Apesar de as primeiras avaliações terem indiciado que o incêndio de sexta-feira na Mesquita-Catedral de Córdova, em Espanha, não causara danos estruturais, a Junta da Andaluzia estima agora que a recuperação do monumento, classificado como Património da Humanidade pela UNESCO em 1984, custará um milhão de euros, saídos de um fundo de emergência. Porém, o Cabido de Córdova, órgão religioso que preside à gestão da Mesquita-Catedral, ainda tem de apresentar o plano de restauro, o que pode alterar os valores em causa. O Governo regional da Andaluzia avisa, de resto, que esta é “uma estimativa muito inicial”.
Na noite de sexta-feira, um incêndio deflagrou numa das capelas do monumento que era usada como armazém — uma utilização criticada “há anos” pela Plataforma Mesquita-Catedral”, como disse um seu porta-voz no rescaldo do fogo. Ali estavam guardadas cadeiras de madeira e varredoras eléctricas. Um curto-circuito terá estado na origem das chamas, que se estenderam à capela adjacente, a Capela da Anunciação, cujo retábulo, do século XIX, ficou danificado. O telhado desta última capela caiu já depois de o fogo ter sido dado como extinto, por volta da meia-noite local.
O milhão de euros já adjudicado pela conselheira da Cultura da região autónoma da Andaluzia destina-se a trabalhos imediatos, sobretudo de desobstrução e limpeza, para que depois se possa fazer uma avaliação das necessidades de restauro e outras intervenções.
A promessa de que o plano de intervenção será aprovado ainda esta segunda-feira foi feita pela conselheira Patricia del Pozo à rádio Onda Cero e citada pela imprensa espanhola. O padre Joaquín Alberto Nieva, da Diocese de Córdova, e presidente do Cabido, disse ao diário El País que o orçamento da recuperação não será problema e que a diocese pode arcar com os custos, por dispor de um fundo de contingência para problemas deste tipo.
Aos danos reportados na capela que servia de armazém e na Capela da Anunciação somam-se ainda os estragos sofridos pela Capela de São Nicolau de Bari. Nas duas primeiras, disse a conselheira Patricia del Pozo, “os danos são muito localizados, cerca de 50 ou 60 metros quadrados, e são perfeitamente restauráveis”. A salvo, registou ainda, ficaram o retábulo da capela mais pequena, um Cristo e uma Anunciação. Os estragos na Capela de São Nicolau de Bari serão minimais.
As máquinas e os materiais necessários para remover os escombros estão em prontidão, diz o El País, e poderão entrar assim que a polícia forense abandonar o local. Uma coluna da Porta de São Nicolau terá de ser escorada e há ainda muita madeira carbonizada para retirar.
O monumento será visitado ainda esta semana por peritos da UNESCO, a organização das Nações Unidas dedicada ao património, para avaliar os estragos.
A Mesquita-Catedral começou a ser construída no século VIII sobre o que restava de uma antiga basílica visigótica. Acompanhando a longa presença muçulmana na região, foi crescendo e evoluindo ao sabor de diferentes estilos arquitectónicos, passando a catedral cristã em 1235, quando a cidade de Córdova foi reconquistada por Fernando III. Desde então, foram-lhe sendo adicionados elementos da iconografia católica; a principal intervenção a que foi sujeita data do século XVI, altura em que as naves da mesquita passaram a enquadrar a catedral com base na tradicional forma de cruz latina, rodeada pelo Pátio das Laranjeiras e encimada pelo minarete, que se mantém.
A gestão do monumento e espaço de culto nunca esteve isenta de polémica. Em 2006, foi confiada à Igreja Católica, cabendo ao Cabido de Córdova a sua conservação e utilização. Agora, as críticas ao uso da capela onde começou o incêndio como armazém vieram também da Junta Islâmica, que pede uma investigação “séria e profunda” ao incêndio. O Cabido argumenta que o uso de espaços da catedral para esse efeito estava perto de se solucionar e que haviam sido já comprados dois novos armazéns, que se encontram em obras. O jornal local El Día de Córdoba escreve que as cadeiras e outros objectos empilhados na capela já lá estavam “há anos”.