A histórica igreja de Kiruna, na Suécia, iniciou esta terça-feira uma viagem de dois dias até uma nova localização, descendo lentamente uma estrada do Árctico para salvar as suas paredes de madeira do abatimento do solo e da expansão da maior mina subterrânea da Europa e a maior de minério de ferro do mundo.

Os trabalhadores elevaram a igreja, com 600 toneladas e 113 anos de idade, retirando-a das suas fundações e colocando-a num reboque especialmente construído – parte de um projecto de 30 anos para deslocar milhares de pessoas e edifícios da cidade lapónica.

A operadora da mina, a LKAB, passou o último ano a alargar a estrada para a viagem que levará a igreja pintada de vermelho – uma das maiores estruturas de madeira da Suécia e frequentemente eleita a mais bela do país – por um percurso sinuoso de cinco quilómetros até ao novo centro da cidade de Kiruna.

A viagem salvará a igreja, mas afastá-la-á do local onde esteve erguida durante mais de um século. “A igreja é, de certa forma, a alma de Kiruna e, de certa forma, um lugar seguro”, disse Lena Tjarnberg, a pároca de Kiruna. “Para mim, é um dia de alegria. Mas acho que as pessoas também se sentem tristes porque temos de deixar este lugar.”

Para muitos membros da comunidade indígena Sami da região, que há milhares de anos aí pastoreiam renas, os sentimentos são menos ambíguos. A mudança é um lembrete das mudanças muito maiores trazidas pela expansão da mineração.

“Esta zona é terra tradicional Sami”, afirmou Lars-Marcus Kuhmunen, presidente da comunidade local Sami de Gabna. “Esta zona era terra de pasto e também o local onde nasciam as crias das renas.”

Se avançarem os planos para outra mina próxima, após a deslocação, isso cortará o caminho entre os pastos de Verão e os de Inverno das renas, tornando o pastoreio “impossível” no futuro, disse.

“Há 50 anos, o meu bisavô disse que a mina iria devorar o nosso modo de vida, o nosso pastoreio de renas. E tinha razão.”


A igreja é apenas uma pequena parte do projecto de deslocação. A LKAB explica que cerca de três mil casas e aproximadamente seis mil pessoas terão de ser transferidas. Vários edifícios públicos e comerciais estão a ser demolidos, enquanto alguns, como a igreja, estão a ser transportados inteiros.

Outros edifícios estão a ser desmontados e reconstruídos em redor do novo centro da cidade. Centenas de novas habitações, lojas e uma nova câmara municipal também já foram construídas.

A mudança deverá permitir que a LKAB, que produz 80% do minério de ferro extraído na Europa, continue a prolongar a operação de Kiruna por mais décadas.

A empresa estatal já extraiu cerca de 2 mil milhões de toneladas de minério desde a década de 1890, principalmente da mina de Kiruna. Os recursos minerais são estimados em mais 6 mil milhões de toneladas em Kiruna e nas localidades próximas de Svappavaara e Malmberget.

A LKAB está agora a planear a nova mina junto ao lugar onde hoje está situada Kiruna.

Além de minério de ferro, a mina de Per Geijer contém depósitos significativos de terras raras, um grupo de 17 metais fundamentais para produtos que vão desde lasers a iPhones, bem como para tecnologias verdes essenciais ao cumprimento das metas climáticas da Europa.

A Europa – e grande parte do resto do mundo – depende actualmente quase por completo da China para o fornecimento e processamento de terras raras. Em Março deste ano, a União Europeia designou Per Geijer como Projecto Estratégico, o que poderá ajudar a acelerar o processo de entrada da nova mina em produção.

Cerca de 5 km estrada abaixo, o novo centro da cidade de Kiruna também começa a ganhar forma.

“A igreja é… uma declaração ou um símbolo desta transformação da cidade”, disse o presidente da câmara, Mats Taaveniku, à Reuters. “Estamos agora a meio caminho. Restam-nos dez anos para deslocar o resto da cidade.” Reuters