O descarrilamento do Elevador da Glória que ocorreu em maio de 2018 foi registado, mas não deu origem a qualquer relatório por parte da CIAG (Comissão de Investigação de Acidentes Graves), disse a Carris em resposta ao Observador, após um “levantamento histórico”. A empresa municipal acrescenta que “foi possível apurar que desta situação, ocorrida em 2018, resultou a antecipação da reparação geral que estava já programada para esse ano” e que “na sequência dessa decisão, o Ascensor da Glória esteve encerrado entre 7 de maio e 10 de junho de 2018”.

Além disso, a Carris esclarece que “estes factos ocorreram num tempo anterior ao do atual Conselho de Administração, que não recebeu qualquer informação particular relacionada com esta ocorrência”.

Fonte da anterior administração da Carris (2016-2022) explica que a CIAG não procedeu à realização de um relatório porque o incidente em causa não correspondeu à designação de acidente grave. “A consideração de acidente grave é algo de elevada severidade e que normalmente envolve vítimas humanas”, disse ao Observador. O descarrilamento aconteceu “sem causar danos para além do carril” e, dessa forma, “não houve lugar à elaboração do relatório”, afirma.

Na sequência do descarrilamento de 2018, antecipou-se a manutenção geral com profundidade que seria realizada apenas alguns meses depois, acrescenta a mesma fonte sem conseguir precisar a data. O Elevador da Glória foi parado durante mais de um mês para se proceder à vistoria e manutenção. No final desse processo, considerou-se que este veículo “estava em condições de fazer a sua operação normal”. O membro da anterior administração da Carris ouvido pelo Observador diz que essa reparação geral foi acompanhada por técnicos fiscalizadores da empresa municipal, que terão examinado a manutenção que foi feita pela MNTC.

O incidente de 2018 ficou registado, como o comprovam os três documentos que a Carris enviou à Lusa — “Informações e diligências”, “Registo de acidente/incidente” e “Ficha de ocorrência” –, todos com data de 07 de maio de 2018.

O incidente na carreira 51E, no percurso Restauradores-São Pedro de Alcântara, é participado pelo guarda-freio de serviço no dia 14. Indicando que o incidente ocorreu às 07:30 do dia 07 de maio, o guarda-freio descreve que, “ao fazer a primeira viagem o ascensor 2 descarrilou”.

No dia 15, há um registo de incidente/descarrilamento, num documento titulado “Informações e diligências”, que é apreciado no dia 28 do mesmo mês por pessoa com assinatura ilegível, que conclui: “incidente sem responsabilidade e descaracterizado”. No dia 29, no mesmo documento, o guarda-freio, com assinatura legível, firma que tomou conhecimento, a que se segue o arquivamento, no mesmo dia, por pessoa com assinatura ilegível.

Existe ainda uma ficha de ocorrência da Carris que data o incidente em 7 de maio, com início às 7h40 e fim às 23h55, e relata que o tripulante do veículo “informou que as rodas da frente estavam fora da linha (descarrilou)”. De acordo com o mesmo documento, o guarda-freio “continuou ao serviço” e um engenheiro “informou que o ascensor iria continuar fora de funcionamento possivelmente até às 14h00 do dia 08-05-2018”. Este prazo acabaria por se estender por mais de um mês. “O Ascensor da Glória esteve encerrado entre 07 de maio e 10 de junho de 2018”, adiantou a Carris, na resposta enviada hoje.

A ficha de ocorrência da altura detalha as nove chamadas feitas após o incidente e todas as entidades/pessoas informadas. Em parecer emitido no dia 22 de maio, um técnico informa que “o elevador da Glória não apresenta danos nem teve custos”. No dia 18 de julho, um outro técnico comunica o seu parecer: “Via férrea sem anomalia. Desconhecemos a causa do acidente. Não houve danos na via”.

O anterior executivo da Câmara Municipal de Lisboa foi informado do descarrilamento de 2018 no elevador da Glória, bem como da decisão da Carris de responder com a suspensão do equipamento e a antecipação da manutenção geral.

“A Carris na altura informou-nos que tinha existido um descarrilamento, mas não se tinha registado nenhum incidente com os passageiros e que tinha decidido, como já estava programada uma grande manutenção para esse ano, suspender o elevador e antecipar essa operação”, disse hoje à Lusa o vereador com a tutela da Carris e dos transportes no executivo liderado pelo socialista Fernando Medina, em funções na altura.

Na entrevista à SIC de domingo à noite, Carlos Moedas tinha utilizado este caso para lançar dúvidas sobre a atuação da anterior administração da Carris e, por arrasto, sobre as decisões tomadas pela Câmara sob supervisão de Fernando Medina. O autarca tinha assinalado que, até ao momento, ainda não tinha sido possível encontrar qualquer relatório. “Não consigo encontrar nenhum relatório desse acidente. Onde está? A administração da Carris diz-me que naquela altura aquele acidente não teve qualquer relatório”, notou.