A comissão responsável pelas comemorações dos 50 anos do 25 de Novembro de 1975 vai exibir um documentário de 40 minutos, no cinema São Jorge, em Lisboa, no próprio dia em que se assinala o golpe ou contragolpe – conforme as versões -, da autoria de Armando Seixas Ferreira, ex-jornalista da RTP, que exerce as funções de assessor de imprensa do ministro da Defesa Nacional, Nuno Melo.
O documentário sobre esta data que continua a dividir atores e partidos políticos – e mesmo protagonistas daquele momento histórico -, foi realizado pelo assessor do ministro, sem qualquer contrapartida financeira adicional, no quadro da resolução do Conselho de Ministros que criou a comissão liderada pelo tenente-general Alípio Tomé Pinto.
O gabinete de Nuno Melo não quis fazer comentários, remetendo o Expresso para o ponto do diploma onde se determina que “o apoio administrativo, técnico e logístico, ao desempenho das atividades da Comissão é garantido pelo Ministério da Defesa Nacional, que poderá alocar, a pedido da Comissão, trabalhadores e colaboradores para o efeito, sem qualquer remuneração adicional decorrente destas funções”.
Armando Seixas Ferreira realizou entrevistas a dez militares que estiveram envolvidos nos acontecimentos, como Ramalho Eanes, Tomé Pinto, Valença Pinto, Pinto Ramalho, José Apolinário, ou Vaz Afonso, diz ao Expresso o major-general João Vieira Borges, um dos membros da comissão das comemorações. “O general Ramalho Eanes diz coisas que nunca tinha revelado” e são “testemunhos pouco conhecidos”, antecipa.
O documentário tem uma parceria com a RTP, que cedeu imagens da época do seu arquivo, como faz habitualmente quando recebe solicitações da mesma natureza, para exposições ou documentários, explica fonte oficial da estação.
A decisão deste Governo para comemorar o 25 de Novembro da mesma forma solene que se assinala o 25 de Abril, tem sido fonte de controvérsia e de divisão entre direita e esquerda. O PCP será o único partido ausente das cerimónias no Parlamento, e o PS será a única formação de esquerda representado por um deputado (Luís Dias), na parada militar.
O PS fará as suas próprias comemorações alternativas. Ainda esta sexta-feira, numa entrevista ao Expresso, o capitão de Abril – e militar de Novembro – Rodrigo Sousa e Castro, que pertenceu ao Conselho da Revolução, criticou a iniciativa governamental: “Pôr estas datas ao mesmo nível [25 de Abril e 25 de Novembro] é a última coisa que eu esperaria ver. É uma tentativa muito serôdia de reescrita da História por parte deste Governo. Uma jogada política, para não dizer pior”, afirmou.
O programa arranca na próxima terça-feira com uma parada militar na Praça do Comércio, às 9h00, com a presença do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. Mas as celebrações vão durar o ano todo, e incluirão o lançamento de um livro que, segundo declarações do major-general Vieira Borges à Lusa, deverá ser lançada em maio, com testemunhos de soldados e sargentos envolvidos na operação militar, e não só dos generais e coronéis, ou de outras figuras mais conhecidas.
As celebrações incluem o lançamento de um podcast sobre os acontecimentos relacionados com a efeméride, e a comissão vai ainda organizar várias conferências-debate por todo o país até maio. A primeira será para a semana, no dia 27 de novembro, na Madeira. Na segunda-feira, será inaugurada uma exposição intitulada “25 de Abril ao 25 de Novembro”, no Museu de Marinha, em Lisboa.
O PS terá um programa próprio, depois de ter recusado integrar a comissão criada pelo Governo, por considerar que este “pretende reescrever a história” ocultando o “papel central” de Mário Soares e dos socialistas. Mário Soares, como o Expresso escreveu na revista há um ano, foi o ator político mais ativo na luta para fazer frente ao PCP e aos esquerdistas, na fase do Processo Revolucionário em Curso (PREC), em que o país esteve à beira de uma guerra civil: da parte dos partidos políticos, o processo que culminou no 25 de Novembro de 1975, foi construído por Mário Soares, o PS e a ala militar moderada do Grupo dos Nove. Sá Carneiro e Freitas do Amaral tiveram papéis secundários. Não estavam no país nesse dia e nos meses que o antecederam recusaram a luta armada ou maior proximidade aos militares Grupo dos Nove, ao contrário dos socialistas.