Reportagem dos enviados especiais do Observador à Síria
O convite no Facebook dizia o seguinte: “No meio da destruição e da guerra, há esperança e sonhos das crianças. Convidamo-vos a visitarem a nossa exposição.” Estávamos em 2014 e a escola Ain Jalut, em Alepo, inaugurava no dia 30 de abril uma exposição com desenhos dos alunos sobre a experiência de viver numa cidade em guerra, que estava cercada há já dois anos.
Naquela quarta-feira, a escola, que ficava no bairro de Al Ansari (na sitiada zona leste da cidade), foi-se enchendo de crianças e professores. Ainda não eram nove da manhã, porém, quando o ambiente alegre foi interrompido pela queda abrupta de um míssil.
Ao todo, 19 crianças e dois professores morreram neste ataque perpetrado pelas forças de Bashar al-Assad. Outras dezenas ficaram feridas, como Bayan Masri, de 11 anos, cujo caso foi documentado pela Amnistia Internacional: ficou com o corpo mutilado por estilhaços na cabeça, no peito, no fígado e num pulmão. Durante cinco dias, Bayan não conseguiu dizer uma palavra — “acho que esqueceu quem nós éramos”, explicou a mãe.
Nos primeiros minutos após o impacto, quando os ouvidos dos vivos ainda zuniam e as chamas queimavam tudo em volta, um homem foi um dos primeiros a chegar. Salem al-Abdan trabalhava como bombeiro desde janeiro de 2013, altura em que, perante a situação catastrófica na cidade cercada, decidiu largar os seus estudos em Direito e juntar-se às forças da Defesa Civil. Naquela manhã, estava na casa que partilhava à altura com os seus pais, mulher, filhos e outros familiares — 12 pessoas ao todo —, umas ruas ao lado de Ain Jalut. Assim que ouviu o estrondo, saiu porta fora. “Os civis iam sempre com os carros tirar as pessoas dos escombros”, recorda agora, mais de dez anos depois, em frente àquele exato local. “A solidariedade num cerco é imprescindível para sobreviver.”