Um estudo liderado pelo Einstein Hospital Israelita acompanhou pacientes que passaram por tratamento pós-infarto e concluiu que a interrupção precoce do uso de aspirina nos primeiros meses após o infarto não é segura. A pesquisa foi apresentada no congresso anual da Sociedade de Cardiologia Europeia, em Madrid, neste domingo (31), e está aceita para publicação no New England Journal of Medicine.

Coordenada pelo Einstein em parceria com o Ministério da Saúde via Proadi-SUS (Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde), o estudo acontece na esteira de uma tentativa de mudança da ciência mundial para tentar diminuir a quantidade de medicamentos para pacientes que passaram por infarto, devido ao aumento nas chances de sangramentos.

Nesse sentido, os médicos se perguntaram se a retirada de um dos medicamentos, a aspirina, funcionaria de forma tão eficaz para proteger o coração, mantendo o risco reduzido de novos infartos. Hoje, o tratamento padrão no mundo combina aspirina com um antiplaquetário, com a intenção de reduzir o risco desses reinfartos.

Os pesquisadores, então, acompanharam por um ano mais de 3.400 pacientes de 50 centros hospitalares com síndromes coronarianas agudas, sendo a maior parte do SUS (Sistema Único de Saúde). Desses pacientes, metade recebeu só uma medicação e a outra metade recebeu ambas.

“O que a gente viu foi que é preciso, nesse período inicial, de fato, dois remédios. Mesmo aumentando um pouco a chance de sangramento, esse é o sistema mais protetor para evitar um novo infarto depois do primeiro. Então, esse é o grande benefício desse estudo”, diz Pedro Lemos, autor sênior da pesquisa e diretor da Cardiologia do Einstein.

Os pesquisadores observaram que a retirada precoce da aspirina resultou em uma redução significativa nos sangramentos, com uma incidência de 2% no grupo que não utilizou aspirina, em comparação a 4,9% no grupo que manteve a terapia dupla. Por outro lado, a alteração no protocolo padrão não manteve a proteção contra eventos cardiovasculares graves —como infarto, AVC (acidente vascular cerebral) ou necessidade urgente de nova revascularização— no grupo sem aspirina (7% versus 5,5%).

O tratamento junto com a aspirina foi posto em dúvida mundialmente porque pode aumentar o risco de sangramentos espontâneos, uma vez que as medicações deixam o sangue mais fino para evitar que novos coágulos se formem e obstruam a artéria, causando um novo infarto.

“Acontece que na tentativa de prevenir a formação de novos coágulos, Isso pode aumentar a chance de sangramento. Então, o que a gente faz? Dá os dois remédios e têm um risco aumentado de sangrar, mas pelo menos você está prevenindo o novo infarto”, explica o cardiologista.

O estudo mostrou, portanto, que ainda não é possível mudar os protocolos para o tratamento do infarto, assunto que tem sido comentado na cardiologia mundial.

Na visão do médico, para além dos resultados, a pesquisa tem o mérito de mostrar a força da cardiologia brasileira para o mundo. “O fato de que quando a gente publica um estudo dessa magnitude, apresenta em congresso, estamos exemplificando o potencial da cardiologia brasileira em participar como um ‘player’ muito importante das decisões médicas científicas no mundo”, diz.