Não há qualquer relatório oficial sobre estes dois incidentes. A Carris nega este último episódio, mas a CNN Portugal sabe que a empresa não foi sequer informada do sucedido

O incidente com o Elevador da Glória em 7 de maio de 2018 não foi o único episódio a envolver o histórico ascensor, antes do fatídico acidente deste ano, e do qual não resultou qualquer relatório oficial. De acordo com testemunhos recolhidos pela CNN Portugal junto de vários guarda-freios já se registaram vários episódios e um deles aconteceu em 2024, quando o equipamento subiu 50 metros e caiu em queda livre, no trajeto ascendente, que liga a Praça dos Restauradores ao miradouro de São Pedro de Alcântara.

A Carris nega este incidente de 2024, mas a CNN Portugal sabe que a empresa não foi sequer informada do sucedido.

“Se em 2018 não existe nenhum relatório, então sobre este muito menos. O mesmo elevador, no trajeto ascendente, sobe 50 metros e cai em queda livre. E nenhum dos freios funciona, nem o automático, nem o pneumático, nada trava aquilo. O que trava é que o cabo funcione”, revela a jornalista da CNN Portugal Sandra Felgueiras, que apurou esta informação.

E vai mais longe na revelação. “Como aquilo é em roldana, aconteceu-lhe o mesmo que aconteceu ao elevador 2. Desta vez, vai um bocadinho além daquilo que é o início da sua marcha, embate, mas não provoca grandes danos, não descarrila, as pessoas estão de pé, caem, o guarda-freios chama a manutenção e, apesar disso, nada acontece. É que o elevador prosseguiu a sua marcha logo a seguir”, afirma a jornalista.

Relativamente ao incidente de 2018, quando o equipamento descarrilou na primeira viagem do dia, pelas 07:30, também “não deu origem a qualquer relatório” por parte da Comissão de Investigação de Acidentes Graves (CIAG), ainda que tenha ficado registado, ao contrário do que aconteceu no ano passado. O caso de 2018 aconteceu a 7 de maio e foi participado pelo guarda-freio de serviço no dia 14, tendo ficado documentado em três registos internos da Carris: “Informações e diligências”, “Registo de acidente/incidente” e “Ficha de ocorrência”.

“Nessa altura, de facto, houve um problema com o elevador da Glória, que descaiu e terá avançado também para o passeio, mas sem consequências”, recorda Manuel Leal, dirigente nacional da Fectrans (Federação dos Sindicatos de Transportes e Comunicações) e do Strup (Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos de Portugal), em declarações à Lusa.

Indicando que o incidente ocorreu às 07:30 do dia 7 de maio, o guarda-freio descreve que, “ao fazer a primeira viagem[,] o ascensor 2 descarrilou”.

No dia 15, há um registo de incidente/descarrilamento, num documento titulado “Informações e diligências”, que é apreciado no dia 28 do mesmo mês por pessoa com assinatura ilegível, que conclui: “incidente sem responsabilidade e descaracterizado”.

No dia 29, no mesmo documento, o guarda-freio, com assinatura legível, firma que tomou conhecimento, a que se segue o arquivamento, no mesmo dia, por pessoa com assinatura ilegível.

Existe ainda uma ficha de ocorrência da Carris que data o incidente em 7 de maio, com início às 07:40 e fim às 23:55, e relata que o tripulante do veículo “informou que as rodas da frente estavam fora da linha (descarrilou)”.

De acordo com o mesmo documento, o guarda-freio “continuou ao serviço” e um engenheiro “informou que o ascensor iria continuar fora de funcionamento possivelmente até às 14:00 do dia 08-05-2018”.

Este prazo acabaria por se estender por mais de um mês.

“O Ascensor da Glória esteve encerrado entre 7 de maio e 10 de junho de 2018”, adiantou a Carris esta segunda-feira.

No dia 18 de julho, um outro técnico comunica o seu parecer: “Via férrea sem anomalia. Desconhecemos a causa do acidente. Não houve danos na via”.

O anterior executivo da Câmara de Lisboa, então liderado por Fernando Medina, foi informado do incidente. Segundo o vereador com a tutela da Carris na altura, a empresa assegurou que não houve feridos e que a suspensão foi preventiva, para coincidir com a grande manutenção já programada.

“A Carris na altura informou-nos que tinha existido um descarrilamento, mas não se tinha registado nenhum incidente com os passageiros e que tinha decidido, como já estava programada uma grande manutenção para esse ano, suspender o elevador e antecipar essa operação”, relatou à Lusa o vereador com a tutela da Carris e dos transportes no executivo liderado pelo socialista Fernando Medina, em funções na altura.