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Durante décadas, os diamantes foram símbolo de luxo, compromisso e status. A célebre frase “Um diamante é para sempre”, criada em 1947 pela gigante De Beers, consolidou o papel desta pedra preciosa como elemento essencial em anéis de noivado e joias de luxo. Contudo, o que foi outrora uma indústria imbatível, vive agora uma das suas piores crises, com sinais claros de saturação, perda de valor e relevância cultural.

A De Beers, que chegou a controlar 90% do comércio mundial de diamantes no século XX, acumula hoje um stock não vendido avaliado em cerca de 2 mil milhões de dólares — o maior desde a crise financeira de 2008. As suas receitas caíram mais de 50% desde 2022, obrigando a casa-mãe, Anglo American, a rever drasticamente o valor da empresa: de 8,2 mil milhões de dólares para 4,5 mil milhões.

“O que estamos a ver é o que a indústria chama de tempestade perfeita”, afirmou Edahn Golan, analista do setor, em declarações ao El Confidencial. “Neste momento, toda a gente está a perder dinheiro: mineiros, lapidadores, retalhistas… todos.”

O colapso da procura em mercados chave
Vários fatores explicam este colapso. Um dos mais relevantes é a quebra de procura em mercados estratégicos como a China e a Índia. A China, que era um dos principais destinos para diamantes naturais, ainda não recuperou os níveis de consumo anteriores à pandemia. Muitos retalhistas chineses encontram-se com inventários que não conseguem escoar, agravando o excesso de oferta. A Índia, outro grande consumidor, também tem mostrado sinais de desaceleração.

Nos Estados Unidos, apesar de continuarem a ser o maior mercado do mundo, a procura também estabilizou após um pico atípico entre 2020 e 2022, alimentado por consumidores com menos opções de lazer durante a pandemia. “O que aconteceu nesses anos foi uma anomalia”, explica Golan. “As pessoas compraram muitos mais diamantes do que o normal e agora voltaram simplesmente aos níveis anteriores.”

Diamantes artificiais: o concorrente que já brilha mais
A maior ameaça, porém, vem do crescimento explosivo dos diamantes sintéticos, também conhecidos como lab-grown diamonds. Estes diamantes, produzidos em laboratório, têm hoje qualidade suficiente para rivalizar com os naturais, e estão a transformar radicalmente o mercado.

Nos EUA, mais de metade dos anéis de noivado vendidos no último ano incluíam diamantes de laboratório. Globalmente, estas pedras já representam 25% das joias com diamantes vendidas. “Estamos a ver um crescimento de dois dígitos, sustentado há vários anos, no número de unidades vendidas”, nota Golan.

A China, nomeadamente a província de Henan, tornou-se o epicentro desta nova indústria. Ali, centenas de reactores de alta pressão replicam em dias o que a natureza demoraria milhões de anos a formar. Os custos de produção, apoiados por eletricidade fortemente subsidiada e tecnologia nacional de duplo uso (com possível aplicação militar), são incomparavelmente inferiores aos da mineração tradicional.

Uma diferença de preços impossível de ignorar
O impacto nos preços tem sido brutal. Em 2020, um diamante de laboratório custava metade de um natural. Hoje, essa diferença aumentou ainda mais: os diamantes sintéticos são vendidos por menos de 1.000 dólares por quilate, enquanto os naturais rondam os 7.500.

Esta disparidade é particularmente evidente nos anéis de noivado — tradicionalmente, a principal porta de entrada para o consumo de diamantes. Em 2020, um anel com diamante de laboratório custava, em média, 4.000 dólares, contra 5.400 para o seu equivalente natural. Hoje, os preços médios são 2.400 e 7.100 dólares, respetivamente.

Geração Z não compra a narrativa do romance caro
Mais do que uma questão de preço, está a ocorrer uma mudança cultural. Segundo Golan, o ritual do noivado tornou-se uma decisão partilhada entre casais, e não um gesto unilateral do homem. A compra do anel deixa de ser prova de sacrifício romântico para passar a ser ponderada ao lado de outras prioridades como a lua-de-mel, a entrada para uma casa ou a compra de um carro. “Já não é só ele a gastar para mostrar algo. É uma decisão conjunta com outras prioridades”, explica o analista.

Paul Zimnisky, outro especialista do setor, reforça: “As joias com diamantes são como outros bens de luxo: ninguém precisa delas. O desejo tem de ser construído através de marketing e marca. E acho que a indústria perdeu um pouco o norte nesse aspeto.”

A crise de identidade da indústria do diamante é clara. Os produtores enfrentam um dilema: tentar competir em preço com os sintéticos, arriscando-se a desvalorizar o produto, ou recuar para um nicho exclusivo de luxo e vender menos, mas a preços muito mais altos.

De Beers tentou seguir os dois caminhos em simultâneo, mas com resultados desastrosos. Em 2018, lançou a Lightbox, uma marca de diamantes sintéticos a baixo custo. A ideia era separar claramente os dois mundos. Mas a mensagem revelou-se contraditória. “Não podes dizer que algo é valioso porque é raro e, ao mesmo tempo, vender algo igual muito mais barato”, resume Golan. A Lightbox acabaria por encerrar em 2024.

A estratégia mais provável, segundo os analistas, é a aposta num nicho de luxo exclusivo. No entanto, mesmo esta abordagem está longe de ser garantida. “Não basta subir preços e falar em exclusividade”, alerta Zimnisky. “É preciso convencer consumidores cada vez mais céticos de que essa diferença vale mesmo a pena.”

Numa entrevista recente ao Wall Street Journal, o CEO da De Beers, Al Cook, defendeu a permanência do diamante natural como símbolo precioso: “Desde que a humanidade tem consciência, valorizamos aquilo que é raro e precioso.” A frase ecoa o antigo slogan da empresa. Mas, neste novo mundo dominado por tecnologia, sustentabilidade e consumidores pragmáticos, o brilho eterno dos diamantes naturais está, no mínimo, a esmorecer.