O estatuto de uma pessoa refugiada será temporário e, se o país de origem for entretanto considerado seguro, ela será obrigada a regressar; uma pessoa terá de viver no Reino Unido 20 anos antes de poder pedir residência permanente; e a ajuda automática dada a requerentes de asilo vai acabar: estas serão algumas das novas regras que a ministra do Interior do Reino Unido, Shabana Mahmood, anunciará esta segunda-feira.

A ministra deu várias entrevistas (ao jornal The Sunday Times e às estações de televisão BBC e Sky News) em que explicava o objectivo do que descreveu como “a reforma mais profunda para combater a migração ilegal nos tempos modernos”: “é basicamente dizer às pessoas: não venham para este país como migrantes ilegais, não entrem num barco”, declarou.

As medidas duras, inspiradas no que o Governo de centro-esquerda fez na Dinamarca – e apresentadas numa altura em que as sondagens mostram de forma consistente o partido de direita radical e anti-imigração Reform UK, de Nigel Farage, na liderança das intenções de voto – são necessárias porque “a imigração ilegal está a dividir o país”. O Governo, continuou, tem a obrigação “de unir o nosso país”.


“Este país tem uma tradição orgulhosa de receber quem foge do perigo, mas a nossa generosidade está a atrair migrantes ilegais”, com o “ritmo e a escala da migração a pôr uma pressão imensa sobre as comunidades”.

O estatuto de refugiado terá, com as novas regras, uma duração de dois anos e meio, menos que os cinco actuais. Será revisto periodicamente (a cada dois anos e meio) e as pessoas de países que entretanto sejam considerados seguros serão mandadas “imediatamente” de volta.

Por outro lado, em vez de um período de cinco anos necessário até que uma pessoa com estatuto de refugiado possa pedir residência permanente no país, as novas regras aumentarão esse período para 20 anos, destaca a emissora britânica BBC.

Fim de apoio automático

O Guardian, por sua vez, sublinha o plano de alterar as leis que garantem alojamento e apoio financeiro a pessoas refugiadas, dizendo que a ajuda será decidida caso e caso e não automática: quem puder trabalhar ou tiver bens não a receberá assim como quem infringir a lei.

A maioria dos refugiados não deverá, no entanto, ser afectada, porque as regras governamentais que os impedem de trabalhar não irão mudar, dizem tanto o Guardian como a BBC.

Há cerca de 100 mil pessoas a receber apoio de asilo no Reino Unido, a esmagadora maioria alojada pelo Estado, com um terço em hotéis, uma prática que o Governo quer acabar até 2029.


Há 8500 pessoas alojadas pelo Estado que têm direito a trabalhar, porque entraram no país com um visto e só depois pediram asilo.

Quem está à espera há mais de um ano de uma resposta ao pedido de asilo pode, por vezes, ter autorização para fazer trabalho pago, diz ainda a BBC, mas apenas num número limitado de áreas onde se considere que há uma significativa falta de candidatos.

O Guardian indica que há cerca de 19 mil pessoas à espera mais de um ano por uma resposta ao seu pedido de asilo e que a maioria não está elegível para trabalhar.

ONG pedem “sistema justo”

O responsável da organização não-governamental Refugee Council reagiu sobretudo ao aumento do prazo para pedir residência permanente de 20 anos. Para Enver Solomon, este prazo tão grande não irá deter pessoas de procurar o Reino Unido mas sim “deixá-las num limbo e numa ansiedade tensa por muitos, muitos anos”.

O responsável disse à BBC que “o que precisamos é de um sistema que seja controlado e justo, e como se chega aí é ter decisões feitas de justo, atempadas, e se alguém tiver estatuto de refugiado então eles continuam e contribuem para as nossas comunidades e retribuem”.

A emissora diz que nos 12 meses até Março deste ano, pediram asilo 109,343 pessoas, um aumento de 17% em relação ao ano anterior e 6% em relação ao ano com mais chegadas, 103,081 em 2002.


O Guardian conta que uma delegação do Ministério do Interior esteve em Copenhaga para estudar o modelo dinamarquês, considerado dos mais duros da União Europeia.

O ministério indicou que as medidas da Dinamarca tinham reduzido os pedidos de asilo que estavam actualmente no número mais baixo dos últimos 40 anos e que resultaram na deportação de 95% dos requerentes cujos pedidos foram rejeitados.

Organizações de defesa de direitos humanos dizem que as medidas do país fomentam um clima hostil para migrantes e falham na protecção aos requerentes de asilo, deixando-os num limbo prolongado, segundo a Reuters.

No Reino Unido, mais de cem organizações escreveram a Mahmood pedindo-lhe que “acabe com a representação de migrantes como bodes expiatórios e políticas performativas que só causam dano”, como o aumento do racismo e da violência.