E é preciso não esquecer que Trump conhece Kim “melhor do que quase qualquer pessoa”
Trump diz ao presidente sul-coreano que quer reunir-se com Kim Jong-un
por Jessie Yeung, Gawon Bae e Mitchell McCluskey, CNN
O presidente Donald Trump manifestou disponibilidade para se reunir com o líder norte-coreano Kim Jong-un, segundo afirmou ao seu homólogo sul-coreano durante uma reunião na segunda-feira, onde discutiram a paz na Península da Coreia e as capacidades nucleares de Pyongyang.
O Presidente sul-coreano, Lee Jae Myung, eleito em junho, pediu a Trump que ajudasse a estabelecer a paz entre as duas Coreias – afirmou, durante uma visita à Casa Branca, que a situação era mais estável durante o primeiro mandato de Trump.
“Acho que é o primeiro presidente com tanto interesse nas questões de paz mundial e que realmente conseguiu avanços”, disse Lee. “Por isso, espero que possa fazer a paz para a Península da Coreia… e reunir-se com Kim Jong-un.”
Acrescentou ainda que “apoiaria ativamente” Trump se este quisesse “ser o mediador da paz” e que o presidente norte-americano era “a única pessoa que pode realmente resolver” as tensões entre a Coreia do Norte e a Coreia do Sul – que permanecem tecnicamente em guerra desde que a Guerra da Coreia terminou, em 1953, com um armistício e não com um tratado de paz.
A reunião com Lee foi um grande teste para o novo líder da Coreia do Sul, numa altura em que as relações comerciais e militares de Seul com os EUA enfrentam pressão das políticas “America First” de Trump.
Lee, que assumiu o cargo em junho após o seu antecessor e rival político conservador ter sido destituído, viajou acompanhado de um grupo de CEO e líderes empresariais de algumas das maiores empresas sul-coreanas, que anunciaram uma série de investimentos durante a visita.
A Korean Air anunciou a intenção de adquirir 103 aviões à Boeing, juntamente com motores e um programa de manutenção da GE Aerospace e CFM International, num total de 50 mil milhões de dólares, segundo um comunicado.
Entretanto, o Hyundai Motor Group afirmou que aumentaria o seu investimento nos EUA de 21 mil milhões para 26 mil milhões de dólares, num comunicado divulgado na terça-feira.
No total, espera-se que as empresas sul-coreanas invistam 150 mil milhões de dólares nos EUA, anunciou Lee durante uma mesa-redonda empresarial entre a Coreia do Sul e os EUA, que decorreu após a cimeira.
Lee, da Coreia do Sul, presenteou Trump com um taco de golfe gravado foto Gabinete Presidencial da Coreia do Sul
Tacos de golfe e chapéus de cowboy
Entre os presentes personalizados que Lee ofereceu a Trump estavam dois chapéus de cowboy com o slogan da campanha “Make America Great Again” bordado, um taco de golfe feito à medida e um modelo de um “navio tartaruga”.
Numa referência ao gosto de Trump pelo golfe e pelas suas propriedades associadas, Lee brincou dizendo que se devia construir uma Trump Tower na Coreia do Norte, “para eu também poder jogar golfe em Pyongyang”.
Trump – cujos esforços de mediação e negociações com as duas Coreias foram uma parte marcante do seu primeiro mandato – aceitou prontamente.
“Farei isso e teremos conversas. Ele gostaria de se encontrar comigo”, disse Trump sobre Kim. “Esperamos essa reunião e vamos melhorar as relações. Você vai ajudar nisso.”
É difícil saber se tal reunião acontecerá. Os meios de comunicação estatais norte-coreanos afirmaram que os exercícios militares conjuntos entre os EUA e a Coreia do Sul demonstram a intenção de Washington de “ocupar” a Península da Coreia, segundo a Reuters noticiou na manhã de terça-feira, hora local da Coreia do Sul.
Lee, da Coreia do Sul, oferece a Trump um navio de guerra em forma de tartaruga de metal, um boné MAGA e um taco de golfe foto Gabinete Presidencial da Coreia do Sul
Tanto este ano como no ano passado, Kim e a sua poderosa irmã Kim Yo Jong endureceram a retórica, prometendo manter o arsenal nuclear norte-coreano e destruir a Coreia do Sul com armas nucleares caso Pyongyang seja atacada.
Lee afirmou na segunda-feira, após a reunião com Trump, que a Coreia do Norte é agora capaz de produzir entre 10 a 20 armas nucleares por ano, tendo expandido as suas capacidades — embora não tenha apresentado provas.
Esse número é “mais elevado do que se assume normalmente, o que provavelmente implica capacidade adicional de enriquecimento de urânio” na Coreia do Norte, afirmou Hans Kristensen, diretor do Nuclear Information Project da Federação de Cientistas Americanos.
No sábado, apenas dois dias antes da cimeira entre Trump e Lee, a Coreia do Norte testou dois novos mísseis de defesa aérea, segundo os meios de comunicação estatais da KCNA. E Kim – e possivelmente o seu arsenal – parecem agora fortalecidos por laços crescentes com Moscovo, com tropas norte-coreanas a combater pela Rússia na guerra contra a Ucrânia.
Encontros anteriores entre Trump e Kim
Não seria a primeira vez que Trump se reuniria com Kim – alguém com quem diz ter uma “relação muito boa”. “Ele foi muito correto comigo… Dávamo-nos muito bem”, disse Trump esta segunda-feira, alegando conhecer Kim “melhor do que quase qualquer pessoa”.
Nem sempre foi assim. Em 2017 houve um período de fortes tensões, quando a Coreia do Norte intensificou os testes de mísseis – e Trump respondeu com tweets a chamar Kim “Little Rocket Man” e fez ameaças de “fogo e fúria como o mundo nunca viu.”
Mas as tensões arrefeceram quando os dois começaram a trocar cartas – que Trump descreveu como “cartas de amor” – e acabaram por ter uma série de reuniões inéditas em 2018 e 2019.
Presidente dos EUA, Donald Trump, e o líder norte-coreano, Kim Jong-un, na linha de demarcação da zona desmilitarizada que separa as duas Coreias, em Panmunjom, Coreia do Sul, a 30 de junho de 2019 foto Kevin Lamarque/Reuters
Durante uma dessas reuniões, na zona desmilitarizada (DMZ) entre as duas Coreias, num momento notável Kim convidou Trump a atravessar a fronteira para a Coreia do Norte – tornando-o o primeiro presidente norte-americano em funções a entrar no país – altamente isolado e autocrático.
No entanto, as conversações terminaram sem avanços, com a última reunião a encerrar abruptamente em Hanói em 2019 — e os esforços de desnuclearização ou negociações de paz ficaram estagnados desde então.
Segundo especialistas, Pyongyang recusou-se a retomar o diálogo com os EUA e reiniciou os testes de armamento que tinham sido suspensos durante o período de negociações. Embora ainda não tenha realizado um teste nuclear desde 2017, Kim prometeu aumentar “exponencialmente” o número de armas nucleares do país.
Num evento organizado pelo Center for Strategic and International Studies em Washington, Lee alertou que o número de armas nucleares da Coreia do Norte aumentou 2,5 vezes nos últimos anos.
O país encontra-se agora “nas fases finais” de desenvolvimento de mísseis balísticos intercontinentais (ICBM) “com capacidade de atingir grandes distâncias,” afirmou, acrescentando: “A situação está a deteriorar-se”.
E numa audição no Congresso realizada este ano, o general do Exército Xavier T. Brunson testemunhou que os EUA esperam que a Coreia do Norte avance este ano noutras áreas do seu programa de armamento.
“No próximo ano, esperamos que (a Coreia do Norte) desenvolva ainda mais capacidades hipersónicas e veículos de reentrada com alvos múltiplos e independentes, de forma a cumprir os objetivos do seu governo,” declarou Brunson.