“Não podemos deixar que a China conquiste este mercado”. Von der Leyen revela programa de incentivo à produção de carros pequenos e acessíveis.
A presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, acaba de anunciar no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, um novo programa de apoio à economia europeia, assente em quatro pilares: energia, habitação, mobilidade automóvel e segurança alimentar. O objetivo é baixar o custo de vida dos europeus.
No que concerne à mobilidade automóvel, o programa da Comissão Europeia já tem um nome. Vai chamar-se Small Affordable Cars Initiative. Numa tradução livre, em português: Programa para Automóveis Pequenos e Acessíveis. Uma espécie de “carro do povo” europeu, cujos detalhes vão ser conhecidos nas próximas semanas.
O novo “carro do povo” europeu deverá ser acessível, elétrico e produzido na Europa. Um sucessor espiritual de modelos como o Volkswagen Carocha, Renault 4 e Citroën 2CV, que no pós-guerra colocaram a Europa em movimento.
Num discurso aos deputados europeus, Ursula Von der Leyen, sublinhou que a mobilidade automóvel é demasiado estratégica para ser deixada nas mãos da concorrência externa. “Acredito que a Europa deve ter o seu próprio E-car”, afirmou, introduzindo e anunciado este novo programa Small Affordable Cars Initiative.
Automóveis mais caros
Em 2019, foram vendidos mais de 1 milhão de veículos na UE por menos de €15 000. Atualmente, não chegam às 100 mil unidades.
O objetivo, explicou, é criar um automóvel elétrico que seja simultaneamente ambiental (limpo, eficiente e leve), económico (acessível a todos) e europeu (produzido no continente com cadeias de fornecimento locais). A mensagem foi direta: “Não podemos deixar que a China e outros conquistem este mercado“.
A Comissão quer assim apoiar a produção de pequenos automóveis elétricos acessíveis, tanto para responder à procura crescente, como para dar resposta a milhões de consumidores europeus que procuram alternativas mais baratas. Segundo Von der Leyen, este é o próximo passo após a flexibilização dos objetivos de emissões para 2025, já aprovada no início do ano, e que agora será seguido por uma reavaliação das metas para 2035.
Um anúncio que parece uma resposta aos pedidos da Renault e da Stellantis, há meses, para a criação de uma categoria específica para veículos compactos elétricos, apelidada de “e-car” ou classe M0, inspirada nos populares kei cars japoneses.
No fórum “Future of the Car” do Financial Times, John Elkann (CEO da Stellantis) e Luca de Meo (ex-CEO da Renault) criticaram o excesso de regulamentação da indústria automóvel — mais de 100 novas regras previstas até 2030 — e apelaram a uma estratégia industrial mais clara, eficaz e menos fragmentada.
Mitsubishi ekX. Um exemplo de um “Kei car” muito popular no Japão. Pequeno nas dimensões. e nas emissões, mas não no espaço para os ocupantes. O futuro da mobilidade na Europa serão modelos assim?
Reações divididas em Estrasburgo
A proposta, contudo, não caiu bem junto de todos os eurodeputados. Segundo o Politico, o anúncio foi recebido com vaias no hemiciclo, em particular por membros do Partido Popular Europeu (PPE), que têm sido alguns dos maiores aliados políticos da indústria na defesa de metas de emissões mais suaves e na preservação do motor de combustão para além de 2035.
As críticas surgem num momento em que alguns fabricantes alertam para uma procura abaixo das expectativas no mercado de elétricos, pedindo mais tempo e flexibilidade à Comissão. Von der Leyen, pelo contrário, deixou claro que não há volta atrás: “O futuro é elétrico. E a Europa fará parte dele. O futuro dos automóveis — e os automóveis do futuro — têm de ser feitos na Europa.”
Um sinal político forte
Mais do que um programa técnico, esta nova iniciativa surge como um sinal da Europa: quer recuperar protagonismo num segmento dominado pela indústria chinesa, que já tem no mercado mundial modelos elétricos compactos e acessíveis.
A batalha promete ser tanto económica como industrial, com impacto direto nas fábricas europeias, nas cadeias de fornecimento e na própria competitividade global do setor automóvel europeu. Recordamos que entre junho de 2024 e junho de 2025, só na Alemanha, foram extintos mais de 50 mil postos de trabalho na indústria automóvel.