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Grãos de kopi luwak processados pelo mamífero Paradoxurus hermaphroditus.

Um processo digestivo único, do rabo para a caneca. Uma espécie de gambá alimenta-se de grãos de café e o mais exclusivo e exótico café do mundo é feito a partir dos grãos por ela escolhidos que das suas fezes saem com mais sabor e aroma mais suave.

O café mais caro do mundo tem uma origem… estranha: é extraído das fezes de um pequeno mamífero do sul da Ásia, a civeta-de-palmeira-asiática (Paradoxurus hermaphroditus).

Conhecido como kopi luwak, este raríssimo café, produzido em quantidades muito limitadas, maioritariamente nas ilhas de Java e de Sumatra, na Indonésia, pode atingir valores exorbitantes. Em Portugal, por exemplo, é visto à venda por mil euros ao quilo.

Uma equipa da Universidade Central de Kerala, na Índia, liderada pelo zoólogo Palatty Allesh Sinu, analisou recentemente a composição química deste café para compreender o que o torna tão especial. O estudo, publicado esta quinta-feira na Scientific Reports, confirma que o processo digestivo do mamífero altera de forma mensurável a química dos grãos.

Na natureza, as civetas alimentam-se de bagas de café maduras, mas só digerem a polpa e expulsam os grãos inteiros. Estes, depois de limpos e torrados, dão origem o kopi luwak. Segundo a investigação, os grãos recuperados das fezes são os maiores e os que apresentam maior teor de gordura do que os provenientes diretamente das plantas, o que pode refletir a tendência destes animais para escolherem os melhores frutos.

Jordy Meow/Wikimedia

Paradoxurus hermaphroditus

O Kopi Luwak é descrito como muito menos amargo do que outras variedades, com toques de chocolate escuro e nuances amadeiradas, e uma leve acidez que lhe confere o aroma típico. E o facto de passar por todas as etapas de um sistema digestivo antes de ser digerido, desta vez na sua forma líquida, conta muito para o sabor.

A nova análise revelou que, embora os níveis de proteínas e cafeína se mantenham idênticos entre os dois tipos de grão (relativamente baixos), o café excretado contém concentrações mais elevadas de ésteres de ácido caprílico e cáprico — compostos responsáveis por aromas suaves e notas semelhantes às dos laticínios. Os investigadores concluem que a fermentação natural e a ação enzimática no trato digestivo do animal modificam a composição química do café, intensificando o sabor e conferindo-lhe um perfil sensorial único.

É certamente fascinante. Mas o kopi luwak tem vindo a ser alvo de críticas devido ao impacto ético da sua produção. Outras investigações sobre a produção do café centraram-se no abuso das civetas, mantidas em pequenas gaiolas e alimentadas exclusivamente com bagas de café, sem acesso à natureza. Um estudo de 2012 confirmou que a captura destes animais constitui uma ameaça significativa para as suas populações selvagens.

surtr/Flickr

A equipa acredita que continuar a estudar este café único pode ajudar a encontrar soluções mais sustentáveis e éticas para reproduzir o sabor característico. Planeia, no futuro, estudar os perfis aromáticos a nível molecular.


Tomás Guimarães, ZAP //


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