Enquanto os oceanos cobrem mais de 70% da superfície terrestre, grande parte de seus mistérios permanece nas profundezas. Entre essas curiosidades estão os sistemas hidrotermais, chaminés submarinas capazes de gerar hidrogênio e formar ecossistemas únicos longe da luz do Sol. Uma nova descoberta no Pacífico Ocidental promete expandir significativamente nossa compreensão desses ambientes extremos e do papel do hidrogênio na Terra primitiva.
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Cientistas do Instituto de Oceanologia da Academia Chinesa de Ciências (IOCAS) identificaram um enorme sistema hidrotermal, o campo Kunlun, localizado a cerca de 80 quilômetros a oeste da Fossa de Mussau, na Placa Caroline. Publicado na Science Advances em 8 de agosto de 2025, o estudo revela que o Kunlun abriga 20 grandes depressões submarinas, algumas com mais de um quilômetro de diâmetro, agrupadas como um “enxame de tubos”: estruturas cilíndricas que canalizam líquidos e gases do interior da Terra.
O submersível tripulado Fendouzhe permitiu a exploração detalhada da região, onde os pesquisadores encontraram fluidos ricos em hidrogênio e extensas formações carbonáticas localizadas abaixo da profundidade de compensação carbonática. “O sistema Kunlun se destaca por seu fluxo de hidrogênio excepcionalmente alto, escala e cenário geológico único”, afirmou o Prof. SUN Weidong, autor correspondente do estudo. Ele destacou que a geração de hidrogênio por serpentinização, reação de rochas ricas em ferro e magnésio com a água, pode ocorrer longe das dorsais meso-oceânicas, desafiando suposições anteriores.
Medições feitas com espectroscopia Raman indicaram concentrações de hidrogênio molecular entre 5,9 e 6,8 mmol/kg nos fluidos difusos. Apesar da temperatura moderada da água (abaixo de 40 °C), marcadores geoquímicos sugerem condições muito mais quentes no subsolo, capazes de formar dolomita, evidenciando intensas interações fluido-rocha. Com base no mapeamento da área de descarga e na análise do fluxo, o Kunlun contribui com aproximadamente 4,8 × 10¹¹ mol de hidrogênio por ano, o que representa cerca de 5% da produção global abiótica desse elemento em fontes submarinas.
O campo apresenta características geológicas impressionantes, como crateras de paredes íngremes semelhantes a tubos de kimberlito, depósitos explosivos de brecha e camadas de carbonato. “A atividade hidrotermal aqui parece seguir uma evolução em estágios: primeiro erupções gasosas, depois circulação hidrotermal prolongada e deposição mineral”, explica SUN.
Além do aspecto geológico, Kunlun também abriga uma vida marinha diversificada. Camarões, lagostas, anêmonas e vermes tubulares prosperam neste ambiente, provavelmente sustentados pela quimiossíntese alimentada pelo hidrogênio. Para os pesquisadores, o sistema funciona como um verdadeiro laboratório natural, oferecendo pistas sobre as condições químicas da Terra primitiva que podem ter dado origem à vida.
O estudo do Kunlun não apenas amplia o conhecimento sobre fluxos de hidrogênio em águas profundas, mas também aponta para o potencial de exploração de recursos submarinos ainda inexplorados, além de fornecer um modelo para compreender os primeiros ecossistemas da Terra.