O jornal mais popular da Hungria foi adquirido por um grupo empresarial alinhado com o Governo ultranacionalista de Viktor Orbán, reforçando ainda mais o domínio governamental sobre a paisagem mediática do país, a poucos meses das eleições legislativas.

O negócio foi anunciado esta semana e chocou os jornalistas do Blikk, um tablóide de grande circulação que tinha até agora uma postura crítica do Governo. O grupo Indamedia, cujo dono é um aliado de Orbán, revelou ter adquirido várias publicações pertencentes à suíça Ringier, incluindo o Blikk e a revista Glamour.

Na segunda-feira, o director do jornal, Ivan Zsolt Nagy, anunciou a sua saída e de vários outros jornalistas. Nagy disse, citado pela AFP, ter sido contratado há sete meses com a missão de “concentrar [o jornal] não no sensacionalismo, mas em histórias interessantes” e reorientar a cobertura para incluir mais “política, economia e cultura”.


Um jornalista do Blikk disse que quase teve um ataque cardíaco quando soube da aquisição do jornal pelo grupo pró-Fidesz. “Para mim, isto é moralmente inaceitável”, afirmou, sob anonimato, citado pelo Guardian.

A Indamedia é detida em 50% pelo empresário Miklos Vazsily, muito próximo de Orbán. Vazsily é director do canal TV2 que recentemente aderiu a uma plataforma digital criada pelo Governo no início do ano.

“Através da aquisição da Ringier Hungria, o grupo ganha uma empresa de media com bons indicadores de tamanho idêntico à Indamedia, com uma posição de mercado forte e marcas bem-sucedidas que têm um papel definidor na paisagem mediática húngara”, afirmou o director-geral da Indamedia, Gábor Ziegler, que também detém 50% da empresa.

A Ringier garantiu que a venda teve como base “apenas considerações económicas”, segundo um comunicado citado pela AFP.

A compra de um dos jornais mais lidos na Hungria – o site chega a três milhões de leitores por mês – reforça ainda mais o controlo do Governo sobre os meios de comunicação húngaros. A organização Repórteres Sem Fronteiras define Orbán como um “predador da liberdade de imprensa” e num relatório divulgado ainda antes desta aquisição estimava que empresários próximos do Fidesz controlavam cerca de 80% dos meios de comunicação húngaros.

A compra do Blikk acontece a poucos meses de umas eleições legislativas extremamente importantes para o futuro da Hungria e nas quais a hegemonia do Fidesz – que está no poder desde 2010 – parece ameaçada como nunca antes.

As sondagens atribuem algum favoritismo ao Tisza (Respeito e Liberdade), partido de centro-direita liderado por Peter Magyar, que também criticou a aquisição do jornal. O político tem denunciado frequentemente a transformação dos meios de comunicação húngaros em “fábricas de propaganda” ao serviço do Governo.

Eleições cruciais

A compra acontece depois de o líder da oposição dizer que a equipa de Orbán lhe estava a mostrar números de sondagens que não eram reais e que só recentemente é que János Lázár, uma das figuras do partido que é considerada uma hipótese para sucessão do actual primeiro-ministro caso o partido se mantenha no poder, lhe mostrou a vantagem de Magyar. Este diz que Orbán percebeu agora que “não pode vencer de modo justo”.

O partido no poder tem levado a cabo campanhas contra Magyar – incluindo vídeos com recurso a inteligência artificial, tentativas de o apresentar como um agressor, etc – mas estas não tiveram sucesso.

O site de investigação Direkt36 diz também que o partido no poder substimou Magyar “até que foi tarde demais”.

Vários analistas temem que as eleições de Abril marquem um novo passo na escalada autoritária da Hungria. Até agora, sob o domínio do Fidesz, as eleições não eram justas (pelo domínio dos media e alterações ao sistema eleitoral que favorecem o partido no poder) mas também que possam não ser livres.