Cidade espanhola dá o primeiro passo em direção a um turismo sustentável. Os residentes e comerciantes sentem-se incomodados com o estado atual da cidade
A coligação entre o PP e o Vox aprovou uma nova lei que, apesar de tímida, é inédita na cidade, já que limita o tamanho dos grupos turísticos, declara zonas como “saturadas” e impõe restrições aos free tours.
De acordo com o executivo municipal, o objetivo da medida é equilibrar a atividade turística com a qualidade de vida dos habitantes. Mari Carmen Zamorano, residente no centro histórico, vive numa das ruas mais estreitas e já ouviu turistas criticarem-na por tentar entrar com o carro na sua própria garagem. Ao El País, diz que as medidas são “um bom primeiro passo, embora insuficiente”.
Este fenómeno de turistificação, a par da gentrificação e da proliferação de alojamentos turísticos, tem contribuído para o desaparecimento de comércio tradicional e de população nestes bairros. “Houve quem me perguntasse como me atrevia a viver ali, que devia ir viver para outro lado. Sentes que estorvas na tua própria cidade”, conta Mari Zamorano.
A nova lei de Toledo segue o exemplo de outras cidades que procuram tornar o turismo compatível com a vida nos bairros históricos, sem prescindir dos benefícios económicos que ele traz. O decreto, inédito numa cidade que até agora apenas regulava o turismo em datas específicas, proíbe também o uso de megafonia depois das 23:00, para garantir o descanso dos moradores, e obriga o uso de sistemas de áudio individuais em grupos com mais de 30 pessoas (exceto grupos escolares).
José, vizinho de Mari, partilha a frustração: “muitas vezes nem conseguimos passar na rua. Os turistas pensam que isto é um museu e que aqui ninguém mora”. A nova legislação obriga os grupos a não bloquear entradas e saídas de casas e lojas, a circularem em fila nas ruas mais estreitas e a facilitar a passagem de residentes com carrinhos de compras ou de bebé.
A limitação de pessoas por grupo não é solução para José: “Se são 80 grupos…”, diz, referindo-se aos pacotes turísticos que trazem excursões a várias cidades à volta de Madrid, onde tudo está previamente organizado – desde onde comer até onde comprar recordações.
Esse tipo de turismo – rápido, em massa, e com pouco impacto económico real – pode pagar uma taxa de estacionamento, mas gera pouco lucro para os negócios locais. Mamen Navarro, dona de uma loja de roupa há 40 anos, critica igualmente estas excursões: “acho fantástico que se regule, porque esses grupos não consomem e estão a ocupar espaço”.
Com a abertura de vários centros comerciais, os residentes deixaram de fazer compras no centro. Por isso, Mamen vive do turismo, mas exige que este seja de qualidade. Sente-se incomodada pelo tipo de consumo, mas não pelo número de turistas e relativiza as queixas dos residentes: “sempre vim de carro para as minhas lojas, dou uma apitadela e as pessoas afastam-se.”
Free Tours – visitas guiadas, pagas em gorjetas
A nova legislação causou indignação entre os free tours – visitas guiadas pagas em gorjetas, que usam chapéus-de-chuva coloridos como ponto de encontro e estratégia de marketing. Este tipo de sinalização passa a ser proibida, com base na legislação de publicidade urbana, como pediam há anos as principais associações de guias turísticos.
Toledo tem cerca de 40 guias free tour, que representam 10% das visitas e operam sobretudo na Praça de Zocodover. A porta-voz Silvia Pérez Verde vê estas restrições como um ataque ao turismo “sustentável”, que, segundo ela, os free tours promovem: “Famílias, amigos que viajam de forma independente, que comem, compram e dormem na cidade”.
A lei prevê coimas até três mil euros para quem a infringir, e vai permitir grupos até 50 pessoas apenas com autorização especial e justificada do Departamento de Mobilidade.