Cláudia Moreira trabalhava na área da farmácia e Miguel Silva como agente imobiliário quando decidiram tomar uma decisão conjunta: despedir-se. Na altura, infelizes com as profissões que levavam e com vontade de fazer algo diferente, compraram uma carrinha Peugeot Boxer, de 2007, que era utilizada para transportar solas de sapatos.
“Sempre tivemos os sonhos de viajar pelo mundo e surgiu-nos a ideia”, começa por contar à NiT Cláudia, de 32 anos e natural da Trofa, no Porto. “Acompanhávamos outros casais que faziam o mesmo e começámos a pensar em comprar uma carrinha e transformá-la numa casa para podermos ir para todo o lado.”
Em 2022, deixaram a vida rotineira para se dedicarem a 100 por cento ao novo projeto — sem qualquer experiência na área. “Foi uma aventura louca porque começámos a pensar em como é que íamos fazer isto, porque não sabíamos absolutamente nada.”
Ainda assim, não desistiram e começaram a pesquisar nas redes sociais, sobretudo no YouTube, tudo sobre cada valência: desde trabalhos com madeira até à eletricidade e canalização. “Foi um percurso bastante difícil porque tudo tinha uma curva de aprendizagem”, recorda Cláudia.
Por sorte, Miguel, de 34 anos e natural da Maia, sempre teve facilidade em aprender coisas novas. Graças a isso, conseguiu perceber, aos poucos, como tudo funcionava. “Para a estrutura principal, dentro da carrinha, utilizámos madeira”, explica Miguel. “Tem de ser sempre uma madeira leve porque isso interfere com o peso da carrinha, em termos legais e de economia de combustível.”
Ainda no interior, optaram por tornar tudo elétrico para terem maior autonomia e menos preocupações em ir abastecer gás para o fogão ou para o aquecimento.
Apesar de terem comprado a carrinha em 2022, os trabalhos no interior só começaram mais tarde. Antes de iniciarem o projeto, criaram uma oficina na própria casa em que viviam no Porto. “A carrinha ainda serviu para andar a transportar gravilha e essas coisas todas antes de ser casa”, recorda Cláudia.
Nos meses seguintes, dedicaram-se à construção das janelas e aos cortes das madeiras na oficina improvisada. Nesta altura, a carrinha passou também um mês a ser pintada.
“Fomos aprendendo tudo sozinhos e a pedir dicas a quem conhecemos que trabalha na área”, referem. O pai de Cláudia, que é proprietário de um stand de caravanas e autocaravanas, foi uma ajuda essencial.
Ao todo, as obras no interior da nova casa duraram dez meses. Em junho deste ano, receberam o tão esperado documento oficial do veículo e desde então que têm vivido sobre rodas.
Durante este processo, o casal teve ainda o apoio dos dois companheiros de quatro patas: Goldie e Rusty, ambos com seis anos. A cadela já estava na família antes da compra da carrinha e foi resgatada depois de ter sido encontrada na rua, ainda bebé.
O mesmo aconteceu com Rusty, que foi salvo na rua, depois de terem comprado a carrinha. “Nesta altura, começámos a correr todos os dias no parque e logo no primeiro dia, deparámo-nos com o Rusty”, recorda. “Pensávamos que era de alguém, mas depois falámos com o segurança e ele disse-nos que ele já estava abandonado há um mês e ia comendo aquilo que as pessoas deixavam.”
Naquela altura, tomaram a decisão de o levar para casa e enfrentaram um desafio: já tinham batizado o projeto da carrinha de Trio Avantura (ou seja, Cláudia, Miguel e Goldie). No entanto, não demorou muito até encontrarem a solução: “Continuamos a ser o trio porque é um casal de humanos, um casal de cães e a nossa carrinha.”
Estão a viver a tempo inteiro na carrinha e dedicam-se à impressão 3D
Todo o projeto de reabilitação da carrinha, já a contar com a compra do veículo (que custou cerca de 7.500€), rondou os 23 mil euros, segundo o casal. O valor poderia ter sido mais elevado, mas a meio da construção, Cláudia e Miguel descobriram o maravilhoso mundo da impressão 3D e mudaram por completo a abordagem ao projeto.
“Descobrimos por acaso, através do OLX”, contam à NiT. “Tivemos a oferta de uma peça para a carrinha que vinha estragada e surgiu a necessidade de a reparar, mas não havia à venda materiais para aquilo. Então, na altura, pedimos a uma outra pessoa que trabalhava no mundo da impressão 3D para recriá-la.”
Desde então, começaram a pesquisar mais sobre esta vertente, até decidirem comprar a sua própria impressora 3D. “Imprimimos vários materiais e objetos, desde um pequeno exaustor às peças de construção de montagem de paredes”, revelam. “A nossa casa de banho foi praticamente toda impressa em 3D.”
Aliás, Cláudia e Miguel gostaram tanto deste método que, eles próprios, trabalham hoje em dia no universo da impressão 3D. Isso tem-lhes dado liberdade e suporte financeiro. “Começámos a introduzir-nos nesse mercado e acabámos por gostar muito. Hoje em dia, temos bastante trabalho.”
A impressora 3D.
Atualmente, o casal está a viver a tempo inteiro na carrinha com os cães e tem rodado todo o País. “Não temos um lugar fixo para a nossa casa, podemos acordar hoje à beira da praia e amanhã na montanha”, sublinham. “Essa é a grande vantagem de ter uma casa sobre rodas e a liberdade que pretendíamos.”
Por enquanto, apenas fizeram viagens dentro de Portugal, mas têm o objetivo de conhecer a Europa e chegar ainda mais longe, mais precisamente à China. O casal já tem o nível 1 de mandarim e continua a aprender a língua.
“É uma coisa um bocadinho complicada neste momento e temos completa noção disso. Mas foi com este objetivo que construímos a carrinha”, frisa Cláudia. “O Miguel é um grande entusiasta das tecnologias e do mercado chineses. Portanto, temos essa missão. Se vai ser possível ou não, ainda não sabemos”, acrescenta, entre risos.
A família já está habituada à vida sobre rodas. Goldie e Rusty, em particular, adoram conhecer sítios novos — e viajam sempre em segurança, dado que os tutores instalaram cintos especiais para os prender quando estão na estrada.
Carregue na galeria para ver algumas imagens da construção do projeto Trio Avantura.