A evolução tecnológica tem permitido aceder a dados antes impossíveis. Um exemplo é a recente análise ao asteroide Bennu, que revelou um composto essencial à produção de serotonina, reforçando a hipótese de que ingredientes fundamentais para a vida possam ter chegado à Terra através de rochas espaciais.
Molécula vital para a felicidade encontrada em material do asteroide Bennu
Um nutriente crítico usado para produzir o neurotransmissor serotonina pode ter surgido em amostras recolhidas do asteroide Bennu pela missão OSIRIS-REx da NASA.
O triptofano é um dos nove aminoácidos essenciais que o corpo humano não consegue produzir por si só e, se confirmado, a sua deteção em Bennu por investigadores da NASA e da Universidade do Arizona marcaria a primeira vez que foi encontrado numa amostra extraterrestre.
É uma descoberta que reforça a teoria de que rochas do espaço entregaram muitos dos ingredientes para a vida à Terra primitiva e até sugere que podemos ter subestimado a sua contribuição.
As nossas descobertas, escreve uma equipa liderada pelo geoquímico Angel Mojarro do Goddard Space Flight Center da NASA, expandem a evidência de que moléculas orgânicas prebióticas podem formar-se dentro de corpos planetários primitivos em acreção e podem ter sido entregues via impactos à Terra primitiva e a outros corpos do Sistema Solar, potencialmente contribuindo para as origens da vida.
Ingredientes da vida trazidos por cometas e asteroides
A ideia de que a química para a vida foi pelo menos parcialmente entregue a uma Terra nascente por cometas e asteroides é uma das principais teorias sobre a nossa origem.
O fluxo de evidências, desde observações do espaço profundo até à recuperação e análise de amostras de asteroides, apenas fortaleceu esta explicação cósmica.
Amostras dos asteroides Ryugu e Bennu revelaram ingredientes verdadeiramente fascinantes, incluindo inventários extensos de aminoácidos, que são os blocos de construção das proteínas, e nucleobases, as unidades básicas que compõem o RNA e o DNA.
Apenas uma nucleobase foi encontrada em Ryugu, mas todas as cinco nucleobases comuns apareceram em amostras de Bennu.
Análise aprofundada ao pó de Bennu
Agora, Mojarro e os seus colegas realizaram uma nova análise do material de Bennu, uma rocha espacial tão antiga quanto o Sistema Solar, focando-se em aminoácidos e nucleobases para compreender melhor a química prebiótica extraterrestre e as suas origens.
Em particular, queriam clarificar as vias de reação química pelas quais os aminoácidos podem ter-se formado há milhares de milhões de anos.
A equipa examinou fragmentos pulverizados do asteroide, testando os 20 aminoácidos que constroem proteína no corpo, dos quais nove o corpo não consegue produzir e deve obter da alimentação, bem como as cinco nucleobases comuns que codificam as nossas instruções genéticas: adenina, guanina, citosina, timina e uracilo.
A análise confirmou a presença dos 14 aminoácidos detetados num estudo anterior, bem como as nucleobases.
Também encontraram vários aminoácidos e nucleobases não biológicos, confirmando a origem extraterrestre das moléculas nas amostras.
Para surpresa dos investigadores, foi também detetado um sinal de triptofano. Fraco, mas presente em várias porções de uma amostra de Bennu.
A importância do triptofano
O cérebro usa triptofano para produzir serotonina, o neurotransmissor que ajuda, entre outras funções, a regular o humor e as sensações de bem-estar e felicidade.
Pessoas com baixos níveis de serotonina são propensas a depressão e ansiedade. O cérebro também usa triptofano para produzir melatonina, e o corpo pode utilizá-lo para produzir vitamina B3. Só o podemos obter através de alimentos como aves, peixe, lacticínios, frutos secos e ovos.
O cérebro também usa triptofano para produzir melatonina, e o corpo pode utilizá-lo para produzir vitamina B3.
O aminoácido é relativamente frágil, sendo improvável que sobreviva dentro de um meteorito a cair na Terra envolto em chamas durante a entrada atmosférica, o que pode explicar porque nunca foi encontrado em amostras de meteoritos.
No entanto, uma amostra de asteroide recuperada no espaço e transportada cuidadosamente para a Terra num contentor protetor não passa pelos mesmos rigores.
A deteção sugere, portanto, que podem existir ingredientes prebióticos à espreita em asteroides que permanecem indetetados em contexto extraterrestre, simplesmente porque são demasiado frágeis para sobreviver a uma viagem até à Terra sem proteção.
Isto significa também que aminoácidos frágeis como o triptofano podem formar-se num contexto não biológico, pelo que a sua mera presença não pode ser interpretada como um sinal definitivo de vida.
Processos químicos variados no interior de Bennu
Os investigadores analisaram as diferentes composições minerais das amostras de Bennu e concluíram que o asteroide resulta de uma mistura complexa de materiais, semelhante a uma estrutura fragmentada.
Esta diversidade indica que vários processos, muitos deles dependentes de água, estiveram envolvidos na formação das moléculas detetadas, tornando impossível atribuir a química prebiótica a um único mecanismo.
Podem existir ingredientes prebióticos à espreita em asteroides que permanecem indetetados em contexto extraterrestre.
As conclusões reforçam a ideia de que os ingredientes da vida podem formar-se a partir de detritos que orbitam estrelas jovens e destacam novas direções para a investigação em astrobiologia.
Para confirmar a origem do triptofano encontrado, são necessárias análises mais específicas, capazes de medir as suas assinaturas isotópicas e enantioméricas.
Os cientistas sublinham ainda a importância das missões de recolha de amostras de diferentes corpos planetários, essenciais para aprofundar o conhecimento sobre os processos químicos que precederam o aparecimento da vida.
As conclusões foram publicadas na revista Proceedings of the National Academy of Sciences.



