O confronto entre o Parlamento Europeu e o executivo comunitário, por causa da proposta para o próximo quadro financeiro plurianual (QFP) a partir de 2028, já não deverá chegar a vias de facto. Esta segunda-feira, os eurodeputados voltaram atrás na sua ameaça de votar uma moção de rejeição do plano orçamental apresentado pela Comissão, depois de esta se ter comprometido a avançar com um conjunto de emendas nos regulamentos para responder às objecções e críticas dos parlamentares.

“Clarificámos e reforçámos os nossos objectivos em três áreas fundamentais: garantir o papel das regiões, reforçar a identidade da Política Agrícola Comum [PAC] e melhorar a governação. Temos agora uma compreensão sólida das propostas e um caminho claro a seguir”, escreveu Ursula Von der Leyen na rede social X, assim que terminou uma reunião por videoconferência com a presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola, e a primeira-ministra da Dinamarca, Mette Frederiksen, convocada ao abrigo do artigo 324 do Tratado de Funcionamento da União Europeia (UE).

O artigo estabelece que, no âmbito dos procedimentos orçamentais, e “por iniciativa da Comissão”, os presidentes das três instituições devem tomar “todas as medidas necessárias para promover a concertação e a aproximação das posições das instituições a que presidem, a fim de facilitar a aplicação das disposições do QFP”.

Numa carta endereçada a Metsola e a Frederiksen no domingo, Ursula von der Leyen justificou a reunião com a necessidade de se “fazer um balanço conjunto das discussões até ao momento, e fornecer orientações políticas para o trabalho futuro” — traduzindo por miúdos, o que a líder do executivo comunitário queria perceber era qual a sua margem de manobra para evitar que a reforma do QFP caísse por terra num braço de ferro institucional entre o Parlamento Europeu e os Estados-membros.


No cerne do conflito está a proposta da Comissão para uma reconfiguração total da estrutura do orçamento comunitário, com a fusão das chamadas políticas tradicionais da Agricultura e Coesão num mesmo envelope, cujo montante é gerido pelos governos nacionais através de um plano estratégico de reformas e investimentos (num modelo semelhante ao dos Planos de Recuperação e Resiliência, em que as transferências dependem do cumprimento de marcos e metas). Na proposta de Bruxelas, essas chamadas “Parcerias Nacionais e Regionais” absorvem 865 mil milhões de euros do orçamento, que ascende aos dois biliões (milhões de milhões) de euros.

A ideia foi muito mal recebida pelas organizações representativas dos agricultores e pelo Comité das Regiões, e levou o Parlamento Europeu a tomar uma posição de força: no final de Outubro, os líderes e relatores dos grupos Partido Popular Europeu, Socialistas & Democratas, Renovar a Europa (liberais) e Verdes — que compõem a maioria pró-europeia que apoiou a reeleição de Von der Leyen —, avisaram a presidente da Comissão que não aceitariam negociar o QFP se a proposta não fosse alterada.

Os eurodeputados elencaram as suas razões de queixa e avançaram sete exigências para alterar a sua oposição. Na carta enviada às presidentes do Parlamento e do Conselho da UE, Von der Leyen dava conta da disponibilidade da Comissão para introduzir “emendas” e acrescentar “salvaguardas” nas propostas dos regulamentos, para melhor reflectirem as opiniões expressas “sobre o papel das regiões e a necessidade de continuidade do investimento nas regiões, as preocupações quanto ao futuro da PAC e a necessidade de uma governação reforçada, envolvendo o Parlamento Europeu e o Conselho”.

À missiva foi, de resto, anexo um documento de oito páginas a detalhar as emendas e salvaguardas em que a Comissão já está a trabalhar para tornar o regulamento dos futuros planos de parcerias nacionais e regionais “um quadro de programação mais coerente, mais simples e com maior impacto para os Estados-membros e as regiões”.

Uma das emendas diz respeito à definição de um montante mínimo de 300 mil milhões de euros que têm de ser obrigatoriamente canalizados para a PAC, e o estabelecimento de uma “meta rural”, que também terá uma percentagem mínima obrigatória dentro dos envelopes dos planos estratégicos nacionais e regionais. Outra tem a ver com o envolvimento das autoridades regionais e locais na “preparação, implementação e avaliação” desses planos. E outra ainda com o modelo de funcionamento do “mecanismo de governança”, para reforçar o papel do Parlamento Europeu e do Conselho da UE.


Na mensagem publicada no X esta segunda-feira, Ursula von der Leyen dizia aguardar, “com expectativa”, pelo debate sobre a proposta de arquitectura e governação do QFP para 2028-34, que foi marcado para quarta-feira, no Parlamento Europeu. A primeira agenda da miniplenária desta semana, em Bruxelas, incluía a votação de uma moção depois do debate, que já não constava numa nova versão revista, aprovada pelos líderes das bancadas parlamentares ao início da tarde.