Jean Pormanove, um criador de conteúdo francês, morreu esta segunda-feira durante uma livestream (um vídeo transmitido em directo na internet) em que sofreu agressões e humilhação ao longo de vários dias. As autoridades policiais de Nice abriram uma investigação às circunstâncias da morte e o caso intensificou entretanto um velho debate sobre os limites dos conteúdos online.

Pormanove, ou JP, cujo nome real era Raphael Grave, morreu numa habitação em Contes, perto de Nice, durante uma transmissão na plataforma Kick. O conteúdo do streamer passava, frequentemente, por situações em que era alvo de assédio, violência e humilhação às mãos de outros intervenientes nos vídeos.

No seu derradeiro vídeo, o homem de 46 anos tentava manter-se acordado há dez dias seguidos. Durante a maratona, Pormanove era agredido e humilhado por dois outros participantes na transmissão, um número que já tinha acontecido outras vezes, segundo explica a imprensa francesa.

Clara Chappaz, secretária de Estado francesa para os Assuntos Digitais, anunciou que foi aberta uma investigação sobre as causas e circunstâncias da morte de Pormanove que, segundo a governante, citada pelo Le Monde, foi alvo “de humilhação e de um absoluto terror” ao longo de vários meses.

O final do vídeo mostra Pormanove já inconsciente numa cama. Os outros dois homens atiram uma garrafa de plástico em direcção ao streamer, que já não reage.

Pormanove tinha um total de mais de um milhão de seguidores nas várias redes sociais em que estava presente, mas era na plataforma Kick que se destacava. O site de streams australiano nasceu em 2022 e assemelha-se ao Twitch, propriedade da Amazon, mas tem apenas cercas de um terço dos utilizadores.

No entanto, o que distingue mesmo o Kick é o facto de a plataforma ficar com uma percentagem muito menor do dinheiro gerado pelos criadores de vídeos (5%, contra os 30% cobrados pelo Twitch) e de ter uma política de moderação de conteúdo bastante mais permissiva, sendo comum a publicação de materiais violentos ou sexualmente explícitos. Os conteúdos publicados por Pormanove e o seu grupo incluíam, por exemplo, agressões, estrangulamentos e outras formas de violência física e psicológica.

A permissividade do Kick tem atraído vários exilados de outras redes sociais, como é o caso de Amouranth, a criadora de conteúdo norte-americana expulsa do Twitch por nudez e conteúdos sexuais, ou de Adin Ross, conhecido pelos seus comentários sexistas, racistas e homofóbicos. Mesmo antes da morte de Pormanove, em França, já decorria uma investigação, desde Dezembro, sobre suspeitas de “actos deliberados de violência” contra “pessoas vulneráveis” na plataforma, recorda a BBC.

Em reacção ao caso francês, um porta-voz do Kick disse que a plataforma está a “analisar de forma urgente as circunstâncias [da morte] e a dialogar com as entidades relevantes para investigar a situação”.

“Estamos profundamente tristes pela perda de Jean Pormanove e endereçamos as nossas condolências à família, amigos e comunidade”, acrescentou a empresa.