Esse edifício, o Sanatório de Paimio, é um dos candidatos a património mundial da UNESCO.
É um dos candidatos a património mundial e, para mim, o mais importante, no sentido em que é o maior, é um edifício gigantesco e que precisa de imensa proteção, porque o hospital que funcionou lá até recentemente deixou de funcionar. Neste momento, a fundação Paimio tem tentado ocupar o espaço, tem visitas guiadas etc., mas ainda estão num processo de entender como é que podem ocupar a totalidade daquele edifício tão grande. Há outros edifícios que estão nomeados, como a Casa dos Aalto, o Ateliê, etc. Os projetos principais da candidatura, que são 13, estão todos na exposição, à exceção de um, que é o edifício nacional das pensões, por um motivo particular: era o projeto menos reconhecido pela crítica e menos aceite pelos próprios finlandeses, que achavam que aquilo era um hotel de luxo e que o edifício nacional das pensões não podia ser um hotel de luxo para funcionários.
Aalto tem mobiliário icónico, como a cadeira Paimio, feita para o sanatório. A exposição faz essa ligação entre arquitetura e design?
Sim, era inevitável. Aliás, eu juntei o projeto da Casa dos Aalto com a Artek na mesma sala. Até porque eles apercebem-se, pelo menos no início, que a arquitetura não é suficiente para os sustentar. Então, apesar de estarem a fazer grandes projetos, são projetos que demoram muitos anos, e eles vão sobreviver em determinados momentos mais difíceis pela venda internacional do seu mobiliário e não propriamente pela arquitetura. E temos na exposição vários exemplos. Eles vão definir aquela perna curvilínea, a ideia de dobrar a madeira, que, no fundo, são várias camadas que vão sendo coladas. Ou até, depois, a perna em forma de leque. Há o elemento orgânico, a concha, que está muito patente na ideologia dos Aalto. Há várias peças desse género, e que até representam a inventividade do carpinteiro que com eles trabalhava. Aliás, os Aalto faziam sempre questão de elogiar tanto o trabalho dos carpinteiros, como das pessoas da área da luminária, porque eles desenharam mais de 50 tipos de candeeiros, alguns que também estão na exposição.
Há uma preocupação com todos os detalhes, que também existe na obra de Siza Vieira. De que forma o arquiteto português foi influenciado por Aalto?
Eu não sei se é influência ou se é interesse. A influência é sempre subjetiva, porque muitas vezes é subconsciente, a pessoa não se apercebe que está a fazer alguma coisa. Mas, desde logo, em primeiro lugar e de forma mais evidente, é esta relação que a nova Ala tem com a clareira onde foi construída em Serralves, porque o edifício move-se para se ir afastando das árvores, que aliás foi o próprio Siza que plantou. Ele costumava brincar que não desenhou o edifício, que foram as árvores que o desenharam, porque ele moveu o edifício para que as árvores ficassem onde estavam. E, de facto, esta é uma preocupação muito ‘aaltiana’, esta da relação com a natureza, de não transformar o local, ou de o transformar de uma forma que seja integrada com a natureza. Essa preocupação de que os edifícios são desenhados a uma escala humana e que a escala humana é tão importante como a escala de um pinheiro, e que, portanto, estão todos em ligação.
Por exemplo, o Siza, nos primeiros projetos, se virmos a Casa de Chá da Boa Nova, que se assemelha muito ao projeto da Maison Carré, que está na exposição, esta ideia de um teto curvilíneo que comprime o nosso olhar em direção à natureza, à floresta, no caso dos Aalto, ao oceano Atlântico, no caso daqui de Matosinhos. Há esta relação do teto de madeira, e, acima de tudo, uma compressão da escala, que era a escala do próprio Siza, na altura, que é bastante baixa, a entrada na Casa de Chá da Boa Nova, ou na Piscina das Marés, para depois haver uma expansão visual desde o interior, em relação à paisagem. E isso é muito patente na obra do Alvar Aolto, assim como esta ideia da luz, enquanto material construtor da arquitetura.
Quem visitar a Universidade da Otanieme, ou a Universidade Aalto hoje, na periferia de Helsínquia, verá uma multidão de lanterninhas diferentes de como a luz pode entrar no edifício. De facto, é um desenho incrível. É algo que o Siza, de certa forma, também continuamente investiga na sua obra.
Esta ideia de como é que a luz pode entrar no edifício indiretamente – e não diretamente -, e ir criando diferentes atmosferas a partir desse trabalho. E também esta ideia de trabalhar continuamente com artesãos, que é uma coisa que cada vez mais se perde com a industrialização da área da construção em todo o mundo. Em Portugal, felizmente, ainda vamos tendo bastantes artesãos, mas não tantos como tínhamos antigamente.
E, portanto, há esta dedicação que o Siza tem, e que o Alvar Aalto, a Aino e a Elissa tinham, de colaborar com as pessoas que construíam as coisas. Fosse o pedreiro, fosse o carpinteiro, fosse a pessoa que faz as luminárias, daí termos tido uma exposição de design do Siza, mesmo antes desta, na Ala Álvaro Siza, propositalmente para fazer, de certa forma, a transição para esta exposição.
Está sempre em contacto com o Siza Vieira. Como é que descreve a vossa colaboração?
É uma amizade já de muitos anos, porque o Álvaro Siza tinha o seu ateliê na Rua da Alegria, ao lado da minha escola, e então, muitas vezes cruzávamo-nos no café justamente em frente. Reencontrámo-nos na Faculdade de Arquitetura quando ele foi meu professor no primeiro ano. E depois fomos mantendo uma amizade ao longo dos anos em que vamos trabalhando em vários projetos juntos. Ainda agora estamos a fazer um projeto para Bérgamo e temos feito outros projetos juntos, em conjunto. Portanto, tenho muita estima, muita amizade por ele, para lá do génio da Arquitetura, é uma figura muito humana, muito carinhosa com todos. Tenta, de certa forma, transmitir aquilo que o próprio Távora lhe deu, uma série de oportunidades aos 20 anos, da Casa de Chá da Boa Nova, da Piscina das Marés, da Quinta da Conceição, são uma série de oportunidades que um jovem como ele, se calhar, hoje não teria, e ele tenta também transmitir isso às pessoas que vão colaborando com ele, e também estar lá e apoiar e participar. Portanto, tem essa característica muito empática que aprecio muito.