A última década trouxe transformações notáveis no tratamento do cancro do pulmão. A personalização terapêutica com terapias-alvo e a introdução da imunoterapia traduziram-se em ganhos reais de sobrevida e qualidade de vida. No entanto, a eficácia científica destas inovações não se traduz, automaticamente, em benefício clínico para os doentes. O acesso atempado continua a ser um dos grandes desafios em Portugal.

O processo de disponibilização de um novo fármaco oncológico inicia-se com a aprovação pela EMA, mas é na etapa nacional que os atrasos se tornam críticos. A avaliação pelo INFARMED pode demorar entre 12 a 24 meses, período durante o qual o medicamento não é comparticipado nem prescrito no SNS. Este intervalo representa uma oportunidade perdida para muitos doentes, sobretudo num contexto de doença agressiva e frequentemente diagnosticada em fase metastática.

É importante reconhecer que estas barreiras têm múltiplas causas. A primeira é económica: os medicamentos oncológicos inovadores são dispendiosos e os orçamentos nacionais não são ilimitados. A segunda é organizacional: os recursos disponíveis para avaliação e negociação são escassos e o processo regulatório complexo. A terceira, muitas vezes não tão percecionada, é a assimetria de acesso dentro do próprio sistema. Mesmo após a aprovação nacional, a disponibilização efetiva pode depender das Comissões de Farmácia e Terapêutica de cada hospital, gerando desigualdade territorial no acesso.

A situação é particularmente desafiante no caso de mutações raras. Embora a medicina de precisão tenha trazido novos horizontes terapêuticos, os doentes com mutações menos comuns ficam muitas vezes dependentes de decisões individualizadas ou de programas de acesso precoce, que continuam a ser restritivos e pouco transparentes.

A solução passa por várias frentes, nomeadamente, ampliar os recursos das agências de avaliação, reforçar os programas de acesso precoce com critérios mais claros e abrangentes e ponderar mecanismos de negociação conjunta a nível europeu que permitam reduzir preços e encurtar prazos. Estes passos exigem vontade política e compromisso interinstitucional.

O envolvimento da sociedade civil é também um fator-chave. As associações de doentes podem ser um parceiro estratégico no processo de sensibilização pública e na defesa de políticas de acesso equitativas. Capacitar os doentes com informação validada é uma forma de os integrar ativamente nas decisões terapêuticas e de contribuir para uma pressão social mais informada. Iniciativas como o podcast “Novo Fôlego”, que aproxima a informação científica e atual das pessoas afetadas pelo cancro do pulmão e da sociedade em geral, assumem um papel importante neste esforço de literacia em saúde e capacitação dos doentes.

Apesar dos entraves, o caminho da inovação em Oncologia Pulmonar tem sido francamente positivo. O portefólio terapêutico é hoje mais robusto, eficaz e tolerável. A expectativa é que, com o reforço dos mecanismos de avaliação e financiamento, a equidade no acesso à inovação se torne uma realidade. Até porque, em Oncologia, o tempo de acesso não é apenas uma métrica regulatória, é um determinante clínico.