Praias de areia branca, souvenirs gigantes em forma de mísseis, uma legião de funcionários, um parque aquático e zonas distintas. Desde a abertura da estância turística Wonsan Kalma, na Coreia do Norte, que vários curiosos começaram a especular sobre como seria uma estadia num dos hotéis do projeto. Agora, vários turistas russos (os únicos permitidos a visitar o espaço por enquanto) estão a partilhar a experiência.

Darya Zubkova, uma veterinária de 34 anos natural de São Petersburgo, passou uma semana de férias no resort em julho, um mês após a sua abertura oficial. A russa partilha que os 13 turistas foram apanhados por um comboio, pago pelo governo, para serem levados até ao resort.

Quando chegou à estância, encontrou um universo lá dentro. “O hotel estava novo, os quartos estavam limpos e havia um bom secador de cabelo, muito parecido ao da Dyson”, contou à CNN. “Sentíamos que havia muito espaço, porque éramos as únicas pessoas ali.”

Apesar de estar quase vazio, o hotel tinha dezenas de funcionários. Além dos 13 turistas russos, não havia qualquer outra pessoa hospedada no hotel — pelo menos, naquela área. O lado doméstico, destinado aos turistas nacionais, estava um pouco mais composto, segundo a viajante russa.

Acrescenta que a praia “estava dividida numa zona para turistas locais e outra para pessoas internacionais. Éramos os únicos desse lado”. Conta que “a praia era muito limpa e a areia era branca. Todos os dias, passava um veículo para apagar as pegadas”.

 

“Fomos dar uma volta para conhecer os outros hotéis, mas também não tinham turistas hospedados”, recordou. “Não podíamos circular livremente por aquelas zonas, embora as pessoas da parte nacional pudessem ir para qualquer lado, exceto para a praia.”

Darya recorda que também chegou a ver o parque aquático do resort, mas os turistas russos não tinham acesso ao espaço. “Tivemos a oportunidade de o ver de fora, mas não nos deixaram entrar porque ficava na zona doméstica. Havia muitos habitantes locais lá, uma multidão enorme.”

Sempre que entravam pelo lobby do hotel, os funcionários curvavam-se para os cumprimentar. Além disso, chegou a ver médicos a verificar a temperatura dos restantes hóspedes e a pulverizar desinfetante nas mãos.

“O atendimento foi muito bom”, frisou. “Pedimos um estendal para secar roupa na varanda e eles foram lá para fora, compraram-no e trouxeram-no para o nosso quarto. Depois, pedimos umas cadeiras para relaxarmos e eles compraram especialmente para nós, apesar do pouco tempo que lá estivemos.”

A viajante acrescentou que todos os funcionários tentavam ao máximo agradar os poucos hóspedes. “Esforçaram-se muito. Tentaram surpreender-nos de todas as formas possíveis. Foram muito rigorosos consigo próprios para garantir que nos prestavam serviços da mais alta qualidade”, conta.

A oferta gastronómica era composta por “comida local e internacional”. No menu havia muitos pratos de carne, molho agridoce e um prato com couve picada e cenoura. Estavam disponíveis também várias bebidas alcoólicas, incluindo cervejas da Heineken.

Outra turista russa, Anastasia Samsonova, de 33 anos, disse à BBC que a loja de souvenirs do hotel tinha réplicas de mísseis, vendidas por 34€. Além disso, apesar de vários hóspedes terem dito que tirar fotografias era proibido, Anastasia nunca teve qualquer problema enquanto visitava o país.

“Os guardas nunca nos pediram para apagar as imagens que tirámos e o nosso telemóvel nunca foi revistado”, garantiu. “A única recomendação que os guias turísticos nos deram foi de que não podíamos tirar fotografias das zonas de obras, nem das pessoas que estavam a trabalhar lá.”

O jornal britânico revelou ainda que uma viagem de uma semana da Rússia para a Coreia do Norte, incluindo três dias no resort Wonsan Kalma, custa cerca de 1540€. 

Apesar de os turistas russos serem os únicos autorizados a passar férias no resort, a entrada de hóspedes não é livre. Todas as idas até à estância, que normalmente são organizadas por agências de viagens russas, devem ser autorizadas pelo governo norte-coreano. 

A abertura do projeto megalómano

A estância turística foi inaugurada a 24 de junho, num local antigamente utilizado para testes de mísseis. O projeto alberga hotéis, restaurantes, centros comerciais, um parque aquático e instalações desportivas e recreativas.

Durante a inauguração, o líder norte-coreano Kim Jong-un “expressou a crença de que a onda de felicidade gerada na zona turística costeira de Wonsan Kalma fortaleceria a sua reputação como um resort turístico-cultural de nível mundial”. O norte-coreano contou com o apoio da mulher, Ri Sol-ju, de 35 anos, e da filha e alegada herdeira, Kim Ju-ae, de 12.

O projeto demorou mais de uma década para ser concluído. Tinha sido anunciado em 2013, mas as obras só arrancaram em 2018. Dois anos mais tarde, durante a pandemia de Covid-19, tiveram de ser interrompidas e só regressaram no segundo trimestre de 2023.

Na mesma altura, o país reabriu as fronteiras, após quase quatro anos fechadas devido à pandemia. O turismo internacional começou a ser retomado, com o primeiro grupo de visitantes estrangeiros — cerca de 100 turistas russos — a visitar Pyongyang e uma estância de esqui próxima de Wonsan, em fevereiro do ano passado. A relação entre a Coreia do Norte e a Rússia tem-se intensificado no âmbito político, militar e cultural desde o início da invasão russa à Ucrânia, em fevereiro de 2022.

Antes da pandemia, o turismo na Coreia do Norte já era limitado, recebendo apenas cerca de cinco mil visitantes ocidentais por ano. Os turistas norte-americanos, que representavam aproximadamente 20 por cento deste número, foram proibidos de entrar no país após o caso de Otto Warmbier, um estudante norte-americano detido na Coreia do Norte e condenado, em 2016, a 15 anos de trabalhos forçados após roubar um cartaz de propaganda. Em 2017, o jovem morreu na sequência de uma lesão cerebral grave.