.897 votos, quando em maio tinha conseguido mais de 13 mil.
Em Santiago do Cacém, onde o Chega tinha ficado em segundo lugar com 24,07% (3.685 votos), a deputada Cláudia Estevão viu o partido cair para o terceiro lugar, com 11,61% e 1.626 votos. Um resultado bastante próximo teve Felicidade Vital, em Torres Vedras, que alcançou 11,33%, com pouco mais de cinco mil votos, quando o partido tinha obtido 24,52% com quase 12 mil votos.
De resto, há vários resultados abaixo dos 10%, alguns deles bem longe dos valores conquistados pelo Chega nas legislativas, mas também abaixo da média das autárquicas (11,86%). Dez deles falharam a eleição para vereadores.
Um dos deputados mais conhecidos do Chega, Pedro Santos Frazão, ficou atrás dos números das legislativas e mesmo das autárquicas, mas num concelho onde o partido não passou dos 13,51% em maio e onde Isaltino Morais conseguiu uma maioria absoluta. Em Oeiras, o Chega conquistou 7.616 votos (8,48%). Também Bernardo Pessanha, cabeça de lista por Viseu, onde o Chega teve mais de 22% dos votos, passou para 8,53%, com 4.859, mas ainda carimbou a eleição.
Já Ricardo Dias Pinto (Barrancos), que nem sequer foi eleito vereador, só obteve 38 votos (3,93%). Nas legislativas o Chega tinha vencido naquele município com 220 votos. Diogo Pacheco Amorim, em Melgaço, também não foi eleito com os 64 votos (1,24%) que obteve, depois de o partido ter conseguido 577 votos em maio (15,15%).
Lina Pinheiro, em Cabeceiras de Basto, seguiu o mesmo caminho da não eleição. Só conseguiu 200 votos (1,70%) quando tinha herdado neste município 1.672 votos, que refletem mais de 17%. Raul Melo, em Baião, ficou fora dos vereadores, ao apenas conseguir 504 votos (4,30%), quando nas legislativas o Chega tinha obtido 1.773 votos, com 18,52%.
Em Cuba do Alentejo, Pedro Pessanha também só obteve 114 votos (4,17%) quando o Chega vinha de um resultado de 25,56%, com 582 votos, e um segundo lugar. O deputado também não conseguiu o lugar de vereador. O mesmo aconteceu com João Lopes Aleixo, que não foi além dos 6,73% (com 821 votos) que atiraram o partido para quarto lugar. Há cinco meses teve quase três mil votos, com 22,78%.
João Tilly, em Seia, não foi além dos 8,44% (1.119 votos) e não conseguiu ser eleito. Nas legislativas, o Chega tinha conquistado 19,89% (2.448 votos). Em Chaves, Manuela Tender ficou-se pelos 7,79% (com 1900 votos), o que não permitiu ao Chega ir além do terceiro. O resultado também não permitiu a eleição. Há cinco meses tinham sido 24,08%, com 5.298 votos, e o partido ficou em segundo. Já em Amarante, Sónia Monteiro também não foi eleita com os 5,61% que conquistou (1.873 votos), depois de nas legislativas o partido ter conseguido mais de cinco mil votos, que se traduziram em mais de 17%.
Contados os votos, André Ventura assumiu que o Chega ficou aquém dos resultados e o partido apenas preside a três câmaras municipais. Só um deputado conseguiu esse feito. Porém, apesar de várias desilusões no território nacional e de ter havido quem desbaratou primeiros lugares nas legislativas, há também bons indicadores em algumas zonas do país em que as percentagens médias das eleições nacionais foram superadas. Ventura pode não cantar vitória, mas poupou a bancada parlamentar.