Dulce Neto — Um debate educado, muito sereno, com elevação e a servir o seu propósito: esclarecer os eleitores sobre o que Luís Marques Mendes e Jorge Pinto pensam trazer para o país. Ficou clara a experiência política do primeiro (por vezes tinha até um ar complacente quando o adversário falava), mas não foi menos notório o pendor incisivo do segundo que tentou colar Mendes ao seu passado de comentador televisivo ou a querer entalá-lo ao recordar opiniões anteriores do social-democrata sobre direitos laborais. Porém, não foi feliz ao repescar o perigo dos “ovos no mesmo cesto”. Um ataque que não resultou, pois Mendes não teve dificuldade em resgatar exemplos (Sampaio e Guterres) e Pinto passou a impressão de estar mal preparado ou de ter fraca memória. Marques Mendes, mais político e sagaz, num tom muito enérgico, ganhou o debate, sendo eficaz em chegar ao eleitorado que pede mudanças. No entanto, Jorge Pinto não se saiu mal: para quem é estreante nestas lides, teve até um bom desempenho.

Filomena Martins —Foi um debate entre dois candidatos que já traziam rascunho de papel-químico: Marques Mendes, o “presidente da estabilidade”, e Jorge Pinto, o “sentinela democrático” que quer impedir atalhos constitucionais. O choque estava anunciado: quem deve puxar o país para a frente e quem deve travar desvios do sistema?

Marques Mendes entrou com serenidade e mensagens calibradas: ambição económica, crescimento, justiça social via desenvolvimento — não via rupturas. Recuperou bem o exemplo do juiz Carlos Alexandre, que usara antes como símbolo da justiça que precisa de mais meios e menos teatralização. E respondeu com habilidade ao clássico argumento dos “ovos no mesmo cesto”: lembrou que já houve governos e presidentes da mesma cor, e que Jorge Sampaio provou que a independência não depende da filiação, mas da coragem.

Jorge Pinto trouxe o outro país: o do risco democrático, da necessidade de um Presidente preventivo, atento às tentações de revisão constitucional e às pressões da extrema-direita. Marcou pontos ao insistir que a revisão pode não estar no programa — mas isso não significa que não esteja no horizonte. Fê-lo com a metáfora da “dissuasão nuclear”: a simples possibilidade tem de ser enfrentada antes de existir. Foi o momento mais forte do debate, até porque remete para um entendimento pouco democrático da vontade que o Parlamento pode ter no futuro.

No plano económico e social, Mendes falou de pensões curtas, de falta de ambição e do país que perdeu o hábito de crescer; Pinto chamou a atenção para o SNS, para os direitos laborais e para o perigo de reformas que minam o equilíbrio constitucional. Um quer iluminar a estrada, o outro quer construir guarda-rails à volta dela. Na corrupção, Pinto puxou para a prevenção e para a cidadania vigilante; Mendes foi mais executivo: primeiro um Conselho de Estado dedicado à Justiça, PGR, STJ e PJ na mesa, e acordos estruturais. Onde Pinto vê um sistema que alimenta o problema para dele falar, Mendes vê instituições que precisam finalmente de fazer o que dizem.

No final, ficaram duas visões claras para Belém:
— Mendes, o Presidente mobilizador, de estabilidade e convergência;
— Pinto, o Presidente sentinela, que prefere antecipar ameaças do que remediá-las.
Duas presidências possíveis — e duas maneiras distintas de proteger o regime que temos.

Miguel Pinheiro — Se há coisa que Marques Mendes sabe fazer é ler sondagens. O mais recente estudo de opinião do Expresso explicava que os portugueses querem um Presidente da República que “obrigue o governo a agir”. Por isso, o candidato sacou do chicote. Decretou que o Presidente não é a Rainha de Inglaterra e informou que, chegando a Belém, vai dispensar mais “diagnósticos” e vai exigir “ação, ação, ação” — assim mesmo, três vezes. A sondagem também mostrava que Marques Mendes é visto como o candidato mais “simpático”, mas que ninguém pretende colocar simpatias em Belém. Nem de propósito: Marques Mendes aplaudiu a escolha de Carlos Alexandre para o novo organismo de combate à fraude no SNS argumentando que o juiz “incute respeito” e, até, “medo” a quem esteja a pensar em deitar a mão a uma parte dos 17 mil milhões do orçamento da Saúde. Nada de simpatias.

Do outro lado, Jorge Pinto começou com o seu característico lirismo, anunciando que se for Presidente reunirá o Conselho de Estado para pedir um estudo sobre a resiliência democrática do país. Depois, tentou ser um tubarão político, mas provou que é apenas um peixinho de aquário. Recuperando um velho argumento de Mário Soares, alertou os portugueses para o perigo de “porem os ovos todos no mesmo cesto”. O governo é do PSD, as regiões autónomas são do PSD, as câmaras de Lisboa e do Porto são do PSD, por isso, seguramente, cairia um meteorito sobre a pátria se o próximo Presidente fosse também do PSD. A isso, Marques Mendes contrapôs um exemplo prático: em Portugal, o PS já teve simultaneamente um Presidente (Sampaio) e um primeiro-ministro (Guterres) e não se deu o Apocalipse. Perante isso, Jorge Pinto remeteu-se a um desconfortável silêncio. Não sabia disto?

Miguel Santos Carrapatoso —Ver este debate e compará-lo com aquele que pôs frente a frente João Cotrim Figueiredo e o mesmo Jorge Pinto é uma lição valiosa: em política, e em particular em campanha eleitoral, todas as oportunidades contam. No primeiro caso, o liberal apresentou-se com uma atitude blasé, de tal forma que mal conseguiu sobressair perante um adversário que era e é, objetivamente, menos experiente do que ele.

Este sábado, Luís Marques Mendes entrou em campo de forma profissional e sem baixar a guarda — e isso fez toda a diferença. O candidato do Livre nem esteve mal — aliás, foi de longe a sua melhor prestação nesta maratona. Foi inteligente em acenar com o risco de “pôr todos os ovos na mesma cesta”. Pressionou q.b. Mendes na questão da lei laboral. E desafiou-o a falar sobre a suposta revisão constitucional que andará por aí a ser cozinhada. Acontece que Mendes é mais experiente e está bem mais preparado. Não só desmontou a história da cesta com o exemplo da dupla Jorge Sampaio – António Guterres, como se pôs ao centro quando defendeu a importância de um acordo entre UGT e patrões (apesar da greve geral, a reunião entre Luís Montenegro e Mário Mourão esvaziou parcialmente o balão), como ainda atirou a ameaça de uma revisão constitucional à direita para o plano a que ela pertence — o do delírio. Jamais Luís Montenegro se meteria em tal aventura nas atuais condições políticas. Pelo meio, Mendes ainda conseguiu defender longamente as suas ideias para a reforma da Justiça e o combate à corrupção — temas populares no seu espaço político. Jorge Pinto deixou boa imagem. Marques Mendes deixou uma imagem melhor.

Recorde aqui:

o debate entre André Ventura e Catarina Martins

o debate entre Jorge Pinto e Gouveia e Melo

o debate entre Marques Mendes e André Ventura

debate entre Cotrim Figueiredo e Jorge Pinto

debate entre Catarina Martins e Gouveia e Melo

debate entre Gouveia e Melo e Cotrim Figueiredo

debate entre André Ventura e António José Seguro

o debate entre Marques Mendes e António Filipe