A frase mais marcante do debate da última sexta-feira na Assembleia da República, em que se discutiu e votou a chamada “lei das burcas”, apresentada pelo Chega e aprovada por este partido com os votos do PSD, CDS e Iniciativa Liberal, veio de um deputado sentado precisamente no pólo oposto do hemiciclo de São Bento.
Rui Tavares, líder do Livre, protestava contra a iniciativa, e tinha muitas e boas razões para o fazer: Pelo aproveitamento político evidente do Chega, perante o levantar de um problema e questão praticamente sem expressão no nosso país; pelo acirrar de ânimos contra comunidades imigrantes; pela apresentação de um projeto de lei mal escrito e mal feito.
A dada altura saiu-lhe mesmo um sonoro “Sou contra a burca e sou contra os gajos a favor da burca”.
O problema de Rui Tavares, como o problema de muitos outros deputados e partidos, é o que fazer em relação à lei das burcas. E votar contra, sem mais nada, não é mesmo a melhor solução. Deixa-se o Chega como paladino da defesa dos direitos das mulheres, quando quem defende algo como “se querem usar burca metam-se no avião e voltem para os seus países” está-se na verdade marimbando para os direitos violados de mulheres perante uma prática bárbara e verdadeiramente medieval.
Perante isto, como agir?
1. Explicar como a burca é uma imposição arcaica, medieval e bárbara. Os talibãs reintroduziram a sua obrigatoriedade no Afeganistão com o argumento de que as mulheres não podem socializar com nenhum homem. Isto nada tem que ver com liberdade de culto e religião, que não está em causa.
2. Apresentar um projeto de lei alternativo. Humanista, firme, bem feito e coerente. Sobretudo não deixar o Chega sozinho neste campo (o projeto do Chega deu entrada na AR em junho, houve mais do que tempo para isso).
3. Propor que se substitua a pena pecuniária para quem for apanhado de burca pelo recurso a serviços sociais. As mulheres forçadas a usar burca por costumes medievais e bárbaros que visam impedir que possam conviver de que forma for com outros homens devem ser ajudadas, não punidas com multas de dois mil euros.
4. Reforçar que o importante é integrar comunidades imigrantes, não ostracizá-las ou maltratá-las.
Combater o Chega não é estar contra tudo o que apresenta e propõe, senão chegamos ao ridículo de ter partidos e deputados a defender que proibir o uso da burca é atentar contra os direitos individuais. Uma lei não é má por ser apresentada por Ventura e boa se for Rui Tavares a apresenta-la…