Três pessoas morreram e mais de 60 ficaram doentes em um surto crescente da chamada “doença dos legionários” no Harlem, popular bairro de Nova York, e as autoridades de saúde ainda estão procurando a fonte, mais de uma semana depois que as pessoas começaram a apresentar sintomas. A doença dos legionários é uma forma de pneumonia causada pela bactéria Legionella, que se prolifera em água morna e parada. Na cidade de Nova York, muitos dos surtos são causados pelo vapor d’água expelido por torres de resfriamento no topo de edifícios.
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A bactéria pode flutuar no vapor d’água por milhares de metros antes que alguém inale o patógeno e adoeça, acreditam os pesquisadores. A maioria das pessoas saudáveis não adoece após a exposição à bactéria. Mas muitas pessoas são vulneráveis, incluindo idosos, fumantes e pessoas com doenças crônicas e sistema imunológico comprometido. Em média, cerca de 200 a 500 pessoas são diagnosticadas com a doença dos legionários anualmente em Nova York, e geralmente precisam de hospitalização. Pouco mais de uma dúzia morre a cada ano.
A doença recebeu seu nome característico em homenagem a uma convenção realizada em 1976 na Filadélfia pela Legião Americana — organização de veteranos de guerra do país — que resultou em um enorme surto de casos misteriosos de pneumonia. Meses depois, cientistas dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) revelaram a causa: uma bactéria nunca antes identificada, agora chamada Legionella. Os cientistas rapidamente perceberam que ela era responsável por dezenas de milhares de casos de pneumonia a cada ano. O número só aumentou.
Nova York tem uma taxa de casos especialmente alta. Muitos casos são causados pela névoa emanada de torres de resfriamento no topo de edifícios, que desempenham um papel crucial nos sistemas de refrigeração. A água quente é canalizada para a torre de resfriamento no telhado, onde ventiladores resfriam a água por evaporação, enviando a névoa para o ambiente. Se não forem mantidas adequadamente, as torres de resfriamento podem se tornar incubadoras da bactéria Legionella, que se prolifera em água morna e parada.
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Torres de resfriamento são uma fonte comum de surtos, mas a bactéria pode se espalhar de outras maneiras, como por meio de sistemas de encanamento mal conservados. Nesses casos, as autoridades de saúde aconselham os moradores a tomarem banhos de banheira em vez de chuveiros para reduzir a quantidade de névoa no banheiro. O surto no Harlem Central foi detectado no final de julho por meio de vigilância de rotina. O departamento de saúde da cidade é alertado sobre cada teste laboratorial positivo para Legionella.
“Quando vemos um sinal preocupante, entramos em ação”, disse Shama Ahuja, comissária assistente do departamento de doenças transmissíveis. Em 25 de julho, a cidade havia identificado um grupo de cinco casos, que havia aumentado para 67 nesta quarta-feira.
Autoridades do departamento de saúde suspeitam que uma torre de resfriamento seja a culpada, porque os casos não estão confinados a um único prédio, sugerindo uma dispersão mais ampla da Legionella, disseram as autoridades. Nos últimos dias, os inspetores detectaram a bactéria em 11 torres de resfriamento, mas ainda não está claro qual — se houver alguma — pode ser a fonte do surto.
Nos últimos anos, as maiores taxas de doença do legionário foram encontradas em partes do Bronx e do Harlem, especialmente no Harlem Central. Nos bairros com maior incidência, a taxa média de casos confirmados da doença do legionário é de cerca de 10 a 20 por 100 mil habitantes. Taxas relativamente altas também foram identificadas em uma faixa da cidade, da Union Square a Chelsea e até Hell’s Kitchen.
Especialistas afirmam que as taxas mais altas no Bronx e no Harlem refletem uma série de fatores. Esses bairros apresentam taxas mais altas de doenças crônicas, como diabetes.
“Há o componente de vulnerabilidade populacional”, disse Daniel Kass, especialista em saúde ambiental e ex-comissário adjunto do departamento de saúde. “Depois, há o fator ambiental e social”, disse Kass, que desempenhou um papel fundamental na resposta ao maior surto de Legionella na cidade, em 2015.
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Em bairros de baixa renda, os edifícios têm maior probabilidade de ter sistemas de encanamento e torres de resfriamento com manutenção inadequada, o que leva a uma maior incidência da bactéria Legionella nesses sistemas, segundo especialistas. Kass observou que asilos e outros ambientes institucionais maiores eram especialmente vulneráveis. Cinco moradores de um asilo em Upper Manhattan morreram de Legionella em 2022, o surto mais letal desde o surto de 2015, que matou 16 pessoas e foi associado a uma torre de resfriamento no topo de um hotel no Bronx.
O número de casos aumentou cerca de nove vezes nos Estados Unidos nos últimos 20 anos. A expansão dos testes é responsável por parte desse aumento. Outras hipóteses são abundantes, incluindo o envelhecimento da população e o aumento do número de pessoas imunocomprometidas devido a câncer, doenças autoimunes ou uso de certos medicamentos.
Alguns pesquisadores especulam que o aumento seja um subproduto de um ar mais limpo. Cientistas da Universidade Estadual de Nova York, em Albany, publicaram um estudo sugerindo que níveis mais baixos de dióxido de enxofre, um poluente atmosférico, significam que a bactéria Legionella pode sobreviver por mais tempo no ar.
Um dos autores do artigo de 2024, o professor Fangqun Yu, do Centro de Pesquisa em Ciências Atmosféricas da SUNY Albany, disse: “Essas bactérias podem sobreviver por mais tempo se tivermos menos acidez no ar”.