Eu estava tão bem dispostinha. Fiz anos no início da semana — não me entupam a caixa de comentários com parabéns atrasados, deixem lá isso — e foi um bom dia. Fiz uma sessão dupla de cinema numa sala com boas cadeiras e matinés povoadas de reformados privilegiados com uma vida social ativa, que me inspiram. Vi um filme que passadas 24 horas ainda não sei se gostei, e que traumatizou ligeiramente a namorada do meu filho, Bugonia, e outro que reacendeu a chama nunca apagada da minha eterna girl crush, Julia Sorriso-Mais-Bonito-Da-História-do-Cinema Roberts, Depois da Caçada. Fui ao meu chinês favorito, acabei no meu coreano de eleição. Um dia supimpa.

Corta para uma noite no sofá com uma malga de sopa de espinafres a ver a nova série de Ryan Murphy All’s Fair, na Disney Plus. E nem sequer posso exercer represálias sobre o editor, porque fui eu que me propus a ver esta desgraça em três atos. E digo três, porque é o número de episódios servido na estreia. Estou capaz de apostar o dedo mindinho do pé direito em como os sete que se hão-de seguir vão ser igualmente maus.

Não é uma aposta muito ambiciosa, bem sei, mas muito embora All’s Fair me tenha dado ganas de enfiar um garfo de sobremesa no olho, não há aqui nadinha que seja merecedor de sacrifício de monta. E isto apesar de Sarah Paulson, que é absurda de boa, mas não salva a honra da firma. Esta é uma série de advogadas “mulheres que defendem mulheres”, mas faz tão bem ao feminismo como a Ministra do Trabalho “o que estas gajas querem sei eu…” Maria do Rosário Ramalho. Soubesse eu o que sei hoje e mais valia uma maratona do Keeping Up with the Kardashians, do que três episódios disto. Se calhar estou a exagerar, mas isto ainda está muito a quente.

[o trailer de “All’s Fair”:]

All’s Fair começa com um flashback. Dez anos antes, Allura Grant (Kim Kardashian) e Liberty Ronson (Naomi Watts) trabalhavam numa firma de advogados carregadinha de misóginos, ó espanto, e decidiram dar um pontapé na mesa de mogno e abrir a sua própria firma. A advogada sénior Dina Standish (Glenn Close), “aquela que andou para outras poderem correr” (esta expressão dá-me um pouco de náusea, o que a torna absolutamente adequada para a circunstância), apoiou-as a seguir em frente e até lhes deu permissão para levaram uma pessoa da firma, como se elas precisassem desse indulto para alguma coisa, mas enfim.

Ao invés de convidarem outra advogada, escolheram a investigadora Emerald Greene (Niecy Nash) o que provocou uma dor de corno de proporções bíblicas a Carrington Lane (Sarah Paulson). Carrington descontou a raiva na mentora Dina e na decoração do escritório dela, que a tentou acalmar recorrendo a uma citação de Golda Meir “Não ser bonita foi a verdadeira benção. Obrigou-me a desenvolver os meus recursos internos”. E não há nada mais apaziguador para alguém que se está a sentir preterida e injustiçada, do que acrescentar que é um valente estafermo.

A rejeição deu-lhe fogo no rabo e Carrington decide abrir a sua própria firma e promete passar o resto dos seus dias a alimentar com um dieta rica em vitaminas e proteínas este ódiozinho de estimação. Dez anos depois, a firma Granton, Ronson anda Green é um sucesso, como é demonstrado numa cena que leva o conceito de exposição para todo um novo nível: “Então, qual foi o teu caso preferido dos últimos 10 anos?”. Isto não é enfiar informação pela goela abaixo do espectador, isto é um clister.