J. Berner / M. Frachetti / SAIE lab

Mapa obtido por LIDAR da cidade encontrada em Tugunbulak, no Uzbequistão

Uma sofisticada cidade com muralhas monumentais, torres defensivas, ruas alinhadas e áreas residenciais, encontrada nas montanhas do Uzbequistão, no trajeto da Rota da Seda, poderá ser Marsmanda, metrópole produtora de ferro que é mencionada em fontes árabes do século X.

Uma equipa internacional de arqueólogos acredita ter identificado nas montanhas remotas do Uzbequistão a antiga cidade de Marsmanda, um enigmático centro metalúrgico referido por cronistas árabes do século X, e nunca antes localizado.

O possível achado situa-se na área de Tugunbulak, a cerca de 2.100 metros de altitude, num vale isolado das montanhas uzbeques, onde hoje apenas pastores e alguns agricultores passam os meses de verão.

A importante descoberta arqueológica, realizada com a ajuda de um sistema LiDAR acoplado a um drone, foi apresentada num artigo recentemente publicado na revista Nature.

A investigação, liderada por Michael Frachetti, investigador da Universidade de Washington, Farhod Maksudov, do Centro Nacional de Arquologia do Uzbequistão, e Sanjyot Mehendale, da Universidade da California, decorre há três anos, e está a revelar estruturas e vestígios que sugerem a existência no local de uma cidade fortificada com cerca de 120 hectares — o dobro da área de Pompeia.

Segundo a Smithsonian Magazine, entre os elementos identificados contam-se muralhas monumentais, torres defensivas, ruas alinhadas e áreas residenciais —  sinais surpreendentes para um local com um clima tão severo, onde a neve se mantém durante grande parte do ano.

Os investigadores foram inicialmente atraídos a estas montanhas em busca de vestígios da Idade do Bronze, mas depararam-se com milhares de fragmentos de cerâmica datados entre os séculos VIII e XI, período de apogeu da Rota da Seda.

Escavações subsequentes revelaram um pequeno palácio fortificado onde elites locais usufruíam de cerâmica vidrada, contas de vidro e anéis de prata, bem como uma zona urbana densa com habitações robustas, oficinas metalúrgicas e sinais de atividade têxtil.

O material encontrado reforça a hipótese de que esta região terá albergado um complexo industrial dedicado à extração, fundição e transformação de ferro.

Grandes blocos de minério com nódulos metálicos visíveis, estruturas de combustão e ferramentas associadas sugerem que mineiros, ferreiros e artesãos convergiam a esta cidade para produzir armas, ferragens, utensílios agrícolas e objectos essenciais às sociedades da Ásia Central medieval.

Estas manufaturas ter-se-iam difundido por uma vasta rede de circulação que ligava o Mediterrâneo, a Sibéria, o Sri Lanka e a Manchúria, que ficou conhecida como a Rota da Seda, consolidando o papel estratégico das montanhas no comércio intercontinental.

A sofisticação da cidade sugere que os habitantes das montanhas da região eram uma parte essencial da lucrativa rede de comércio que durante séculos ligou por terra o Ocidente e o Oriente.

Estes indícios levam assim os autores do estudo a acreditar a misteriosa área urbana é Marsmanda, também chamada “Cidade de Ferro”, metrópole produtora de ferro que é mencionada em fontes árabes do século X, cuja localização era até agora desconhecida.

A descoberta surpreende especialistas como Søren Michael Sindbæk, da Universidade de Aarhus, na Dinamarca, que destaca o carácter inesperado de um centro urbano de grande escala num ambiente tão inóspito.

“Encontrar um povoado do tamanho de uma cidade nesta paisagem montanhosa é uma surpresa total”, explicou à Smithsonian o investigador, que não esteve envolvido no estudo.

Os autores do estudo sugerem que os pastores da Idade do Bronze da Ásia Central viajavam para os prados de altitude durante o verão, onde encontravam nómadas de outros vales.

No local, combinavam casamentos, forjavam alianças e trocavam alimentos como trigo e milho-miúdo, bem como mercadorias como peles e metal, antes de regressarem às encostas mais baixas no final da breve estação.

Este processo repetia-se pelas diversas cadeias montanhosas da região, pelo que as rotas comerciais locais acabaram por formar cadeias que se estendiam por toda a Eurásia; ou seja, estes antigos pastores lançaram as bases para a Rota da Seda.


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