Este Julho foi o terceiro mais quente desde que há registo, quebrando a sequência de recordes para este mês que se viveu no planeta desde 2023, segundo o serviço de observação da Terra europeu Copérnico. Mas isso não significa que as alterações climáticas tenham abrandado: o oceano global apresenta temperaturas bem acima da média, o que afecta a vida a marinha, e sobretudo o mar Mediterrâneo, que banha a Europa e o Norte de África, atingiu temperaturas sem precedentes em Julho: 26,68 graus Celsius, o que ultrapassa o recorde anterior, de 2023, que era de 26,65 graus.
Os valores para a temperatura do mar foram divulgados pela organização Mercator Ocean International, que opera o Serviço Marinho do Copérnico, cujos dados apontam para que a água de cerca de 71% do oceano tenha apresentado uma temperatura acima da média. Em 13% do oceano global, contando com os mares gelados, a água à superfície esteve um grau acima dos valores médios, com grandes anomalias no Pacífico Norte, Atlântico Norte e oceano Índico.
A temperatura média global da água à superfície, contando com todos os mares da Terra, foi de 20,8 graus Celsius — um valor semelhante, ou até acima, do que se encontra na costa portuguesa normalmente. Os valores só estiveram mais altos em 2023 (20,93 graus Celsius) e 2024 (20,91), diz o serviço Mercator.
Mediterrâneo a ferver
No Mediterrâneo, contudo, a situação em Julho foi ainda mais dramática. Em 95% deste mar que banha a Europa e o Norte de África (e o continente europeu é o que está a aquecer mais depressa), a temperatura da água esteve acima da média. Em 63% da bacia mediterrânica, a anomalia foi de, pelo menos, um grau Celsius. Mas, em 40% da área, o aquecimento da água à superfície foi pelo menos dois graus acima da média, e o Mediterrâneo ocidental foi mais afectado por essas anomalias.
As ondas de calor marinhas não são algo que ocorre e fica no oceano. Estes fenómenos podem causar estragos muito significativos nos ecossistemas marinhos, levando à mortalidade em massa de toda a vida marinha, como peixes, mamíferos marinhos, aves e corais. Podem ainda estimular a multiplicação de algas e a deslocação de espécies para outros habitats (o que pode ter impacto, por exemplo, nas pescas).
26,68
graus Celsius foi a tempratura média da água do Mediterrâeno em Julho, o que ultrapassa o recorde anterior, de 2023
A subida da temperatura da água do mar modifica também os padrões meteorológicos (a tempestade Daniel, que teve efeitos devastadores em Itália e, sobretudo, na cidade de Derna, na Líbia, conjugados com problemas de infra-estruturas, ocorreu no contexto da grande onda de calor no Mediterrâneo em 2023). Furacões que provocam cheias, bem como secas e incêndios florestais, são possíveis impactos das ondas de calor marinhas.
Um alívio nos recordes
A temperatura do ar em Julho evoluiu da mesma forma, de acordo com o último boletim mensal do Copérnico. Em termos globais, a temperatura média foi de 16,68 graus Celsius, o que fica 0,45 acima dos valores para o período 1991-2020, e 1,25 graus acima das estimativas para o período pré-industrial de 1850-1900.
Isto quer dizer que em 2025, Julho não continuou a tendência para ter temperaturas médias cada vez mais elevadas, como aconteceu nos dois últimos anos. Ficou 0,27 graus abaixo de Julho de 2023, o mais quente de que há registo, e 0,23 abaixo do de 2024, o segundo mais quente.
Os dados do Serviço de Monitorização das Alterações Climáticas do programa Copérnico (C3S, na sigla em inglês) indicam que, nos últimos 25 meses, Julho foi apenas o quarto em que a temperatura média global não excedeu os níveis pré-industriais em 1,5 graus.
Bombeiros combatem incêndio em Saint-Laurent-de-la-Cabrerisse, no departamento de Aude, França. As ondas de calor em terra e no mar estão relacionadas com estes desastres
PHILIPPE MAGONI/EPA
Mas isto não chega para dizer que o perigo do aquecimento global está a passar: “Dois anos depois do Julho mais quente de que há registo, a recente série de recordes de temperatura global passou — por enquanto. Mas isso não significa que as alterações climáticas tenham parado”, disse Carlo Buontempo, director do C3S, citado num comunicado.
Carlo Buontempo sublinhou que os efeitos do aquecimento global ainda se fazem sentir em fenómenos como o calor extremo e as inundações catastróficas registadas em Julho. “A menos que estabilizemos rapidamente as concentrações de gases com efeito de estufa na atmosfera, devemos esperar não só novos recordes de temperatura, mas também um agravamento dos seus efeitos, e devemos preparar-nos para isso”, alertou.
Na Europa, Julho foi o quarto mês mais quente de que há registo, com temperaturas 1,3 graus Celsius acima dos níveis observados entre 1991 e 2020.
As temperaturas mais elevadas foram registadas na península Escandinava, onde ocorreram ondas de calor históricas na Suécia e na Finlândia, enquanto inúmeros incêndios florestais deflagraram no sudeste da Europa, e a Turquia registou uma temperatura recorde nacional de 50,5 graus
51,9%
da Europa e da região do Mediterrâneo estavam numa situação de seca de 11 a 19 de Julho de 2025 (21 pontos percentuais acima da média de 2012-2024)
Em contraste, as temperaturas na Europa Central, no Oeste da Rússia e em partes de Espanha, ficaram abaixo do normal.
Seca na Europa
De acordo com uma análise da agência noticiosa AFP, com base nos dados do Observatório Europeu da Seca, mais de metade da Europa e da região do Mediterrâneo foi afectada pela seca no período de 11 a 19 de Julho de 2025. Esta taxa de 51,9% está 21 pontos percentuais acima da média de 2012-2024. É a mais elevada para esta época do ano desde o início das observações, em 2012.
Na Europa Ocidental, a situação agravou-se em comparação com os primeiros dez dias de Julho. Com 21% dos seus solos em alerta, o Reino Unido continua a enfrentar uma seca severa, depois de uma Primavera historicamente quente.
Esta seca ajuda a alimentar os fogos, como o incêndio histórico e mortal que deflagrou na terça-feira em Aude, no Sul de França, que só em 24 horas consumiu 16.000 hectares de vegetação. com Lusa