Estados Unidos e China vão fazer uma pausa de um ano na guerra comercial entre os dois países. O primeiro encontro, em seis anos, entre os dois chefes de Estado resultou num acordo para fazer uma trégua de 12 meses, com a suspensão de alguns dos acréscimos nas taxas aduaneiras aplicados nos últimos meses de parte a parte.
A China suspenderá restrições ou taxas acrescidas na exportação de alguns materiais raros para os EUA, enquanto Washington prometeu reduzir de 20% para 10% a taxa aplicável sobre produtos químicos usados na produção de fentanil, um opióide sintético que está na base de um grave problema de toxicodependência naquele país.
Segundo as agências de notícias internacionais, Trump afirmou que o seu homólogo chinês, Xi Jinping, se comprometeu a “a trabalhar arduamente” para conter as exportações de componentes químicos de preparação do fentanil.
O comércio de semicondutores (chips) era outro tópico sensível em cima da mesa deste encontro. Donald Trump confirmou que a líder mundial de produção de chips avançados, a norte-americana Nvidia, vai negociar com a China a venda dos seus produtos, mas ainda não é certo se os chips mais modernos, especificamente concebidos para sistemas que usam inteligência artificial, vão ser incluídos no comércio de electrónica entre os dois países.
Certo é que os EUA prometem suspender a “regra dos 50%” e, em contrapartida, a China suspende controlos aduaneiros de matérias críticas, medida que tinha sido anunciada a 9 de Outubro.
A “regra dos 50%” foi introduzida já pela actual administração norte-americana. Washington passou a controlar exportações de subsidiárias internacionais de empresas chinesas. Empresas tecnológicas detidas ou controladas por capital chinês (pelo menos 50%) estavam sujeitas às mesmas restrições de exportações de tecnologia que se aplicavam às empresas 100% chinesas ou sediadas na China.
Segundo Trump, essa medida também será revista. E o futuro do TikTok também passou por este encontro. Ambas as partes decidiram cooperar para “resolver os problemas” que afectam esta popular plataforma digital de vídeos e que Washington queria ver sem controlo chinês, alegando que esse controlo do popular TikTok era um risco para os EUA.
“Os dois países têm boas perspectivas de cooperação em áreas como o combate à imigração ilegal e à fraude nas telecomunicações, contra a lavagem de dinheiro, podem cooperar na inteligência artificial e na resposta a doenças infecto-contagiosas”, disse o Presidente chinês, citado pelo jornal Diário do Povo, órgão oficial do Partido Comunista Chinês.
Antes do encontro entre os dois líderes nacionais (que até agora tinham falado apenas por telefone e carta), equipas de especialistas estiveram reunidos no fim-de-semana na Malásia, em negociações técnicas. Trump e Xi encontraram-se, agora, na Coreia do Sul. Segundo relatos internacionais, o Presidente dos EUA começou por saudar Xi como “grande líder de uma grande nação”, ao passo que o Presidente da China considerou “normal” haver “alguma fricção” entre as duas maiores economias mundiais”.
Os dois governos vão continuar a negociar. Para já, ambos saem a ganhar, segundo alguns analistas: os EUA libertam alguma da sua indústria da ameaça de falta de matéria-prima como materiais raros e críticos provenientes da China, ao passo que Pequim evita a “regra dos 50%”, que ameaçava estender as sanções norte-americanas contra empresas chinesas a um universo muito maior, “apanhando” muitas empresas de outros países controladas por chineses.
Há cerca de meio ano, na fase mais aguda do confronto entre Washington e o governo da China (e de outros países e blocos económicos como a própria União Europeia), Donald Trump castigou os produtos chineses com taxas aduaneiras de 145%. Pequim respondeu na mesma moeda, aplicando 125% sobre importações oriundas dos EUA.
As negociações entre as duas partes vão continuar, num contexto já mais desanuviado tanto no plano político como no comercial. Trump deu nota positiva ao encontro, dizendo que “numa escala de zero a dez” este encontro “foi um 12”. Por outro lado, garantiu que Taiwan não fez parte da discussão. Havia o receio de a ilha reclamada por Pequim poder ser usada como moeda de troca pelos EUA, mas segundo o líder norte-americano, não houve qualquer referência ao tema.
Para as indústrias exportadoras, abrem-se novas perspectivas. A trégua deverá permitir um acordo sobre uma lista de produtos que verão as suas taxas reduzidas, pondo termo à situação que tinha sido criada e que, na prática, era um embargo mútuo.
Mas há ecos da China que sugerem que muitos agentes económicos olham para estes desenvolvimentos com muita cautela, em especial no lado chinês. “A confiança não é algo que volta quando queres”, sublinha Keven Chen, fundador de uma empresa de transporte marítimo que carrega sobretudo bens que são vendidos online e que nos últimos meses teve de procurar novos mercados para contornar a dependência do mercado dos EUA.
“Há um consenso de que o mercado dos EUA não pode depender apenas do abastecimento da China, enquanto os produtores chineses não podem simplesmente contar com o mercado dos EUA”, insiste o mesmo empresário, em declarações à agência Bloomberg esta manhã.
Nas bolsas mundiais, também não parece ter havido uma onda de entusiasmo. Na Ásia, palco do encontro Trump-Xi (que decorreu quando era madrugada a ocidente), as praças financeiras de Hong Kong e Shenzhen fecharam a cair ligeiramente e na Europa também está tudo pintado de vermelho, assinalando uma manhã de recuos nos principais índices bolsistas.