O primeiro romance do autor japonês Kiyoshi Shigematsu está sendo publicado no Brasil. Você Precisa de um Gato (Ed. Bertrand Brasil) traz uma narrativa sobre amor, família, amizade, luto e solidão. Best-seller no Japão, já foi publicado em 15 países.
O livro reforça a qualidade dos gatos como boa companhia. A estrutura se desenvolve por meio de sete histórias com pessoas comuns em momentos decisivos: o casal de meia-idade sem filhos, a fugitiva da polícia, a criança que faz bullying, a idosa que está perdendo a memória, o vizinho ranzinza, os irmãos em fuga e a família que é obrigada a vender a casa.
Em meio ao drama de cada um, um pet shop em Tóquio oferece aos clientes a oportunidade de levar para casa um de seus gatos de aluguel. As condições: o felino deve ser devolvido em três dias, só pode comer o alimento fornecido pela loja e deve estar sempre acompanhado de sua familiar manta de estimação.
Livro reforça a qualidade dos gatos como boa companhia Foto: Alex_Zotov/Adobe Stock
Leia trecho de ‘Você Precisa de um Gato’
A gata que tinha alergia a pólen
O tempo padrão era de três dias. Três dias com dois pernoites.
— Sei que parece pouco tempo…
Era o que o gerente do pet shop sempre dizia para os clientes que haviam acabado de assinar contrato. Tanto o tom de voz quanto sua expressão eram sempre os mesmos.
— Se for mais tempo, cria-se um apego por parte do locatário.
Além disso, os gatos ficariam preocupados, pensando que não voltariam mais para cá.
Não era permitido comprar os animais. Para alugar um gato novamente, era necessário o intervalo de um mês.
— Esses gatos estão disponíveis apenas para locação — dizia o gerente. O tom de voz tranquilo, mas categórico, que confirmava os termos do contrato era o mesmo de sempre.
A taxa não era nada barata. Somando o valor de locação por três dias ao pagamento da caução, que correspondia a várias vezes o valor do aluguel, facilmente atingia-se o preço da compra de um filhote de raça vendido ali.
Mesmo assim, a clientela era constante. Todos os sete gatos à disposição, ao retornarem à loja, descansavam em torno de uma ou duas noites e logo se dirigiam para suas novas casas para ficarem outros três dias fora.
Quando um gato saía da loja, o cliente também levava areia e ração. O gerente do pet shop alertava o locatário para não alimentar o felino com outras comidas além da entregue. Também solicitava para não dar ao gato, em circunstância nenhuma, comidas como cebola, mariscos e frango com osso.
— A cebola é um veneno para o sangue dos gatos, pois causa anemia. Quanto aos mariscos, eles afetam as orelhas. Começa com inchaço e vermelhidão, podendo chegar ao ponto de causar dermatite. Se ficar sem tratamento, há o risco de perder o local afetado. Já os ossos de frango, quando mastigados, racham e ficam pontudos, podendo perfurar a garganta ou os órgãos internos, e isso não seria nada bom.
Havia clientes que anotavam tudo; alguns concordavam com a cabeça, com expressão de espanto; outros ouviam a explicação em silêncio; e havia também aqueles que não prestavam atenção, achando que já sabiam de tudo… As reações eram variadas, mostrando que todos tinham experiências diferentes em relação ao cuidado de gatos.
Mesmo que o cliente não tivesse experiência nenhuma com felinos, o gerente do pet shop não deixava de atendê-lo.
Para estes clientes, ele firmava o tom e repetia a explicação.
— Você não deve dormir com a gata. Quando for a hora de dormir, você deve deixar a manta como está na caixa de transporte e colocar a gata lá dentro. Não lave a manta de jeito nenhum, mesmo que esteja suja.
Gatos não gostavam de mudanças de ambiente. Logo, ser alugado vez após vez seria estressante para qualquer gato.
— Por isso… — disse o gerente, como se fosse um ritual corriqueiro. Era provável que, àquela altura, até mesmo o tempo de duração da explicação fosse o mesmo. — Usa-se essa manta.
Cada um dos sete gatos usava, desde que nasceu, a sua própria manta para dormir. Contanto que estivessem com ela, não importava o lugar, conseguiriam dormir tranquilamente.
— O senhor deve ter visto em mangás antigos alguma história em que uma personagem sempre viaja com o próprio travesseiro. É a mesma coisa — dizendo isso, ele riu alto, como lhe era de costume. — Então, aqui está a gata. Por favor, cuide bem dela. Dê bastante carinho.
O gerente do pet shop pegou a caixa transportadora, que estava em cima do balcão, e a estendeu para o cliente. Este, aparentando ter em torno de 45 anos, com expressão tensa, segurou a caixa contra o peito.
— Pode segurar pela alça. A caixa é resistente.
— Ah… desculpa.
— Não precisa se desculpar.
Pela primeira vez, o gerente do pet shop sorriu de forma espontânea. O cliente reposicionou a caixa transportadora, pegando-a pela alça e dando um sorriso desconcertado.
— Desculpa, é a primeira vez na vida que eu cuido de um gato…
— Fique tranquilo. Ela é dócil e amistosa com as pessoas.
Espie pela janelinha da caixa. Ela é meio boba e muito fofa. O cliente, ainda segurando a caixa, agachou-se e olhou lá dentro. A gata o encarava.
Capa do livro ‘Você precisa de um gato’ Foto: Divulgação/Ed. Record
Você Precisa de um Gato
- Autor: Kiyoshi Shigematsu
- Tradução: Tomoko Gaudioso
- Editora: Ed. Bertrand Brasil (304 págs. | R$ 49,90)