Manter um animal de estimação saudável vai muito além de oferecer alimentação adequada e carinho diário. Por trás da rotina de cuidados, existem ameaças silenciosas que podem colocar em risco a vida de cães e gatos. Entre as principais estão doenças que podem ser fatais, como a leishmaniose, a cinomose, a parvovirose e a peritonite infecciosa felina (PIF). Apesar de conhecidas no meio veterinário, muitas delas ainda são pouco compreendidas pelos tutores, o que torna a prevenção um desafio.

O perigo invisível

Transmitida pelo mosquito-palha, a leishmaniose visceral canina é considerada uma das doenças mais graves para os cães — e também tem impactos na saúde humana, já que se trata de uma zoonose. Os sintomas podem variar desde emagrecimento rápido, queda de pelos e feridas na pele até comprometimento dos rins e do fígado.

“Ela é, muitas vezes, silenciosa. O animal pode apresentar apenas perda de peso ou apetite reduzido por muito tempo antes de ser diagnosticado”, explica o médico veterinário Luiz Fernando Curry.

De acordo com o Ministério da Saúde e a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), em humanos, mais de 90% dos casos não tratados evoluem para óbito. Em cães, estudos da Fiocruz apontam que até 90% dos infectados não tratados morrem, enquanto outros 80% podem permanecer assintomáticos, dificultando o diagnóstico. No Distrito Federal, o cenário também preocupa. Dados da Secretaria de Saúde do DF mostram que, entre janeiro e julho de 2024, 583 cães foram testados, com 80 positivos para leishmaniose visceral.

Ameaças para os filhotes

Se a leishmaniose é grave, outras doenças infecciosas apresentam índices de mortalidade ainda mais altos. A cinomose, por exemplo, pode matar até 90% dos cães infectados, sobretudo filhotes. “A cinomose tem um índice de mortalidade maior que a leishmaniose. Em regiões com baixa cobertura vacinal, continua sendo uma das maiores causas de morte”, alerta Curry.

A transmissão ocorre pelo contato com secreções de animais doentes e atinge sistemas respiratório, digestivo e nervoso. Convulsões, falta de coordenação e secreção nasal estão entre os sintomas mais comuns.

A parvovirose também preocupa. “Ela continua sendo a principal doença infecciosa a acometer os filhotes, com alta letalidade, principalmente quando não há vacinação adequada”, completa o veterinário. O vírus ataca o intestino, provocando vômitos, diarreia com sangue e rápida desidratação.

De acordo com o professor e médico veterinário Atílio Sersun, da área de patologia veterinária, a parvovirose é de altíssimo risco, principalmente em filhotes. “Além da enterite severa, pode causar queda drástica nas células de defesa e até lesões cardíacas fatais.”

Felinos também precisam de atenção

Entre os gatos, a preocupação maior recai sobre doenças como o FIV (imunodeficiência felina), FeLV (leucemia felina) e a peritonite infecciosa felina (PIF).

“Esses vírus não matam de forma imediata, mas enfraquecem o sistema imunológico e aumentam a suscetibilidade a outras doenças graves. É como o HIV em humanos”, compara Curry. Já a PIF, causada por mutação do coronavírus felino, tem taxa de mortalidade altíssima.

“Atualmente, a PIF é praticamente uma sentença de morte, embora já existam medicamentos antivirais promissores que vêm oferecendo esperança para alguns tutores”, explica Sersun.

Raiva e doenças transmitidas por vetores

Apesar da redução nos casos, a raiva continua sendo uma preocupação. “A taxa de mortalidade é de quase 100% após o início dos sintomas. A vacinação anual ainda é imprescindível”, reforça Sersun.

Outro risco crescente são as doenças transmitidas por carrapatos, como erlichiose e babesiose. “Elas podem ser letais, especialmente quando não diagnosticadas a tempo. É fundamental o controle rigoroso contra ectoparasitas”, diz o professor.

A responsabilidade começa em casa

Apesar de soarem assustadoras, muitas dessas doenças podem ser evitadas com medidas simples: vacinação em dia, vermifugação, uso de repelentes em áreas endêmicas, cuidados com a higiene dos ambientes e visitas regulares ao veterinário. “A vacinação preventiva vem reduzindo bastante o número de casos de cinomose e parvovirose em regiões com maior conscientização dos tutores”, afirma Curry.

A Sociedade Brasileira de Medicina Veterinária reforça que campanhas de vacinação anuais são fundamentais para a imunização coletiva, não apenas para proteger os pets, mas também a saúde pública.

Além dos custos financeiros e do sofrimento do animal, a perda de um pet por uma doença evitável causa forte impacto emocional para a família. “Muitas vezes, a morte poderia ter sido evitada com um simples protocolo de vacinação”, resume Sersun.

Quando a doença do pet também ameaça os humanos

Leishmaniose visceral — Além de ser grave para os cães, pode causar febre prolongada, perda de peso e aumento do fígado e do baço em pessoas. Sem tratamento, mais de 90% dos casos humanos evoluem para óbito, segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).

Raiva — Erradicada em grande parte das áreas urbanas brasileiras, ainda representa risco em regiões rurais. A taxa de mortalidade em humanos é praticamente 100% após o aparecimento dos sintomas clínicos.

Toxoplasmose — Embora os gatos sejam apenas hospedeiros intermediários do protozoário Toxoplasma gondii, o contato com fezes contaminadas pode levar a complicações sérias em gestantes e pessoas com imunidade baixa.

 

*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte

 

 

Júlia Sirqueira

Cursando Jornalismo no Centro Universitário IESB, estagiária na Revista do Correio, fã de boas histórias, arte, cultura pop, rock e universo geek.