O Tribunal de Contas italiano recusou esta semana autorizar um plano histórico do Governo para construir uma ponte para ligar a Sicília ao continente — que será a maior ponte suspensa do mundo —, lançando sérias dúvidas sobre a viabilidade do projecto de 13,5 mil milhões de euros.
Já o ministro italiano das Infra-estruturas, Matteo Salvini, prometeu avançar com o projecto da ponte, mas garante que vai responder às objecções do Tribunal de Contas para evitar um conflito institucional. Salvini falava após uma reunião convocada pela primeira-ministra Giorgia Meloni para discutir a recusa do tribunal em dar luz verde o projecto.
O tribunal irá apresentar as suas justificações no prazo de 30 dias, mas durante uma audiência na quarta-feira questionou a validade do concurso, originalmente realizado em 2005, apontando para um aumento dos custos projectados e criticando a condução dos procedimentos.
“Aguardamos as observações do tribunal com toda a calma e estamos confiantes de que podemos responder-lhes ponto por ponto, porque cumprimos todos os regulamentos”, afirmou Salvini, que fez do projecto anteriormente abandonado uma prioridade fundamental do governo.
“Se tivermos de voltar ao Conselho de Ministros no início de Dezembro e voltar ao Tribunal de Contas para apresentar todas as razões que nos levam a avançar, fá-lo-emos”, acrescentou, dizendo que esperava por uma nova audiência em Janeiro para permitir o início dos trabalhos em Fevereiro. “Não existindo qualquer conflito entre os poderes do Estado, forneceremos todas as informações solicitadas.”
Salvini atenuou assim as suas próprias declarações numa entrevista ao diário Corriere della Sera na quinta-feira, onde acusou o tribunal de parcialidade contra o governo.
Na sequência dos seus comentários, o tribunal emitiu uma declaração apelando ao respeito pelos seus juízes e afirmou que a sua decisão abordava apenas os aspectos jurídicos do plano, rejeitando qualquer sugestão de parcialidade.
Risco ambiental
Os críticos do projecto afirmam que a planeada ponte suspensa de 3,7 km entre Messina e a Calábria será prejudicial para o ambiente, tendo em conta que a zona já sofreu terramotos devastadores no passado. O projecto tem enfrentado uma forte oposição por parte daqueles que questionam a sensatez de construir uma ponte deste tipo numa zona sísmica.
Muitos receiam também derrapagens nos custos, possíveis danos ambientais e infiltração da máfia nos contratos de construção.
Alguns grupos de cidadãos que se opõem à ponte consideram-na desnecessária. Em Agosto, associações ambientalistas apresentaram mesmo uma queixa à União Europeia, onde assinalaram os graves riscos para o ambiente.
Por outro lado, a ponte tem também um forte apoio daqueles que acreditam que uma ligação ferroviária e rodoviária rápida dará um impulso fulcral à Sicília e ao resto das regiões do sul de Itália.
A actual travessia de ferry demora cerca de 20 minutos, para além do embarque e desembarque, que podem demorar horas em períodos de hora de ponta. Os comboios de e para a Sicília também são embarcados nos ferries, num processo que demora cerca de duas horas.
Incerteza jurídica de ignorar decisão
O governo pode decidir ignorar a decisão e seguir em frente, arriscando uma possível acção judicial por parte dos muitos opositores deste empreendimento controverso.
Giuliano Fonderico, professor de direito administrativo na Universidade Ca’ Foscari de Veneza, explicou à Reuters que conhecer a argumentação do tribunal será fundamental para eventuais acções judiciais futuras.
“Imaginemos que a construção não pode ser concluída ou que se revela muito mais cara do que o previsto. O facto de o tribunal já ter indicado estas circunstâncias tornará mais difícil para os responsáveis dizerem: ‘Não tenho culpa; não sabia de nada’”, disse à Reuters.
Depois de tomar conhecimento da decisão do tribunal na quarta-feira, Georgia Meloni denunciou-a como uma manobra política, num contexto de tensões com o poder judicial devido a uma reforma radical do sistema jurídico do país, aprovada pelo Parlamento na quinta-feira.
A ponte para a Sicília, que tem uma população de 4,7 milhões de habitantes, deverá estar pronta em 2032, informou a Companhia do Estreito de Messina. O contrato tinha sido adjudicado ao consórcio Eurolink na sequência de um concurso internacional realizado há cerca de 20 anos atrás. Liderado pela empresa italiana Webuild, inclui o grupo espanhol Sacyr e a empresa japonesa IHI. O custo inicial foi estimado em apenas 3,8 mil milhões de euros.