A esquerda não tem ninguém no Palácio do Belém há praticamente 20 anos e o Parlamento está com maioria à direita. Não tinha feito sentido apostar numa candidatura de união para Belém?
Tinha, acho que sim. Teria sido positivo haver uma candidatura unitária à Presidência da República. Faz cada vez mais sentido trabalho unitário em diferentes esferas, nas candidaturas autárquicas, em termos de articulação para o trabalho parlamentar, em termos de convergências políticas. É conhecido que houve algum trabalho com vista a possibilitar uma solução de convergência unitária em torno de Sampaio da Nova, infelizmente não foi bem sucedida, possivelmente não foi muito bem conduzida, mas também não estou exatamente por dentro dos detalhes do processo.
Portanto, o problema para a inexistência dessa candidatura unitária está em António José Seguro, não é um candidato que conseguisse unir as várias esquerdas?
O problema fundamental é que António José Seguro não tem sequer vontade de se assumir como um candidato de esquerda, e nem sequer se trata apenas uma questão da mensagem que está a passar nestas eleições, em que teve aquele momento em que recusou a ideia de ser um candidato de esquerda; depois lá aceitou muito a medo e com muitas cautelas ficar levemente encostado ao centro-esquerda. Nem sequer é disso que estou aqui a falar, mas em todo o percurso e caraterísticas do ponto de vista ideológico e de posicionamento, nomeadamente no período em torno da troika, na forma como lidou com o governo PSD e CDS no momento da troika, dos programas de ajustamento económico ao financeiro e todas as agressões e regressões que isso representou para os trabalhadores em Portugal. Em muitos desses aspetos achamos que António José Seguro está longe de representar a visão social de esquerda democrática. Será com certeza um democrata, faço-lhe essa justiça, mas tenho muitas dúvidas que seja de esquerda, seguramente não é de esquerda como a esquerda que nós aspiramos, enquanto outros candidatos o serão. A questão é que a forma como o processo decorreu, infelizmente, não permitiu uma articulação suficientemente plena, houve quem quisesse avançar sem ter disponibilidade para conversar, e quando isso acontece fica difícil…
Está a falar do PCP?
Em particular do PCP, o que eu lamento, sim.
No Bloco, e não só, há quem que diga que o PCP entrou aqui numa deriva de autossobrevivência, de algum sectarismo, concorda com essa visão?
Registo como um facto que o PCP decidiu apresentar um candidato à Presidência da República alguém extremamente respeitável, por quem tem muito apreço político, que é o António Filipe, mas decidiu apresentá-lo sem qualquer preocupação ou vontade de convergência, da mesma forma que também nas autárquicas foi essa a postura do PCP, e nem sequer vou falar especificamente do caso de Lisboa, porque na verdade foi a estratégia e a opção para o conjunto do país. O PCP, pelas suas opções e motivos que serão respeitáveis em termos de decisão interna, decidiu que iria sozinho e que não estava disponível para conversar, nem para procurar articulações, inclusive em casos em que havia disponibilidade para serem os candidatos da CDU a liderarem eventuais coligações. Eu registo e lamento, acho que seria positivo que pudéssemos ter uma maior articulação, não se trata de uma fusão, temos identidades distintas, o Bloco e o PCP, temos posicionamentos distintos em relação a algumas coisas, apesar de convergirmos na maioria, mas seria importante poder haver mais convergências e lamento que não o seja. A partir do momento em que isso não foi possível, da nossa parte, houve uma disponibilidade pessoal da Catarina Martins para avançar e acho que é uma candidata fantástica.
E deve ir até o fim ou as sondagens podem indicar alguma necessidade de pragmatismo e de um apoio de última hora, por exemplo, em António José Seguro, mesmo que tenha que tapar a carinha no boletim de voto?
Não, não vejo que isso faça sentido. Em primeiro lugar, as sondagens são relativamente animadoras, face àquilo que eventualmente alguns poderiam prognosticar olhando aos resultados mais recentes do Bloco: claramente é uma candidatura que vai muito além da representação eleitoral do Bloco nos tempos recentes, o que mostra bem que a Catarina Martins é reconhecida pelas pessoas como alguém que tem capacidades pessoais notáveis e que merecem confiança. Conhece muito bem o país, tem feito um trabalho notável a dar a conhecer o país, as pessoas que trabalham, as pessoas que cuidam, as suas necessidades, o que deveria ser feito para melhorar a sua condição e, nesse sentido, não só é fundamental que esteja presente para trazer para a campanha toda esta mensagem e toda esta visão, que sem ela não estaria representada, como é importante que vá até ao voto. Depois logo veremos, dentro deste contexto, se consegue passar à segunda volta. Se não for o caso, na segunda volta, pode-se falar em tapar boletins de voto.
Vamos avançar para o segundo segmento do nosso programa, o bloco Carne ou Peixe, em que só pode escolher uma de duas opções. Em quem votaria numa segunda volta das presidenciais entre Gouveia Melo e António José Seguro?
Esperando que não tenha que fazer essa escolha por causa da minha candidata passar à segunda volta, mas se fosse essa a circunstância, entre esses dois candidatos de centro, eu votaria provavelmente no António José Seguro.
E com quem é que preferia partilhar um camarote no Estádio da Luz: José Luís Carneiro ou Luís Montenegro?
Apesar de tudo o que disse, é inquestionável que a minha proximidade política será relativamente maior para o José Luís Carneiro, mas apesar disso teria mais interesse em partilhar o camarote com o José Luís Carneiro, que pelo meio das jogadas do Benfica sempre aproveitaria para trocar impressões sobre a política e fazer algumas críticas à sua governança.
Quem é que iria apoiar na reta final de uma maratona: Pedro Soares ou Rui Tavares?
São ambas pessoas com quem tenho uma excelente relação pessoal, curiosamente e conheço há muitos anos. Apesar das diferenças políticas, o Pedro Soares é um camarada. O Pedro Soares partilha partido comigo e há divergências conhecidas face à moção A, mas pessoalmente tenho uma ótima relação. Com o Rui Tavares também tenho uma excelente relação. Teve a generosidade de vir por duas vezes a Cascais na última campanha. Gosto sempre muito de estar com ele e falar com ele sobre as mais diversas coisas. É difícil dizer. Só porque não vejo o Pedro Soares há mais tempo, escolho o Pedro Soares.
Com quem é que iria comer um gelado à Santini em Cascais: José Manuel Pureza ou Mariana Mortágua?
Vou com os dois. São camaradas e amigos e tenho o maior gosto de ir com ambos. Com o José Manuel Pureza vou estar de forma mais próxima no trabalho direto neste fim de semana, se bem que obviamente a Mariana [Mortágua] também lá estará e é muito importante que esteja. Depois a seguir preciso de combinar algumas coisas com a Mariana Mortágua em torno de trabalho académico que temos para fazer em comum, por isso neste caso combino o gelado com ela.