Ursula von der Leyen participou numa reunião do Conselho Nórdico, que insistiu na criação de um fundo de auxílio alavancado pelos ativos russos congelados na União Europeia. Mas o bloco não consegue consenso sobre a matéria.

Apesar das palavras otimistas de António Costa, presidente do Conselho Europeu, os países do bloco dos 27 não conseguem chegar a um consenso no que diz respeito à possibilidade da criação de um fundo de financiamento do auxílio à Ucrânia alavancado pelos ativos russos congelados na União Europeia. Esta terça-feira, uma reunião do Conselho Nórdico ficou a saber-se que os países da União envolvidos – o conselho é constituído por Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega e Suécia – também não apoiam a alternativa a esse fundo: a emissão de dívida comum.

Essa perspetiva de emissão de nova dívida conjunta a nível europeu para apoiar a Ucrânia deixa os líderes nórdicos indiferentes e insistem que o financiamento deve vir dos ativos russos – tendo-se em vista a criação de um empréstimo de reparações de 140 mil milhões de euros. “Acho que o único caminho a seguir, e realmente gosto da ideia, é que a Rússia pague pelos danos que causou na Ucrânia”, disse a primeira-ministra dinamarquesa, Mette Frederiksen, citada pela agência Euronews.

O empréstimo de reparações foi bloqueado na semana passada pela Bélgica, país onde está concentrada a maioria do capital russo congelado – nomeadamente do Banco Central Russo – que não quer transmitir a ideia de que os investidores internacionais deixam de poder contar com a segurança do sistema financeiro belga. O país levantou diversas preocupações relacionadas com a base legal da criação do fundo e os riscos de arbitragem complexa, mas também disse que é necessário garantir a participação de outros aliados do G7.

O impasse diluiu consideravelmente a linguagem das conclusões das últimas duas cimeiras da União, que determinaram apenas que a Comissão Europeia explore “o mais rápido possível” opções para financiar as necessidades militares e financeiras da Ucrânia para 2026 e 2027. A alternativa é a emissão de dívida conjunta da União para estabelecer um programa de assistência macrofinanceira (AMF), algo que o bloco já fez no passado, embora em escala limitada, para apoiar Kiev. A dívida conjunta não afetaria os ativos russos, eliminando os riscos apontados pela Bélgica, mas aumentaria o contributo financeiro dos Estados-membros, alguns dos quais estão eles próprios com dificuldades para controlar os seus gastos públicos e acalmar investidores preocupados. A França é só o exemplo mais óbvio.

“Para mim, não há alternativa ao empréstimo de reparação”, disse Frederiksen, falando na reunião do Conselho Nórdico na Suécia. “É claro que precisamos de encontrar uma solução para algumas das questões técnicas que foram feitas”, acrescentou. “Mas, antes de tudo, esta é uma escolha política.”

Ao lado dela, o primeiro-ministro finlandês Petteri Orpo enfatizou que “a única solução razoável é usar ativos russos congelados”. O primeiro-ministro sueco, Ulf Kristersson, disse que as conclusões da cimeira representavam um passo “importante” e “necessário” para concretizar o empréstimo de reparações. Os três líderes nórdicos expressaram a esperança de que um acordo seja alcançado em dezembro, quando os 27 líderes devem se reunirem novamente.

Ursula von der Leyen, que foi convidada a participar na reunião nórdica, evitou comentar a questão da dívida conjunta e defendeu o projeto que envolve os ativos russos. “A proposta é usar esses saldos de caixa (dos ativos russos) para conceder um empréstimo à Ucrânia, que a Ucrânia terá que pagar se a Rússia pagar as reparações. Portanto, é uma proposta juridicamente sólida, não trivial, mas sólida”, disse a presidente da Comissão. Von der Leyen afirmou que as opções responderiam a “questões técnicas” relacionadas com o empréstimo de reparação.

O que Von der Leyen não disse é que a utilização dos ativos russos não deixa totalmente de parte a possibilidade de os Estados-membros serem em alguma altura chamados a contribuir diretamente por via dos seus próprios orçamentos do Estado. De facto, se o fundo de ativos russos for criado mas a Ucrânia perder a guerra ou de alguma forma a Rússia não aceitar compensar o país invadido, a União Europeia não terá como financiar a reposição dos ativos. E quando eles forem reclamados, a Bélgica terá um problema em mãos – que só se resolverá com o contributo de todos os 27 países da União.

Dias antes da cimeira nórdica, o primeiro-ministro belga, Bart De Wever, argumentou que os aliados ocidentais da Ucrânia são suficientemente ricos para arcar com o peso e cobrir as despesas por conta própria, sem usar os ativos russos. “Se a Europa quiser criar dinheiro, ela pode criar dinheiro. Isso chama-se dívida. Mas, claro, este também é um tema muito sensível”. “A grande vantagem da dívida é que se conhece: sabe-se quanto ela é, sabe-se por quanto tempo vai ser suportada e sabe-se exatamente quem é responsável por ela. A desvantagem do dinheiro russo é que não há ideia de até onde o litígio irá, quanto tempo levará e que problemas levantará”.

Os Estados-membros, e a Bélgica em particular, aguardam que a Comissão apresente opções – que, segundo os analistas – podem passar por empréstimos e subsídios à Ucrânia apoiados pelo orçamento da União, contribuições nacionais ou uma combinação de ambos. Mas mesmo por esta via, os países da União serão chamados a contribuir – não se sabendo com que montantes. O prazo para um acordo está cada vez mais curto: a Ucrânia já disse que precisa de uma nova injeção de assistência financeira no segundo trimestre de 2026.