Veja o trailer de ‘Bom Menino’, terror protagonizado por cachorro
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Crédito: Divulgação/Paris Filmes
Poucos gêneros no cinema permitem tantas experimentações como o terror. São com essas histórias que cineastas conseguem experimentar diferentes tipos de câmeras, novas perspectivas, brincadeiras narrativas – que, se derem certo, podem ser depois levadas para gêneros mais caros e mais arriscados. E Bom Menino, filme que chega aos cinemas nesta quinta-feira, 30, é exatamente isso: cinema de terror de poucos recursos e muita experimentação.
Dirigido por Ben Leonberg, com uma carreira interessante em curtas, o filme acompanha Indy, um cachorro que se muda com seu dono Todd (Shane Jensen) para uma casa de campo assombrada após problemas de saúde. A premissa é simples: enquanto Todd ignora os rumores sobre forças sobrenaturais que habitam a antiga casa do avô, já falecido, seu fiel companheiro canino começa a enxergar presenças fantasmagóricas pelos cantos vazios do lugar. Quando o dono sucumbe às entidades malignas, cabe a Indy protegê-lo.
O olhar do cachorro
O grande trunfo de Bom Menino está justamente na escolha de perspectiva. Leonberg – que, curiosamente, é o tutor real de Indy – conduz a narrativa pelos olhos do cachorro, criando uma experiência que subverte os clichês do terror de casa assombrada. A câmera permanece na altura do animal, e somos forçados a interpretar o mundo através de suas reações, seus instintos, sua lealdade inabalável. É uma jogada ousada que funciona especialmente bem no início, quando a novidade da proposta se impõe com força.
A linguagem e a estética lembram algo de Skinamarink: Canção de Ninar, outro terror bastante experimental que coloca acontecimentos sobrenaturais sob os olhos de crianças.
O desempenho de Indy é, sem nenhum exagero, o coração pulsante do filme. Cada olhar, cada movimento de orelha, cada latido carrega uma convicção rara de se ver em performances animais no cinema. Leonberg demonstra paciência e habilidade ao extrair nuances emocionais genuínas de seu companheiro de quatro patas, transformando o que poderia ser mero truque narrativo em algo tocante e cinematograficamente relevante.
‘Bom Menino’ é todo contado sob a perspectiva de um cachorro enxergando assombrações Foto: Paris Filmes/Divulgação
O problema surge quando o filme precisa equilibrar essa perspectiva inovadora com a presença humana em cena. Shane Jensen, no papel de Todd, está visivelmente desconfortável, entregando uma atuação artificial que destoa completamente do naturalismo conquistado por Indy. Cada cena com o ator traz uma rigidez que quebra a atmosfera, criando um contraste entre a autenticidade do cachorro e a artificialidade de seu dono.
Com apenas 72 minutos de duração, Bom Menino não consegue sustentar completamente sua proposta até o final. Por volta da metade, a repetição de situações começa a pesar, e fica evidente que a história não tinha fôlego suficiente para um longa-metragem completo – talvez sintoma da experiência do diretor apenas com curtas. Leonberg encontra algumas soluções criativas para reformular os sustos típicos do gênero sob a ótica canina, mas não o bastante para evitar que o filme caia numa certa previsibilidade pelo final.
Ainda assim, o saldo é positivo. Bom Menino é o tipo de experimento que o cinema de terror precisa: pequeno, corajoso e disposto a arriscar numa ideia que poderia facilmente desandar.
Leonberg demonstra que há caminhos inexplorados mesmo em terrenos tão batidos quanto o das mansões assombradas, e que às vezes basta mudar o ponto de vista – literalmente baixá-lo até o chão – para encontrar algo novo a dizer sobre o medo, a lealdade e o sobrenatural. Apesar dos tropeços, o filme vale pela ousadia da proposta e, principalmente, pela presença magnética de seu protagonista de quatro patas.