A fraude no conta-quilómetros e os danos não declarados continuam a fazer parte da realidade do mercado de veículos usados em Portugal, sem indícios de que a situação vá mudar em breve. A ‘carVertical’, empresa de dados automóveis, realiza anualmente uma análise à transparência do mercado europeu de veículos, identificando os países onde a compra de um carro usado representa maior risco para o consumidor.

Em 2025, Portugal ocupa a 16ª posição entre 25 países, descendo face ao 11º lugar registado em 2024. Entre os países vizinhos, Espanha surge em 12º e França em 5º.

Tendências em Portugal – manipulação da quilometragem e danos ocultos continuam a ser um problema

O estudo da ‘carVertical’ revelou que a descida de Portugal no ranking se deve ao aumento das fraudes no conta-quilómetros e à maior incidência de veículos sinistrados. Este ano, 3,8% das viaturas verificadas no país apresentavam quilometragem adulterada, um valor superior aos 2,2% registados em 2024. Em média, os conta-quilómetros foram recuados em aproximadamente 92 900 km.

“Quando compram um carro usado, os condutores costumam ter uma ideia clara da quilometragem que consideram aceitável. Alguns procuram modelos com menos de 100 mil quilómetros, outros estabelecem o limite nos 200 mil. A verdade é que os veículos com muita quilometragem são mais difíceis de vender; por isso, alguns vendedores sem escrúpulos recorrem à manipulação do conta-quilómetros para tornar o veículo mais apelativo e aumentar os lucros”, explica Matas Buzelis, especialista automóvel da ‘carVertical’.

O mercado português é ainda fortemente influenciado pelas importações: 61,5% dos veículos analisados foram trazidos do estrangeiro. Infelizmente, os carros importados têm maior probabilidade de apresentar quilometragem manipulada ou danos ocultos.

De acordo com o estudo, 40,3% dos veículos em Portugal tinham registo de sinistro, uma subida face aos 35,9% de 2024, sendo que o valor médio das reparações ascende aos 4000 euros.

A antiguidade média dos veículos analisados em Portugal foi de 10 anos, um aumento face aos 8,5 anos registados em 2024, o que mostra que os compradores portugueses estão a optar por automóveis ligeiramente mais antigos.

Reino Unido, Itália e Alemanha – os mercados mais transparentes

O Reino Unido voltou a ocupar o primeiro lugar no Índice de Transparência. Apenas 2,3% dos veículos apresentavam quilometragem manipulada e 17% tinham registo de danos. Como é um dos poucos países europeus onde se conduz pela esquerda, o Reino Unido depende pouco das importações. Apenas 2,3% dos veículos em circulação são importados, o que minimiza os riscos para os compradores locais.

Itália, Alemanha, Suíça e França completam o top 5 dos mercados mais transparentes. Já a Suécia, que no ano passado ocupava o 5º lugar, caiu para o 10º posto, devido ao aumento das importações, ao maior número de veículos danificados no mercado e a uma subida das manipulações de quilometragem. Portugal é outro dos países que registou uma descida significativa, passando de 11º para 16º lugar. Por outro lado, a Croácia foi a que mais melhorou, subindo de 15º para 11º.

“Os mercados mais transparentes situam-se sobretudo na Europa Ocidental e na Escandinávia. Isso explica-se por uma menor dependência das importações, níveis de vida mais elevados e um maior acesso a dados sobre os veículos. Quanto mais dependente for um país das importações e mais difícil for a sua situação económica, maior é o risco de fraude no conta-quilómetros e de danos ocultos. Os países escandinavos também se destacam por disponibilizarem mais dados automóveis aos seus consumidores”, explica Buzelis.

Mercados da Europa de Leste continuam a ser os mais arriscados

Os cinco países menos transparentes mantêm-se inalterados em relação ao ano passado. A Ucrânia continua no fundo da tabela, seguida da Letónia, Lituânia, Roménia e Estónia. Estes mercados partilham características comuns: elevada proporção de veículos importados, frotas mais envelhecidas, manipulação frequente da quilometragem e alta percentagem de automóveis com registos de danos.

“Muitos dos carros importados para a Europa de Leste já têm uma quilometragem bastante elevada. Na tentativa de lucrarem mais, alguns vendedores manipulam o conta-quilómetros, disfarçam danos ou omitem o histórico real do veículo. Estes automóveis acabam por avariar com maior frequência e, em vez de poupar na compra de um usado, o condutor acaba por gastar muito mais do que esperava. Além disso, o movimento transfronteiriço de veículos usados é difícil de rastrear; essa continua a ser a principal razão pela qual algumas viaturas são manipuladas”, afirma Buzelis.

Segundo o especialista da carVertical, a falta de partilha de informação entre países leva a que muitos registos de quilometragem e de sinistros fiquem por atualizar ou digitalizar. A ausência de um sistema harmonizado de acompanhamento das vendas de automóveis dentro da União Europeia facilita a ocultação de práticas fraudulentas.

Na Ucrânia, 9,5% dos automóveis apresentavam quilometragem manipulada; na Letónia, foram 10,8%; na Lituânia, 7%; na Roménia, 7,5%; e na Estónia, 5,9%. As importações variaram entre 61% na Roménia e 78% na Ucrânia.

Como é calculado o Índice de Transparência?

O estudo da ‘carVertical’ analisou os relatórios históricos de veículos adquiridos pelos clientes na plataforma entre setembro de 2024 e agosto de 2025. O índice de transparência baseia-se em seis indicadores:

● percentagem de veículos com quilometragem adulterada;

● valor médio da manipulação do odómetro (em quilómetros);

● percentagem de veículos sinistrados;

● valor médio dos danos registados;

● proporção de veículos usados importados;

● antiguidade média dos veículos analisados.

Como o impacto previsto de cada fator na transparência do mercado pode variar, os especialistas em dados da ‘carVertical’ atribuíram pesos diferentes a cada indicador. Por exemplo, em cada país, a percentagem de veículos com quilometragem adulterada tem um peso superior ao da antiguidade média dos veículos verificados.

A ‘carVertical’ exerce a sua atividade em 35 países e recolhe dados de mais de 900 bases de dados mundiais, tais como autoridades policiais, registos nacionais/estatais, instituições financeiras e anúncios. Ao processar milhões de relatórios históricos de veículos por ano, a empresa consegue apresentar tendências, previsões abrangentes e informações únicas sobre o mercado de veículos usados.