Sérgio Franco e Nelson Sousa estavam em Ortisei, nas Dolomitas, Itália, quando foram abordados pela polícia. Os portugueses tinham feito a viagem numa carrinha Mercedes Sprinter, transformada em autocaravana por Nelson. Naquele dia chuvoso, pararam para almoçar num restaurante local e estacionaram-na num parque próximo.
“Em dois minutos, chegou um carro da polícia e os agentes ficaram muito curiosos”, começa por contar à NiT Sérgio, de 34 anos, natural de Oeiras. O motivo? “Nunca tinham visto uma matrícula portuguesa. Portanto, viram o ‘P’ e vieram ter connosco”. O momento insólito não passou de um pequeno susto, que acabou numa conversa com os polícias.
Tudo aconteceu durante a viagem de 18 dias do Porto até Rovaniemi, na Finlândia, onde vão viver até abril de 2026 e trabalhar como guias da natureza. Os dois amigos, que se dedicam à fotografia e ao vídeo, decidiram fazer o percurso até ao destino por estrada. Pelo caminho, passaram por 13 países — Portugal, Espanha, França, Suíça, Itália, Liechtenstein, Áustria, República Checa, Polónia, Lituânia, Letónia, Estónia e Finlândia.
“Temos um amigo em comum que está a viver Rovaniemi há uns anos e que já trabalhou na empresa onde estamos agora”, explica Nelson, de 27 anos e natural da Trofa, no Porto. Quando surgiu a oportunidade de ir trabalhar para a Snowmobile Park, um parque temático que oferece várias experiências na natureza, decidiu estender o convite a Sérgio, que estava a viver nos Açores.
O encontro aconteceu em outubro de 2024 e, na altura, Nelson estava a meio da conversão da carrinha numa autocaravana. As “obras” terminaram em maio deste ano e a 13 de outubro, já estavam na estrada a caminho da Lapónia.
“Além de vivermos cinco meses na Finlândia, também queríamos aproveitar a experiência de estarmos quase três semanas na estrada para chegar lá, a atravessar vários países e visitar diversos locais”, explicam.
Além da experiência com a polícia nas Dolomitas, chegaram a ficar sem bateria na carinha nos Piréneus, em Espanha, devido ao frio (apanharam quatro graus negativos). Por sorte, só tiveram de a deixar ao sol para voltar ao normal, graças aos painéis solares.
Agora, já em Rovaniemi, estão a terminar as últimas formações para iniciarem os trabalhos. Nos próximos meses, vão trabalhar com as centenas de turistas que visitam a região para realizar passeios de mota de neve, trilhos para ver as auroras boreais, atividades com renas e huskies, entre várias outras.
“Na passada semana, tivemos o curso de primeiros socorros e também aprendemos algumas técnicas de como é que temos que lidar com determinadas situações e acidentes que podem acontecer nestas condições”, explicam. “Agora, estamos à espera que a neve chegue para começar o trabalho.”
Estiveram 18 dias na estrada.
Atualmente, estão a ajudar nas montagens dos equipamentos e a ter contacto com outros profissionais que explicam tudo o que precisam de saber para os próximos meses. “Dezembro e janeiro são normalmente as alturas mais agitadas devido ao Natal”, referem.
A dupla está também a habituar-se ao frio e às poucas horas de sol. “As temperaturas chegam aos 25 graus negativos e em dezembro vamos ter apenas duas horas de sol”, sublinham. “Mesmo agora, o sol nasce, fica no horizonte e desaparece logo”.
Com estas mudanças, estão também a preparar-se psicologicamente para viver cada vez mais horas no escuro. “Não é fácil lidar com isso. Acho que até é pior termos de lidar com a questão da luz do que com as temperaturas negativas”. Os dois amigos já têm experiência com temperaturas negativas. Há cerca de dois anos, visitaram as ilhas lofoten, na Noruega. A experiência foi também essencial para que se sentissem inspirados a procurar trabalho em zonas mais frias.
Agora, em Rovaniemi, estão a viver numa casa com outras 14 pessoas, “todas com nacionalidades diferentes.” Nesta altura, vários estrangeiros aproveitam para conhecer a região e também trabalhar com o turismo de natureza — o salário base para esta área é de 2.000€, sem contar as horas extra, que também são pagas.
“Esta zona é muito turística, mas é um turismo sazonal e obviamente ligado ao inverno”, apontam. “É muito conhecida porque tem a vila do Pai Natal.”
Sérgio e Nelson conheceram-se na Internet, em 2022, em plena pandemia de Covid-19. Na altura, ambos recorreram à aplicação Clubhouse, que se tornou viral por permitir que vários utilizadores com hobbies semelhantes criassem salas privadas para conversarem e conectarem-se.
“Começámos a pesquisar salas de filmmakers e malta ligada à fotografia, vídeo e drones”, recorda Sérgio. Foi numa dessas que nos conhecemos e o pessoal começou a seguir no Instagram. A partir daí, íamos falando e combinando pequenas aventuras.”
Um ano depois, fizeram a tal viagem até à Noruega. Mas antes disso já tinham realizado diversos trilhos em solo português, sobretudo na Serra da Arrábida, um dos sítios favoritos de Sérgio. Ao longo dos anos, continuaram a combinar aventuras pontuais até chegarem onde estão hoje.
“Viemos com vários objetivos. Para já, pela experiência de emigrar e ter um trabalho que, para a nossa realidade portuguesa, é bastante bem pago. Somos imigrantes e isto é um trabalho, possivelmente, mal pago para a maioria do finlandeses, mas, para nós, permite-nos criar outros objetivos”, referem.
Além disso, querem viver de perto a experiência de estar noutro país — ainda mais com um clima tão diferente do português. “Estamos a sair da zona, vamos ver como vamos reagir a isto.”
A dupla está também preparada para fazer alguns sacrifícios nos próximos meses. Além de passarem o Natal e o Ano Novo longe das respetivas famílias, Sérgio e Nelson vão falhar datas importantes, como os aniversários de familiares.
Carregue na galeria para ver algumas fotografias da viagem dos dois portugueses até agora.