Pedro Sarmento Costa / EPA
Habitante foge de incêndio em Quintela, Sernancelhe
Chamas de Trancoso e Sátão atingem 10 municípios. Há 6 grandes fogos, está “descontrolado” em Arganil. Governo percebe reclamações.
Os incêndios não dão tréguas em Portugal. E, como a ministra da Administração Interna tinha avisado, esta sexta-feira seria um dia particularmente complicado.
Ao início da manhã, mais de 3.500 operacionais combatiam os 37 incêndios ativos em todo o país, seis deles a mobilizar o maior número de meios.
O mais preocupante é em Arganil. “As coisas descontrolaram-se completamente durante a noite, os ventos são muito severos”, relata o presidente da Câmara Municipal local.
Luís Paulo Costa lamenta na TSF: “Nós não conseguimos perceber onde é que estão os meios. Fala-se em 800 e 900 operacionais, eu até acredito que eles estejam espalhados por todas as frentes de fogo, mas nesta zona há poucas intervenções de proteção a acontecer, isto está completamente desgovernado e nós não conseguimos antever um desfecho positivo para isto”.
O autarca, emocionado, lembra o que aconteceu há oito anos: “Tudo isto nos cheira a 2017 e isso perturba-nos muito. Temos um conjunto de aldeias que durante a noite foram completamente cercadas e que, fruto da articulação entre bombeiros e GNR, foi possível pelo menos preservar as casas e garantir a vida das pessoas, mas há aldeias que estão na linha de fogo e o vento está muito severo”, alerta, sublinhando que algumas pessoas já foram aconselhadas a sair de casa.
Os incêndios que começaram em Trancoso e Sátão afetam atualmente 10 municípios e têm três frentes ativas muito grandes, disse à agência Lusa o segundo comandante regional do Centro, Jody Rato.
“Os incêndios de Trancoso e de Sátão estavam muito perto, quase a interagir, havia já zonas em que estavam a menos de 10 quilómetros e nesse sentido absorvemos o comando que, agora, é só um e temos 10 municípios”, adiantou à agência Lusa, cerca das 09h00, o comandante no terreno, Jody Rato.
O incêndio afeta os municípios de Sátão, Sernancelhe, Moimenta da Beira, Penedono e “também já a entrar” em São João da Pesqueira (distrito de Viseu); Aguiar da Beira, Trancoso, Fornos de Algodres, Meda e Celorico da Beira (distrito da Guarda).
“Neste momento tem três frentes ativas muito grandes. Uma delas com mais de 20 quilómetros de frente. A zona de maior preocupação é na zona norte, na cabeça, porque é onde está com maior intensidade, ou seja, em Penedono e em São João da Pesqueira”, adiantou.
O presidente da Câmara Municipal de Sernancelhe disse à Lusa que o concelho está “a ser atacado” por dois incêndios distintos, tendo decretado emergência municipal e adaptado um pavilhão para apoiar população.
“Apesar dos quatro dias de esforços que fizemos, não foi possível segurar os incêndios e eles entraram e colocaram em risco muitas freguesias e populações e dividiu o concelho em duas partes, o que dificultou o combate”, disse Carlos Santos, pelas 20:00.
A aldeia de Covanca, em Pampilhosa da Serra, vai ser evacuada devido ao agravamento do incêndio que lavra desde quarta-feira.
Entretanto, o incêndio em Portalegre e Castelo de Vide está 90% dominado, diz a Proteção Civil.
O Exército português já mobilizou mais de 3.200 militares para o combate aos incêndios no país, mantendo 35 patrulhas diárias em ações de vigilância e deteção de fogos.
Cerca de 130 concelhos do interior Norte e Centro do país e seis municípios do Algarve estão hoje em risco máximo de incêndio. De acordo com o IPMA, estão sob risco máximo de incêndio todos os concelhos dos distritos de Bragança, Guarda e Viseu e a maioria dos de Vila Real, Castelo Branco e Coimbra.
Posto de combustível
Esta quinta-feira, dia igualmente muito perturbado, ficou marcada por um susto em Castelo de Vide: as chamas estiveram perto de um posto de combustível.
O incêndio estava a progredir lentamente mas, explica a RTP, de repente uma faúlha passou para o outro lado da estrada.
Uma alta labareda apareceu por detrás do posto de combustível; todas as pessoas foram evacuadas “à pressa” pela GNR.
E os meios?
Em Aguiar da Beira, os habitantes locais pedem “outra organização” dos meios no combate aos incêndios.
E ali ao lado, em Sernancelhe, foi um comandante de bombeiros a reforçar as queixas: “Em duas sub-regiões, dois postos de comando, um posto de comando do diretor… Ninguém se entende!“, lamentou Luís Fonseca, comandante dos Bombeiros Voluntários de Sernancelhe, na RTP.
A ministra da Administração Interna, Maria Lúcia Amaral, admite: “A descoordenação… Ninguém está imune a ela. Num esforço tão grande quanto este, pode ocorrer e ocorrerá inevitavelmente, porque tudo é extraordinariamente complexo. Claro que se compreende quem está próximo das populações entenda que tudo que existe não é suficiente, porque os meios realmente são sempre limitados”, disse Maria Lúcia Amaral.
Jody Rato compreende as queixas mas explica: a área ardida é muito grande.
“Estamos a falar de uma área de mais de 6 mil hectares. Os meios aéreos, obviamente que se estiverem a atuar numa zona do incêndio, não serão visíveis noutra zona. Eu compreendo perfeitamente. Também tenho muitos anos, muitas horas, de estar no terreno e compreendo que, quem está no terreno, não tem a perceção da complexidade da organização”, afirmou o segundo comandante regional do Centro.
O Governo também entende as queixas mas assegura que tudo o que é possível está a ser feito no combate aos incêndios.
O primeiro-ministro garantiu: “Nós estamos a fazer o esforço máximo para não deixar ninguém sozinho, a fazer o esforço máximo para mobilizar todos os meios que temos Acompanhamos a situação a toda a hora”.
“Nós estamos a fazê-lo de forma talvez discreta, mas, acreditem, muito próxima e procurando ser o mais eficaz e eficiente possível. Nós estamos a fazê-lo utilizando tudo aquilo que é possível, depois de termos feito uma preparação do ponto de vista da prevenção e da dotação de todo o sistema para o combate”, acrescentou Luís Montenegro.
A ministra da Administração Interna disse que está no terreno “o maior dispositivo de sempre” no combate aos fortes incêndios.
Mas também percebe o apelo dos presidentes de Câmara: “Eu compreendo muitíssimo bem todos os apelos que os autarcas têm feito, perante a natureza dramática daquilo que nós estamos a viver é mais que compreensível. Cada autarca, cada titular de poder local eleito é diretamente responsável pelas suas populações nos seus territórios, portanto sente como ninguém a impotência e a aflição que tudo isto provoca”.
Os dois Canadair que estavam avariados já foram substituídos. O comandante nacional da Proteção Civil afirmou que o mecanismo europeu de proteção civil poderá ser ativado caso Portugal não consiga prolongar a permanência dos outros dois aviões Canadair, de Marrocos.