Cristiano Ronaldo continua a dividir Portugal. Aos 40 anos, o capitão soma recordes como poucos, mas os últimos jogos da seleção reacenderam um debate que transcende o futebol. Deve um jogador cuja marca, segundo um estudo recente do IPAM, vale 850 milhões de euros manter lugar cativo no onze, mesmo quando o rendimento desportivo já não é o mesmo?

Os críticos apontam o pragmatismo dos resultados. Com Ronaldo a titular, Portugal empatou com a Hungria e perdeu com a Irlanda. Sem ele, venceu a Arménia por 9-1. Estes números alimentam a tese de que o ritmo competitivo já não acompanha o estatuto.

Mas reduzir Cristiano Ronaldo a uma estatística é ignorar o fenómeno global que o acompanha.

A valorização da marca CR7, que cresceu de 200 milhões em 2020 para 850 milhões este ano, resulta de indicadores que poucas figuras mundiais conseguem reunir. Ronaldo tem mais de mil milhões de seguidores nas redes sociais, 22,3 milhões de notícias anuais e 187 milhões de pesquisas no Google. Nenhum atleta na história possui esta escala de impacto.

É aqui que a decisão do selecionador deixa de ser apenas técnica.

A presença de Ronaldo garante exposição mediática, receitas indiretas, audiências e notoriedade internacional. Em contexto de grandes competições, esta dimensão não é irrelevante. A seleção portuguesa não é apenas um projeto desportivo. Também é uma marca global em crescimento, que impulsiona a imagem e a atratividade de Portugal no exterior.

No outro lado da balança surge Gonçalo Ramos, 24 anos, avançado do PSG, avaliado em 40 milhões de euros. Representa o futuro, oferece mobilidade, intensidade e um perfil de avançado moderno que encaixa no jogo coletivo pretendido. A vitória por 9-1 sem Ronaldo reforça a ideia de que a seleção pode ganhar velocidade e imprevisibilidade com Ramos como referência ofensiva.

Mas a desvantagem é evidente. Por maior que seja o talento de Ramos, não transporta consigo nem a notoriedade, nem o impacto económico, nem o peso simbólico de Cristiano Ronaldo. Entre um ativo de 850 milhões e um jovem valorizado em 40 milhões, a diferença não é apenas financeira. É estrutural.

A gestão deste dilema exige visão estratégica. O mérito desportivo deve ser o critério central, mas ignorar a dimensão económica seria desperdiçar uma vantagem competitiva rara que, por intermédio da Seleção Nacional de futebol, o país tem.

A melhor solução poderá estar no equilíbrio. Usar Ronaldo de forma cirúrgica, maximizando o impacto mediático da sua presença, enquanto se dá espaço ao desenvolvimento competitivo de Ramos, que representa o futuro da seleção.

No fim, o que se espera de Portugal é rendimento desportivo ao nível do talento disponível, e esse talento é hoje maior do que jamais foi. Cabe ao selecionador gerir não apenas jogadores, mas ativos. E poucos ativos no mundo valem tanto, dentro e fora de campo, quanto Cristiano Ronaldo.

João Rodrigues dos Santos, Professor de Economia do Desporto e Coordenador Científico da área de Economia e Gestão da Universidade Europeia.