“Com os nossos adeptos podemos conseguir muita coisa. Eu digo: bem-vindos a Istambul, bem-vindos a Kadiköy. Bem-vindos ao inferno”. Estas frases foram ditas por José Mourinho há duas semanas, quando o Fenerbahçe recebeu o Feyenoord na Liga dos Campeões. E o clube turco explorou a ideia há poucas horas, dirigindo-se ao Benfica: “Isto é o Kadikoy, daqui não há saída”, publicaram num vídeo. “Vamos todos juntos transformar o Kadikoy num inferno”, apontou um dirigente.
O que aqui está em causa é o ambiente com que os turcos vão receber o Benfica na primeira mão do play-off de acesso à Liga dos Campeões (20h, Sporttv 5). No estádio Sükrü Saraçoglu, em Kadiköy (Istambul), os “encarnados” não vão ser recebidos com aplausos, chá e bolinhos – e nem sequer com indiferença.
Tochas, petardos, fumo, coreografias, cânticos, gritos, adeptos pendurados nas redes, barulho permanente e, em geral, hostilidade para com os adversários é aquilo que os adeptos do Fenerbahçe costumam ter para oferecer e não é provável que abdiquem disso para o jogo caseiro mais importante da temporada.
Ali, o som vira erupção e as luzes viram fogo. E o Benfica terá de passar pelos portões do inferno futebolístico. “Os adeptos podem influenciar os jogadores do Fenerbahçe de forma muito positiva. Com o Feyenoord, a perder 1-0, sentimos a força dos nossos adeptos e isso ajuda-nos”, explicou José Mourinho, treinador dos turcos. Já Bruno Lage tentou “matar” o tema com uma pergunta a um jornalista: “Tem ido assistir aos jogos do Benfica na Luz? Vai ser um inferno semelhante. Estamos preparados.”
Apesar de tudo isto, não consta que gritos, tochas e hostilidade marquem golos e ganhem jogos de futebol. E é a isso que o Benfica se agarrará, numa temporada com quatro jogos, quatro vitórias e zero golos sofridos.
Burasi Kadiköy, buradan çikis yok!
?? #FBvSLB pic.twitter.com/Jjm7v1HZG8
— Fenerbahçe SK (@Fenerbahce) August 18, 2025
Que sistema?
O Fenerbahçe-Benfica é um duelo que já tem história neste início de temporada. Há menos de um mês houve Eusébio Cup na Luz e os “encarnados” venceram por 3-2. O que é que esse jogo dirá para este play-off? A nível individual poderá ter ajudado a tirar um par de ilações sobre os jogadores turcos. A nível colectivo dificilmente essa partida diz o que quer que seja.
Logo à cabeça, porque o Benfica apresentou um 4x3x3 diferente do 4x4x2 que tem usado nas partidas oficiais. Depois, porque o cariz amigável dessa partida deu ao jogo uma aleatoriedade que não aconselha grandes leituras.
Por fim, porque uma partida com muitas substituições, ritmo lento e nada em jogo não é em comparável com o que quer que seja que vai acontecer no inferno de Istambul.
A abordagem de Bruno Lage a esta partida será interessante de ver. O técnico já nos habituou a ser um treinador cuja preparação do jogo em função do adversário se sobrepõe à imposição de uma ideia única.
Nesse sentido, uma primeira mão fora de casa frente a uma equipa forte poderia sugerir a sobrepovoação do meio-campo e a retirada de um avançado. Mesmo o 3x5x2 do Fenerbahçe pode dar jogadores a mais para Enzo e Ríos lidarem na zona central, algo que também sugere a entrada de mais um médio.
Akturkoglu na berlinda
Por outro lado, três jogos consecutivos em 4x4x2 – dois deles na Champions – sugerem que o técnico está seguro neste plano e nestes jogadores – também não tem mudado nada no “onze”, preferindo a sobrecarga física com ganho de rotinas à rotação da equipa com menos tempo de jogo juntos.
E há uma dinâmica nova neste Benfica que até pode ajudar a encaixar perfeitamente a equipa no sistema de jogo turco. Tem sido comum Aursnes baixar para lateral-direito e o Benfica defender com uma linha de cinco que ofereça um jogo de pares mais evidente sem bola – e isso também permite pressionar os três centrais turcos com Schjelderup, Pavlidis e Ivanovic.
Essa dinâmica que Lage criou para esta temporada dará, em tese, alguma solidez ao bloco defensivo e, ao mesmo tempo, uma boa capacidade de pressão à saída de bola dos turcos. O problema é de que forma a equipa faz estas duas coisas sem criar uma imensidão de espaço entre linhas à frente de Ríos e Enzo.
A nível táctico é um pouco disto que haverá a falar, mas, a nível individual, o jogo tem um detalhe interessante. Kerem Akturkoglu é, no momento de escrita deste artigo, jogador do Benfica. Há, porém, uma proposta do Fenerbahçe (confirmada por Lage), clube que não terá gostado que o Benfica tivesse usado o turco durante uns minutos do jogo com o Nice, invalidando a presença neste play-off caso o Fenerbahçe o contrate.
No meio desta negociação há um jogador. E uma coisa é certa: se tiver algum impacto nesta eliminatória será com a camisola do Benfica.