As forças ucranianas que continuam a combater a invasão russa estão a “comprar tempo” para que os países europeus consigam reforçar as suas defesas, afirmou o chefe do Estado-Maior checo, general Karel Řehka, em declarações à Newsweek à margem de uma cimeira de defesa realizada em Praga.
“Se os ucranianos estão a lutar, como fazem agora, estão a comprar-nos tempo — essa é a realidade. A Ucrânia está a comprar tempo para a Europa organizar-se e começar uma dissuasão e defesa eficazes”, disse Řehka.
A guerra na Ucrânia, iniciada com a invasão russa em fevereiro de 2022, obrigou a Europa a inverter décadas de afastamento em matéria de gastos militares desde o fim da Guerra Fria. A NATO decidiu em junho que os Estados-membros devem aplicar 3,5% do PIB em despesa militar direta e mais 1,5% em áreas relacionadas até 2035.
Os Estados Unidos, sob a administração de Donald Trump, têm pressionado os aliados a aumentar as contribuições, mas mantendo a compra de equipamento norte-americano. Washington tem ainda sinalizado a intenção de redirecionar parte da sua atenção para a China e a região Indo-Pacífico.
O governo checo já anunciou que pretende elevar a despesa em defesa para 3% do PIB até 2030.
Rússia gasta 40% do orçamento na guerra
O secretário-geral da NATO, Mark Rutte, sublinhou esta semana em Praga que Moscovo está a canalizar 40% do seu orçamento para o esforço de guerra e deverá produzir, até ao final do ano, pelo menos 1.500 tanques e 3.000 veículos blindados. “Rússia e China estão a produzir armamento e equipamento pesado a um ritmo impressionante, diria mesmo estonteante”, afirmou Rutte, recordando que Pequim anunciou uma parceria “sem limites” com Moscovo em 2022.
O presidente russo, Vladimir Putin, participou esta semana num desfile militar em Pequim e classificou as ligações com a China como estando num nível “sem precedentes”.
Riscos para a NATO nos próximos cinco anos
De acordo com estimativas de serviços de informação europeus, a Rússia poderá atacar um país da NATO nos próximos cinco anos, caso consiga libertar tropas do conflito na Ucrânia. O ministro da Defesa da Suécia, Pål Jonson, alertou que este é o momento em que a Europa deve aumentar significativamente as suas capacidades militares, enquanto Moscovo continua “atolado” no território ucraniano.
Řehka reconheceu que o prolongamento da guerra “não é uma coisa boa”, mas acrescentou: “Devemos estar gratos aos ucranianos por ainda estarem a defender-se.”
Lacunas na defesa aérea e industrial
A NATO atribuiu este verão a cada Estado-membro metas de capacidade, embora classificadas, para reforço da defesa coletiva. Rutte destacou que a Europa precisa de multiplicar por cinco os seus sistemas de defesa aérea e antimíssil, uma área considerada a mais fragilizada da Aliança.
Além disso, são necessários “milhares de veículos blindados e tanques” e “milhões de projéteis de artilharia”, afirmou o secretário-geral, que apontou também a importância de drones e capacidades espaciais.
Especialistas admitem que a indústria europeia ainda não consegue responder à procura. Países que enviaram grandes quantidades de equipamento e munições para a Ucrânia enfrentam agora prazos longos de reposição, agravados pela escassez de matérias-primas.
“Pode nunca ser rápido o suficiente”, comentou um responsável de defesa europeu em Praga, reconhecendo que “há muitas lacunas”, embora os países estejam a tentar produzir “o máximo possível”.
Kadri Tammai, diretora europeia do Acelerador de Inovação em Defesa para o Atlântico Norte (DIANA), frisou que além dos equipamentos tradicionais, a NATO deve apostar em novas tecnologias. “Precisamos definitivamente de ambos”, disse à Newsweek.
O presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou que 26 países já concordaram em dar garantias de segurança à Ucrânia, incluindo a eventual criação de uma força internacional no país. Segundo Macron, os Estados Unidos deverão clarificar nos próximos dias qual será o seu papel nesse compromisso.
Apesar dos progressos, Pavel Fischer, presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros, Defesa e Segurança do Senado checo, alertou: “O trabalho está em curso, mas ainda não chegámos lá.”
Řehka concluiu que cinco anos é “nada” para construir todas as capacidades necessárias.