O incentivo da Índia ao etanol, misturando biocombustível de origem vegetal com gasolina, está a ser travado pela lentidão dos progressos na produção de uma versão ambientalmente mais limpa do combustível. O principal obstáculo, afirmam produtores e peritos, é o facto de o Governo não pagar mais pelo etanol mais limpo, que é feito a partir de resíduos, mas cuja produção é mais cara.
O etanol de segunda geração, ou etanol 2G, que utiliza resíduos de culturas em vez de culturas alimentares valiosas, traz uma forma de reduzir as emissões que provocam o aquecimento do planeta, reduzir as importações de petróleo e evitar a produção de combustível a partir de alimentos necessários para o consumo humano.
Os produtores, contudo, sublinham que o Governo indiano deve pagar um preço separado e adequado para o etanol 2G, que é mais caro de produzir. “Sem uma política de preços diferenciada para o etanol 2G, a economia não funciona”, afirma Monish Ahuja, director-geral da Punjab Renewable Energy Systems (PRESPL), que fornece resíduos agrícolas para fábricas de etanol 2G.
Os investidores não terão interesse a menos que esteja assegurado um retorno que reflicta o custo mais elevado da produção do biocombustível, explica Monish Ahuja. “Esse é o grande obstáculo.”
Para garantir que toda a gasolina vendida no país contenha 20% de etanol até Outubro de 2025, o Governo indiano procurou aumentar a produção desviando culturas alimentares como a cana-de-açúcar, o milho e o arroz excedentário para produzir o combustível conhecido como etanol de primeira geração (1G).
A produção de etanol 1G reduz a disponibilidade de cereais para as pessoas e gado, e afasta as terras da produção alimentar.
Num período de um ano entre 2024 e 2025, a Índia chegou a afectar um recorde de 5,2 milhões de toneladas métricas de arroz para a produção de etanol 1G, o equivalente a quase 9% das remessas globais de arroz.
O etanol 2G pode ser produzido através da decomposição de resíduos vegetais duros, como a palha ou a casca, em açúcares fermentáveis, utilizando tecnologias mais actualizadas. Poderá também ajudar a reduzir a queima de restolho, uma das principais causas de poluição atmosférica na Índia, em que os restos de culturas são incendiados após a colheita.
Até à data, o etanol 2G representa muito pouco — há quem diga que menos de 1% — da produção anual de biocombustíveis da Índia, que, segundo o governo, atingiu os sete mil milhões de litros em Outubro de 2024. O Governo indiano não disponibiliza números específicos sobre a sua produção de etanol 2G.
A falta de produção de etanol 2G deve-se principalmente à falta de preços diferenciados de aquisição pelo governo, assim como os custos de produção mais elevados, dizem os especialistas.
Preços diferenciados tardam
O governo considerou a possibilidade de criar uma taxa separada para o etanol 2G, revelam as actas de uma reunião de alto nível realizada em Julho de 2023.
Os novos preços estavam previstos para Abril de 2025, de acordo com relatos dos meios de comunicação social indianos, mas nenhum anúncio acabou por ser feito.
Para promover o combustível mais moderno, o Governo indiano lançou um programa nacional em 2019 para prestar assistência financeira à criação de fábricas de etanol 2G à escala comercial e de demonstração.
No entanto, das 12 fábricas que se propôs a estabelecer em toda a Índia, apenas uma, de demonstração, está operacional.
O ministério indiano responsável pela produção de biocombustíveis não respondeu aos pedidos de comentário.
Custos acumulam-se
Entre os desafios para aumentar a produção de etanol 2G, o processo requer enzimas dispendiosas, o pré-tratamento de resíduos e logística específica, explica o vice-presidente sénior da Federação Indiana de Energia Verde (IFGE), Y. B. Ramakrishna.
A Índia produz anualmente centenas de milhões de toneladas de resíduos agrícolas que, segundo os especialistas, poderiam alimentar centenas de fábricas de biocombustíveis 2G.
Mas os resíduos têm de ser recolhidos, secos, armazenados e transportados a partir de pequenas explorações agrícolas espalhadas por vastas áreas, explica Ramya Natarajan, investigadora do Centro de Estudos de Ciência, Tecnologia e Política (CSTEP).
Os custos vão-se acumulando, o que torna fundamental o apoio financeiro e a clareza dos preços do etanol 2G, afirmam especialistas. “Pelo menos durante os primeiros três ou quatro anos, é essencial um preço mais elevado”, defende Y. B. Ramakrishna.
Sem um preço distinto para o 2G e um objectivo para a sua aquisição, mesmo as empresas financeiramente preparadas não podem obter fundos dos bancos ou comprometer-se com planos a longo prazo, diz Monish Ahuja, da PRESPL.
Ao contrário do etanol 1G, que tem um mercado garantido através das aquisições das empresas de comercialização de petróleo, a falta de uma meta separada para a mistura de etanol 2G faz com que a alternativa mais ecológica tenha de competir pelos clientes com o etanol 1G, que é mais barato.
No âmbito da política indiana para a mistura de etanol, que prevê 20% de etanol na gasolina até ao final de 2025, não existe um subobjectivo para a mistura de etanol 2G para ajudar a garantir a produção.