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O reitor da Universidade Estatal de São Petersburgo, Nikolay Kropachev, apresenta o novo Dicionário Explicativo da Língua Estatal da Federação Russa.
O novo dicionário estatal russo diz que o autoritarismo é a “forma de governo mais eficaz” e proíbe palavras como rabo, merda e peido. Fé, verdade, bem e esperança não existem de todo. E “humanismo” e “vida” são valores espirituais tradicionais da Rússia.
A Rússia introduziu este ano um novo Dicionário Explicativo da Língua de Estado da Federação Russa, compilado na Universidade Estatal de São Petersburgo e imediatamente incluído na lista oficial de dicionários normativos que os organismos públicos são obrigados a usar.
O novo dicionário, que deve servir de referência nas escolas, foi preparado sob supervisão do Ministério da Justiça russo, e “algumas definições” foram articuladas com o departamento jurídico da Igreja Ortodoxa da Rússia.
O jornal russo The Barents Observer analisou o dicionário e descobriu, entre outras definições peculiares, que a vida começa no momento da conceção, a televisão desempenha um papel na formação do Estado e a Constituição já não é a lei fundamental do país.
O dicionário aperta também o cerco à obscenidade, alargando a lista de palavras “ofensivas” para incluir ameaças linguísticas como “rabo”, “merda” e “peido“. Ao mesmo tempo, omite por completo certos termos, como “gulag” (que até no dicionário português existe), “estalinismo”, “fé”, “esperança”, “bem” e “verdade”.
Segundo os autores do dicionário, estas alterações destinam-se a refletir os “valores espirituais e morais tradicionais” definidos no decreto presidencial de 2022 sobre os princípios da política de Estado.
O portal russo independente Meduza analisou também o novo dicionário, e encontrou também algumas entradas dignas de registo.
“Autoritarismo“, por exemplo, é considerado a forma de governação mais eficaz em tempos difíceis para um país. “Democracia” é uma forma de governação de países ocidentais em que os cidadãos possuem determinados direitos e liberdades, e o Estado funciona no interesse dos atores mais influentes que condicionam as decisões sobre a vida política, económica e social.
O “casamento” é uma união familiar entre um homem e uma mulher, e a “homossexualidade” uma forma de desvio sexual que se manifesta na satisfação do desejo sensual com pessoas do mesmo sexo, sodomia ou pederastia.
No novo dicionário, “inimigo” é o que a autoridade soberana considera hostil ao povo, ao governo ou ao Estado. A palavra “hegemonia” tem um significado claro: os EUA, que se permitem ignorar regras para vencer sempre; a capacidade de retirar proveito pela preservação de um sistema neocolonial, limitando a soberania de Estados independentes e reforçando o poder do dólar.
Já “humanismo” é um valor espiritual e moral tradicional russo — tal como “vida“, definida também como o período da existência de uma pessoa a partir da conceção.
Assim se vive na Rússia. A julgar pelo seu novo dicionário, sem “fé”, sem “verdade”, sem “esperança”.