Por mais místico que possa parecer, a ciência explica o que é o déjà vu Por mais místico que possa parecer, a ciência explica o que é o déjà vu Foto: Imagem gerada por IA/ND

O déjà vu, a sensação súbita de viver um momento que nunca aconteceu, já aconteceu ou ainda vai acontecer com todo mundo. Segundo a médica psiquiatra Maria Moreno, o fenômeno não passa de “uma ilusão criada pelo próprio cérebro”, resultado de um curto-circuito na forma como processamos memórias e reconhecemos situações.

De acordo com a médica psiquiatra Maria Moreno, a resposta não tem nada de sobrenatural. “O déjà vu é uma ilusão fabricada pelo próprio cérebro”, explica em artigo do RIC Notícias. Não é uma memória verdadeira, não é um aviso místico e não é uma premonição.

Como explica a profisscional, essa sensação é simplesmente um erro momentâneo dos sistemas que regulam memória, reconhecimento e familiaridade. E é por isso que a ciência o classifica como uma paramnésia, um falso reconhecimento.

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Embora não represente perigo para a maioria das pessoas, a médica destaca que há casos em que pode funcionar como sinal de alerta para problemas neurológicos, especialmente quando surge de forma intensa, repetida ou acompanhado de outros sintomas.

O que é o déjà vu?

A expressão significa literalmente “já visto” e significa uma sensação súbita de familiaridade num contexto totalmente novo. Racionamente, a pessoa sabe que nunca viveu aquele momento, mas no fundo tem uma sensação que sim.

Déjà vu é a sensação de já ter visto algo ou ter passado por uma situação antesDéjà vu é a sensação de já ter visto algo ou ter passado por uma situação antesFoto: Reprodução/ND Mais

Segundo Maria Moreno, o cérebro funciona como uma máquina de interpretação, não regista o mundo tal como ele é, mas sim versões comprimidas, simplificadas e organizadas de acordo com o que já viveu.

Normalmente, existem duas etapas fundamentais: primeiro o cérebro analisa o estímulo, depois reconhece se aquilo já aconteceu. No déjà vu, essas etapas “trocam de ordem”. Como diz a psiquiatra, trata-se de “um curto-circuito entre a perceção e a memória”.

A área mais envolvida nesse mecanismo é o lobo temporal, região essencial para arquivar memórias e compará-las.

Outros fenômenos parecidos com o déjà vu

O déjà vu é o membro mais famoso de um conjunto maior de ilusões de memória, mas Maria Moreno lembra que existem outras variantes:

  • Jamais vu: quando algo totalmente familiar parece, de repente, estranho, como se a mente tivesse perdido o reconhecimento.
  • Déjà entendu: é a versão auditiva de déjà vu, a sensação de já ter ouvido uma frase ou som que está acontecendo pela primeira vez.
  • Déjà pensé: a impressão de já ter tido exatamente aquele pensamento.

A área mais envolvida no déjà vu é o lobo temporal, região essencial para arquivar memórias e compará-lasA área mais envolvida no déjà vu é o lobo temporal, região essencial para arquivar memórias e compará-lasFoto: Reprodução/ND Mais

Existem ainda formas patológicas mais graves, em que os falsos reconhecimentos se tornam persistentes e interferem com a identidade da pessoa, situações que necessitam de acompanhamento médico.

A psiquiatra compara estes fenômenos a “uma gaveta de memórias onde, ocasionalmente, tudo cai no lugar errado”.

Fenômeno acontece com mais frequência em algumas pessoas

O déjà vu é extremamente comum entre jovens adultos, principalmente dos 15 aos 30 anos, e torna-se menos frequente conforme a idade aumenta.

“Um cérebro jovem processa mais depressa, é mais plástico e está mais exposto a estímulos novos”, detalha Moreno. Ou seja, quanto mais novidade, maior a probabilidade de confundir novidade com familiaridade.

Fatores como privação de sono, stress, grande carga sensorial, viagens frequentes e estilos de vida com estímulos intensos aumentam a probabilidade de déjà vu, especialmente em momentos de fadiga mental. “Nessas alturas, o cérebro pode estar demasiado rápido a prever e demasiado lento a verificar”, ressalta.

Quando procurar ajuda médica?

A maior parte dos episódios é inofensiva: duram segundos, não provocam confusão, e a pessoa mantém a noção clara de que é apenas uma sensação falsa. Mas existe outra categoria, o déjà vu patológico, que é considerado mais grave.

Em casos mais graves, é necessário procurar ajuda médicaEm casos mais graves, é necessário procurar ajuda médicaFoto: Reprodução/ND Mais

Segundo Maria Moreno, este tipo caracteriza-se por:

  • episódios repetitivos e intensos;
  • sensação prolongada de irrealidade;
  • desorientação;
  • alterações da consciência;
  • sintomas físicos associados.

Nesses casos, o déjà vu deixa de ser um fenômeno curioso e passa a ser um sintoma neurológico. “Nestes pacientes, o déjà vu pode ser o primeiro sinal de uma crise epilética”, explica a médica. A pessoa pode sentir calor súbito, náuseas, confusão, automatismos motores ou mesmo perda de consciência.

Também pode aparecer em quadros de demência, lesões cerebrais e perturbações dissociativas graves, embora isso seja mais raro.

O que acontece no cérebro durante um déjà vu?

A médica relata que, embora o fenômeno seja estudado há mais de um século, só recentemente a neurociência começou a desvendar os seus mecanismos. A explicação mais aceite, é a de que o sistema de familiaridade dispara antes do sistema de memória.

Assim, o cérebro reconhece algo como familiar antes de verificar se aquilo já aconteceu. Como explica a médica, o cérebro interpreta esse atraso como duplicação do momento, é um erro de timing neuronalm uma descoordenação de milissegundos.

Embora o fenômeno seja estudado há mais de um século, só recentemente a neurociência começou a desvendar os seus mecanismosEmbora o fenômeno seja estudado há mais de um século, só recentemente a neurociência começou a desvendar os seus mecanismosFoto: Reprodução/ND Mais

A sensação é real, mas o fundamento é falso: a perceção de familiaridade existe, mas não corresponde a nenhuma memória real. Um dos modelos mais discutidos envolve uma pequena “falha elétrica” nos circuitos do lobo temporal, semelhante ao que acontece numa pré-crise epilética.

Outras teorias defendem que o déjà vu surge quando o cérebro compara o presente com memórias muito vagas ou fragmentadas, e a coincidência estrutural entre duas cenas ativa o sentimento de familiaridade, mesmo sem memória concreta associada.

A médica destaca que não há consenso absoluto, mas todas as hipóteses convergem num ponto: o déjà vu nasce da forma como o cérebro processa informação, não de qualquer fenômeno externo.

Procure orientação profissional de saúde As informações sobre saúde e bem-estar publicadas neste conteúdo têm caráter informativo e não substituem o diagnóstico ou tratamento feito por profissionais. Se você estiver com sintomas ou dúvidas relacionadas à sua saúde física ou mental, procure um médico ou profissional habilitado.