A histórica igreja de Kiruna iniciou esta terça-feira a sua mudança para o novo centro da cidade, devido à instabilidade do solo decorrente da expansão da maior mina subterrânea de ferro do mundo, avança o jornal sueco The Local, que dá conta dos detalhes do projeto de relocalização do centro da cidade. E há, pelo menos, mais duas dezenas de infraestruturas que também terão de ser deslocados.
Um dos grandes destaques vai para a Kiruna Kyrka, igreja luterana sueca de 1912, feita de madeira, que pesa 672 toneladas e tem 40 metros de altura. A construção será transportada na íntegra ao longo de cinco quilómetros, sobre plataformas rolantes gigantes e apoiada em vigas de aço. O trajeto, que será feito a uma velocidade máxima de 500 metros por hora, deverá demorar dois dias.
A deslocação da igreja emblemática irá acontecer após se ter concluído pela existência de risco de fissuras no solo no antigo centro da cidade, após mais de um século de exploração de minério de ferro.
“O maior desafio foi preparar a estrada para a passagem de um edifício tão largo”, explica o gestor de projeto Stefan Holmblad Johansson à BBC.
A estrada por onde irá ser feita a mudança foi alargada para 24 metros e foram removidos candeeiros e semáforos que pudessem afetar a deslocação e até uma ponte.
Uma das maiores preocupações é a proteção do interior da igreja, em especial da pintura do altar feita pelo príncipe Eugen, membro da família real sueca. “Não é algo pendurado num gancho que simplesmente se tira”, explica Johansson. “Está colada diretamente numa parede de alvenaria, pelo que seria difícil removê-la sem causar danos. Vai permanecer dentro da igreja durante a mudança, totalmente coberta e estabilizada. O mesmo acontecerá com o órgão, com os seus mil tubos.”
Em declarações à BBC, Robert Ylitalo, diretor executivo da empresa de desenvolvimento de Kiruna LKAB, garante não há risco de as pessoas caírem nas fendas que vão surgindo, esclarecendo, porém, que se nada fosse feito a instabilidade do solo “acabaria por danificar os sistemas de água, eletricidade e saneamento”: “As pessoas têm de sair antes que a infraestrutura colapse”.
A relocalização da igreja deverá custar 500 milhões de coroas suecas (cerca de 45 milhões de euros), suportados pela LKAB, empresa detida pelo estado sueco e líder global em mineração e processamento de minério de ferro, que descreveu este projeto como “um evento único na história mundial”, avança o The Local.
“Foi tudo preparado ao pormenor”, diz, Johansson, o responsável pela mudança. “É um acontecimento histórico, uma operação muito grande e complexa, e não temos margem de erro. Mas está tudo sob controlo.”
Para os párocos da igreja, a deslocação gera um sentimento controverso — “A igreja é, de certa forma, a alma de Kiruna e, de certa forma, um lugar seguro”, afirmou Lena Tjärnberg à Reuters. “Para mim, é um dia de alegria. Mas acho que as pessoas também se sentem tristes, porque temos de deixar este lugar.”
A complexa e dispendiosa operação logística despertou um grande interesse na população sueca – segundo o jornal sueco, são esperadas mais de 10 mil pessoas nas ruas da cidade, que tem 18 mil habitantes, incluindo o rei Carlos Gustavo da Suécia.
A televisão sueca transmitirá toda a operação em direto, por se tratar de um momento histórico para o país.
A igreja não é, no entanto, o único edifício a ser deslocado – outras 23 infraestruturas culturais serão realocados no âmbito da mudança de Kiruna.
À medida que a exploração da mina de ferro da LKAB foi avançando para maiores profundidades ao longo dos anos, a estabilidade do solo sob Kiruna enfraqueceu, aumentando o risco de colapso em algumas zonas.
Segundo a LKAB, cerca de 3 mil casas e 6 mil pessoas terão de se mudar. Vários edifícios públicos e comerciais estão a ser demolidos, enquanto outros, como a igreja, são transportados inteiros.
Além de minério de ferro, a mina pensada pelo geólogo Per Geijer contém depósitos significativos de terras raras — um grupo de 17 metais essenciais para produtos e para tecnologias verdes fundamentais ao cumprimento das metas climáticas da Europa.
O processo de relocalização da cidade começou há quase duas décadas e deverá prolongar-se durante vários anos. O novo centro urbano da cidade foi oficialmente inaugurado em setembro de 2022.
Texto editado por Carlos Diogo Santos