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Enigma em torno da suposta bateria babilónica continua a intrigar arqueólogos e curiosos. Especialmente depois de ter desaparecido misteriosamente, sem deixar rasto, e nunca mais ter sido vista…

Descoberto em circunstâncias (também) estranhas, no início do século XX, um pequeno conjunto de artefactos constituído por um jarro de barro, um cilindro de cobre e uma vareta de ferro são as peças de um puzzle que até hoje ninguém conseguiu montar.

É um dos enigmas mais debatidos da arqueologia do Próximo Oriente. Conhecido como “Bateria de Bagdade”, o objeto despertou todas as atenções desde que Wilhelm König, artista e arqueólogo alemão que viria a dirigir o Museu Nacional do Iraque, sugeriu que poderia tratar-se de uma forma rudimentar de célula galvânica, criada muitos séculos antes de Alessandro Volta.

A peça foi encontrada na área de Khujut Rabu, perto das ruínas da antiga cidade de Ctesifonte, capital sucessiva dos impérios Parta e Sassânida. O jarro, com cerca de 14 cm quando recuperado, teria originalmente uma tampa selada com betume. No seu interior encontrava-se um cilindro de cobre, dentro do qual estava encaixada uma haste de ferro que, ao que tudo indica, atravessaria o topo do recipiente.

A cronologia proposta por König apontava para o período Parta (150 a.C.–223 d.C.), mas estudos inclinaram-se mais tarde para uma datação sassânida, entre 224 e 650 d.C. Seja qual for o período exato, a antiguidade do objeto é incontestável e muito anterior à primeira descrição formal de uma bateria, publicada por Volta em 1800.

König expôs a sua tese em 1938, na revista alemã Research and Progress, num artigo intitulado “Um elemento galvânico do período Parta?”, segundo o Discovery. Sem textos antigos que descrevessem algo semelhante, o arqueólogo baseou-se na análise material: dois metais com potenciais eletroquímicos distintos, cobre e ferro, e indícios de que o jarro possa ter contido um líquido ácido, como vinagre ou vinho.

Ensaios modernos mostraram que, com um eletrólito adequado, o conjunto consegue gerar aproximadamente um volt. Em teoria, com várias unidades ligadas entre si, a voltagem poderia aumentar.

A partir daqui ergueu-se um edifício de hipóteses. Para que poderia ter servido uma eventual bateria criada há quase dois mil anos? Uma das propostas recai sobre a medicina, inspirada em práticas conhecidas da Antiguidade (os Gregos, por exemplo, usavam peixes eléctricos para aliviar dores). Outra sugestão é a de efeitos especiais em templos, como estátuas que produziriam pequenos choques para impressionar fiéis (a ideia foi testada num documentário televisivo de 2005).

A hipótese defendida pelo próprio König era a da eletrogalvanização: aplicar uma fina camada de metal sobre objetos, um método mais simples e preciso do que as técnicas então em uso. O problema é que nenhuma destas interpretações resiste à análise crítica.

A intensidade gerada seria demasiado baixa para qualquer processo de douramento. Não há vestígios de fios, nem evidências de que civilizações partas ou sassânidas dominassem princípios elétricos. Além disso, o suposto eletrólito teria de ser renovado com frequência, algo difícil num recipiente selado com betume. E, sobretudo, falta qualquer referência escrita ou material que confirme o uso de dispositivos semelhantes — algo no mínimo estranho, caso se tratasse de uma tecnologia tão inovadora.

Uma resposta à frente de todos?

Perante estes obstáculos, uma explicação alternativa ganhou popularidade ao longo das últimas décadas: a de que o conjunto fosse um recipiente para guardar manuscritos. Jarros muito parecidos foram encontrados em escavações próximas, usados para conservar pergaminhos enrolados em torno de varas ou cilindros. A própria forma da peça, bem como o contexto arqueológico, parecem ajustar-se melhor a este cenário. Curiosamente, o próprio König mencionou este tipo de recipientes no seu artigo, embora não tenha considerado que o exemplo que tinha nas mãos pudesse servir precisamente essa função.

Em 1996, o especialista Gerhard Eggert sintetizou esta visão na revista Skeptoid Magazine, defendendo que a explicação “ritual ou funcional”, ligada ao armazenamento de textos, é muito mais plausível do que interpretar o objeto como uma fonte de energia. Segundo Eggert, a ideia de uma bateria antiga resulta mais de um impulso de “misticificação científica” do que de evidências sólidas, violando o princípio da navalha de Occam — a exigência de preferir hipóteses simples quando estas explicam adequadamente os factos.

O debate ganhou uma dimensão adicional com um novo mistério. Em 2003, durante o saque ao Museu Nacional do Iraque, em Bagdade, o artefacto desapareceu sem deixar rasto. Desde então, não se sabe onde está nem em que estado se encontra, impossibilitando análises mais completas que permitiriam esclarecer definitivamente a sua natureza.


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