Quando Óscar Monchique viu, pela primeira vez, um então ainda menino Carlos Forbs a jogar à bola num rinque de Rio de Mouro, junto ao pavilhão do Núcleo de Sintra, ficou arrebatado. «Era a aptidão dele, a velocidade, a reação», recorda, mas também o carácter de «bom menino» que o agora avançado do Club Brugge, convocado por Roberto Martínez para os últimos dois jogos da Seleção na fase de qualificação para o Mundial 2026, ainda preserva. «Era daqueles miúdos que, só de vê-lo, já sabíamos que ia ser jogador», atira o atual presidente do clube sintrense. E não é que deu mesmo?

Filho de pais guineenses, Carlos cresceu em Sintra, acompanhado pelos amigos e a bola. O rinque junto ao pavilhão Serra das Minas, casa do Núcleo de Sintra, serviu de tubo de ensaio para aprimorar um talento ao qual, desde bem cedo, ninguém ficava indiferente.

Mas atenção, aquele também não era um rinque qualquer. Afinal, foi ali que, anos antes, Estrela, formado no Benfica e que disputou a Liga pelo Aves em 2019/2020, e Ricardo Vaz Tê, que fez carreira na Premier League pelo Bolton e o West Ham, começaram a desvendar os segredos do mundo mágico da bola. Uma aura de ilusão que contagiou Forbs, que já então «parecia uma máquina a jogar à bola».

Podem ter já passado 14 anos desde que Carlos Forbs e os amigos vestiram pela primeira vez a camisola do Núcleo de Sintra, mas a memória de Óscar Monchique continua recheada de recordações desses tempos.

«Ele tinha muita entrega nos treinos. Existem aqueles miúdos em que pensamos “ele há de aprender, mas vai demorar algum tempo”. Mas com o Forbs não, tal como aconteceu com o Estrela ou o Ricardo Vaz Tê. Notava-se que tinham vocação para aquilo», conta o atual presidente do clube.

Essa vocação expressou-se, primeiro, no futsal, «mas o Forbs já tinha algumas tendências para o futebol», admite Óscar Monchique. «A vontade dele era estar sempre a jogar à bola. Quando entrava em jogo, dava tudo, parecia uma máquina. Nunca tinha vontade de sair. Por vontade dele, jogava o jogo todo e ainda mais um bocado. Era até não conseguir mais», conta o dirigente, nostálgico.

Não tardou a que Óscar Monchique recomendasse Forbs ao Sporting. Sim, foi o presidente do Núcleo de Sintra quem ajudou a abrir essa porta, algo que ainda hoje faz em prol dos miúdos do seu bairro.

«Temos uma relação boa com o Sporting. Nas últimas duas épocas foram para lá pelo menos quatro jogadores nossos. Eles dizem sempre “Óscar, vê lá, quando houver aí miúdos bons fala connosco”», conta. E Óscar, no clube desde 1996, não se cansa de o fazer. Mesmo que ali tudo se faça «a custo zero, ninguém ganha nada». A não ser os jovens que anseiam por uma oportunidade de mostrar o seu talento.

De companheiro de Chico Conceição no Sporting a craque no City

Forbs passou dois anos em Alcochete, onde jogava com regularidade num escalão acima do seu e chegou a ser companheiro de equipa de Francisco Conceição, que reencontrou no estágio da Seleção. «Eles faziam a diferença já na altura, notava-se que tinham a “estrelinha”», recorda Nuno Oliveira, hoje no Marialvas, do Campeonato de Portugal, que coincidiu com a dupla no único ano em que representou o Sporting.

Não se pode dizer que Forbs o tenha feito por muito mais tempo. Ainda criança, mudou-se com a família para Inglaterra. Se fosse por si, teria preferido ficar junto dos amigos de sempre, como chegou a contar no podcast The Locker Room, mas a vida impunha-se. Tal como o seu talento para a bola, que lhe haveria de voltar a abrir as portas de um clube grande, no caso o Manchester City, onde se fez homem e alargou horizontes.

Entre títulos e distinções – foi eleito o jogador do ano da Premier League 2 em 2023 – Carlos Forbs virou caso sério de talento emergente, que o Ajax, um especialista na matéria, procurou lapidar quando o contratou, há dois anos, por 14 milhões de euros.

A experiência não teve um desfecho simpático para o português, dispensado por Whatsapp depois de meio ano emprestado ao Wolverhampton, mas a redenção não demorou.

O imbróglio em Amesterdão foi visto pelo Club Brugge como uma oportunidade. No último verão, o clube belga não hesitou em pagar 8,5 milhões de euros para resgatar Forbs, um investimento com retorno já garantido, sobretudo depois da noite de sonho vivida pelo avançado português, na Liga dos Campeões, frente ao Barcelona.

Ligação ao Núcleo de Sintra continua forte

«Acho que as experiências que tive no futebol me deram maturidade. Consegui adaptar-me em cada país e isso ajuda», reconheceu o internacional jovem por Portugal, ao Canal 11, após ter sido convocado pela primeira vez para a Seleção principal.

Nessa ocasião, contou que soube da notícia por um telefonema de Rodrigo Mora. O seu telemóvel não terá tido muito descanso nesse dia e uma das pessoas que se apressou a ligar-lhe foi Óscar Monchique, presidente do Núcleo de Sintra.

«Dei-lhe os parabéns e ele agradeceu-me», conta o dirigente. A relação entre ambos ficou para sempre, bem como o carinho de Forbs pelo primeiro clube que representou. «Quando ele vem a Portugal, tenta arranjar sempre uma maneira de aparecer no clube. Ele gosta de falar com os miúdos, de estar e tirar fotografias com eles», refere Óscar Monchique.

Carlos Forbs chegou mesmo a oferecer equipamentos ao Núcleo de Sintra. «Fez questão, é um bom menino. O equipamento de saída dos nossos jogadores tem, nas calças de fato de treino, a assinatura dele», pormenoriza o dirigente.

O próximo domingo pode tornar-se num dia histórico para Forbs, que acalenta esperanças em poder estrear-se pela Seleção principal portuguesa no jogo com a Arménia, que pode garantir o apuramento de Portugal para a fase final do próximo Mundial.

«Gostava de ir ao Dragão, seria uma boa experiência, mas não se consegue proporcionar», desabafa Óscar Monchique, que vai puxar, à distância, para que a Seleção viva um dia para mais tarde recordar. E também Carlos Forbs, claro.