Apenas uma hora depois de nascer, uma bebé foi retirada à mãe na Dinamarca depois de a mulher, nascida na Gronelândia, ter sido submetida a testes de “competência parental” e chumbado. A avaliação ocorreu mesmo apesar de, em maio deste ano, este tipo de testes padronizados terem sido abolidos entre a população inuíte. A situação está a causar protestos na Gronelândia — um território dinamarquês —, na Dinamarca, e em vários países.
A menina, Aviaja-Luuna, nasceu no dia 11 de agosto. É filha de Ivana Nikoline Brønlund, que nasceu na Gronelândia, tem pais gronelandeses e até representou o território em competições de andebol.
Ivana Nikoline Brønlund vive perto de Copenhaga, em Hvidovre, e o parto ocorreu num hospital. Mas uma hora depois do nascimento, as autoridades de proteção de menores foram buscar a bebé. Desde então, Ivana Nikoline Brønlund só viu a filha durante uma hora, relata o jornal The Guardian.
Mas afinal, o que são os testes de “competência parental”? Usados pelos responsáveis pela proteção de menores dinamarqueses, tratam-se de testes psicológicos que se propõem avaliar as condições de parentalidade. Porém, foram banidos junto da população com raízes inuítes por não serem adequados à mesma, e porque um estudo revelou que 5,6% das crianças de origem gronelandesa eram retiradas aos pais e entregues ao Estado, um valor acrescido quando comparado com os pais dinamarqueses a quem eram retirados os filhos.
A proibição deu-se quando o caso de outra mãe, Keira Alexandra Kronvold, que também é inuíte, se tornou conhecido. Kronvold viu a filha ser-lhe retirada em novembro de 2024, situação que ainda não foi revertida.
Os testes de “competência parental” foram proibidos entre a população inuíte em maio, mas Ivana Nikoline Brønlund foi submetida à avaliação na mesma. Segundo relata, foi-lhe dito que ficaria sem a sua bebé três semanas antes do parto e devido ao trauma que sofreu às mãos do pai adotivo, a cumprir pena de prisão efetiva por a ter abusado sexualmente. Ao mesmo tempo, as autoridades locais alegaram que a jovem de 18 anos não era “suficientemente gronelandesa” para que o fim dos testes lhe fosse aplicado.
Dinamarca vai alterar testes de “competência parental” que têm discriminado famílias da Gronelândia
Desde que a situação desta mãe se tornou pública, a ministra dos Assuntos Sociais da Dinamarca, Sophie Hæstorp Andersen, pediu explicações ao organismo regional responsável pelo caso e frisou que os testes padronizados não devem ser aplicados a casos de famílias de raízes inuítes. As autoridades regionais de proteção de crianças anunciaram que vão empreender esforços de forma a que todos os requisitos legais sejam cumpridos e que seja encontrada a melhor solução possível para a família, detalha o jornal The Guardian.
A situação de Ivana Nikoline Brønlund originou protestos na Gronelândia, mas estão previstas manifestações futuras em Nuuk, Copenhaga, Reykjavík (Islândia) e Belfast (Irlanda do Norte). A 16 de setembro, esta mãe tem uma audiência marcada em tribunal para que seja analisado o seu caso.
A Gronelândia, uma antiga colónia dinamarquesa, tornou-se um território do país em 1953. Anos mais tarde, em 1979, ganhou alguma autonomia. Contudo, as décadas de 50, 60 e 70 do século passado na Gronelândia foram marcadas não só pela retirada forçada de crianças inuítes às famílias de forma a educá-las segundo os costumes dinamarqueses e levando-as até a esquecer a sua língua, mas também pela inserção, sem consentimento, de dispositivos intrauterinos em mulheres e raparigas (muitas abaixo dos 12 anos de idade). De acordo com documentos da altura citados pelo jornal El País, tratava-se de uma estratégia para travar o crescimento populacional na ilha, evitando que se avolumasse o fardo económico sobre a Dinamarca.